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a dança dos encéfalos acesos

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“Lidar com o novo, ainda que fundamentado no clássico, implica coragem de experimentar,<br />

trabalhar, mostrar e provar que é possível recriar o que, por vezes, acreditamos já estar<br />

pronto” (AHMED, 1995, p.11)<br />

textos do espetáculo<br />

Quando me falaram a primeira vez sobre ela, me lembrei de já tê-la visto meia dúzia de vezes,<br />

muito pouco com certeza para quem quisesse conhecê-la. E apesar de até então ela mostrar-se<br />

aos meus olhos com as roupas a que to<strong>dos</strong> dizem não, eu queria, aliás, inconscientemente eu até<br />

precisava conhecê-la. Mesmo que meu íntimo gritasse que é impossível totalmente compreendê-<br />

la, pois esta é a lei, a lei de sobrevivência para to<strong>dos</strong> que acreditam no poder de suas fronteiras.<br />

(As fronteiras são limites geralmente ultrapassa<strong>dos</strong><br />

E ultrapassa-se limites até mesmo ilimita<strong>dos</strong><br />

Quem limita-se a fronteiras não conhece o outro lado<br />

Quem conhece vai sozinho e não volta acompanhado.)<br />

E ela chegava com seus cabelos de gelo negro pesando sobre os ombros. Suas pupilas<br />

entravam no meu corpo com gosto de uísque da noite passada.<br />

Minhas palavras eram dela e meu silêncio nosso.<br />

Meus beijos lambiam seus dentes que mordiam minha percepção de distância física.<br />

Meu corpo não estava mais ali, e eu, eu não queria mais o meu corpo. Eu queria o espírito<br />

da minha pele roçando as giletes que continham seu sorriso. Eu queria ouvir mas não<br />

ouvia nada. Meu tato estava revestido de presença ausente, e sua imagem em preto-e-<br />

branco de tanto eu lembrar suas cores. E eu ouvia só o seu nome (não chorava, nem ria),<br />

descobria então o seu nome (não sentia nada).<br />

O seu nome<br />

Ausência<br />

O seu nome<br />

Ausência<br />

Eu ouvia seu nome<br />

E seu nome era DOR.<br />

Nua<br />

Crua<br />

Pele<br />

Tua<br />

Quente<br />

Ausente<br />

Sua<br />

e<br />

Sua<br />

Minha carne vive até quando<br />

Tua pele a faça mais viva<br />

Carne viva<br />

Enquanto o acaso esculpe a musa<br />

Em meus olhos cravam-se pincéis<br />

E secciono a luz para pintar perfeição:<br />

A ferida aberta vestida de noiva<br />

Desculpa por não poder ver-te<br />

Por gostar demais de personagens<br />

E muito pouco de gente<br />

Desculpa por querer querer-te<br />

Por arrancar as folhas do epílogo<br />

E dizer que o livro mente<br />

Desculpa por gritar silêncio<br />

E querer calar o mundo<br />

Por render-me ao acaso<br />

E ter um coração vagabundo<br />

Pelo beijo demorado<br />

Por tudo dar errado<br />

Por tudo ter sido certo<br />

Pelo beijo não dado<br />

Pelo fuzil engatilhado<br />

Mas de covarde gatilho travado<br />

Pelos pulsos sangrando<br />

Sem ao menos tê-los cortado<br />

Por saber ser meu carrasco<br />

Mas não saber<br />

Ser assassino<br />

Alejandro Ahmed<br />

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