Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Em entrevista, o coreógrafo Alejandro Ahmed se posicionou sobre o assunto: “Uma das<br />
coisas que ouço sobre violência diz respeito aos videogames. Será que faz mal a um<br />
moleque ficar horas em frente de uma tela matando bandi<strong>dos</strong> de mentira? Não sei. Mas<br />
a gente pode proibi-lo de jogar, que ainda assim ele vai fazer uma arma usando dois<br />
pedaços de madeira e brincar de atirar. A exposição aos signos da violência é total. A<br />
gente senta em casa, vê pessoas morrendo no noticiário e não sente verdadeiramente<br />
nada. Essa sensação de querer sentir é muito forte”. (AHMED apud LóPEZ, 2000)<br />
Tanto no videogame como na <strong>dança</strong>, o seu projetista deve levar em consideração o tempo,<br />
o espaço e a ação de corpos no ambiente. Esta lógica de funcionamento e esta forma<br />
de arquitetar são similares: um coreógrafo pode ser projetista e um projetista pode se<br />
parecer, em certos momentos, a um coreógrafo virtual. Como anunciou Jenkins, “alguns<br />
<strong>dos</strong> melhores jogos – Tetris é um exemplo – não têm nada a ver com uma narração. Pelo<br />
que sabemos, a arte futura <strong>dos</strong> jogos pode se assemelhar mais à <strong>dança</strong> ou à arquitetura<br />
que ao cinema”. (JENKINS, 2000, p.6)<br />
Se Jenkins aproximou o jogo da <strong>dança</strong>, nossas reflexões, na mão dupla, põem a <strong>dança</strong> em<br />
contato com o jogo. A evolução mostrou a construção da interface do Cena 11: a moldura do<br />
videogame. Violência será utilizado como exemplo, por expor de maneira emblemática nossa<br />
argumentação. Essa obra é uma ressonância de um mundo tecnologizado, da cultura digital, do<br />
pensamento não-linear. E o videogame está sintetizado, digitalizado no corpo que <strong>dança</strong>.<br />
Ao movimento entrelaçam-se a palavra em poesia, a música, as imagens, a cenografia, as<br />
próteses. O jogo físico é articulado neste exercício plural de contaminação entre coisas<br />
de naturezas distintas. O resultado desta adaptação está no corpo que <strong>dança</strong>. Esta zona<br />
de contato entre vários territórios. (Des)fronteirização. A <strong>dança</strong> se desenvolve em rede:<br />
camadas e cruzamentos de informação. Rizoma multimídia. Videogame de <strong>dança</strong>. Corpo<br />
tecnologizado. Pós-humano.<br />
Como afirmou Helena Katz: “A <strong>dança</strong> brasileira ainda não tinha aprendido a lidar com<br />
todo um universo da cultura pop formado por certo tipo de história em quadrinhos<br />
pós-mangás (os gibis japoneses), pós-MTV, povoado por ambientes como os habita<strong>dos</strong><br />
por Lara Croft, por exemplo, por Brain Operas, hiperinstrumentos, Pixar e Ex Machina,<br />
pós-Stelarc e Marina Abramovic, por algoritmo genético, robô que sobe escada com<br />
degraus de tamanhos diferentes, por Biped (coreografia de Cunningham do ano passado<br />
em que bailarino gente e corpo virtual <strong>dança</strong>m juntos de uma forma nova). [...] há uma<br />
nova geração, abastecida a videogame e skate e piercing e tatuagem que produz um<br />
entendimento de mundo próprio”. (KATZ, 2000, p.D3)<br />
No corpo a violência aparece no sentido de violar sua naturalidade. Imprimir linguagem.<br />
A primeira projeção, na tela acima do palco, mostra as imagens de uma câmera<br />
percorrendo, em grande close, uma pele tatuada por sinais e símbolos. Em seguida, uma<br />
animação feita em computador mostra bonecos espeta<strong>dos</strong> com alfinetes, lembrando os<br />
rituais vodu. Marcar, inscrever e interferir no corpo são sinais de violação.<br />
Unhas negras em primeiro plano. Os cabelos estão descolori<strong>dos</strong>. Perfurações no nariz e<br />
nas orelhas.<br />
Nos slides, algo entre o grotesco e o singelo. Violência<br />
e delicadeza. São imagens que chamam o olhar para<br />
descobrir ângulos incomuns <strong>dos</strong> corpos <strong>dos</strong> bailarinos. São<br />
ângulos esquisitos, dando a impressão de que os corpos<br />
estão deforma<strong>dos</strong>. O corpo constrói o olhar da imagem,<br />
onde a tecnologia e a técnica da mídia, por interação,<br />
constroem um corpo irregular. Parece que há uma lente<br />
de olho de peixe nos olhos.<br />
96 Seqüência com o bailarino Alejandro Ahmed lembra histórias em quadrinhos.<br />
Slides <strong>dos</strong> bailarinos Janaína Santos e Anderson Gonçalves, que são projeta<strong>dos</strong> durante o espetáculo Violência.<br />
97