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Psiquiatria - Faculdade de Medicina - UFMG

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MUSICOTERAPIA E PSIQUIATRIA: UM ESTUDO DE CASO<br />

MUSIC-THERAPY AND PSYCHIATRY: A CASE STUDY<br />

Bianca Bruno Barbara *<br />

Clara Duarte *<br />

Heloísa Cardoso <strong>de</strong> Mello *<br />

Nelson Gol<strong>de</strong>nstein **<br />

Resumo<br />

O tema do presente trabalho se refere ao uso da musicoterapia<br />

como instrumento acessório no manejo clínico <strong>de</strong> pacientes psicóticos<br />

graves. São relatadas reflexões <strong>de</strong>senvolvidas a partir do processo<br />

musicoterápico <strong>de</strong> um paciente esquizofrênico durante o ano<br />

<strong>de</strong> 1997 no Hospital-Dia do Instituto <strong>de</strong> psiquiatria da Universida<strong>de</strong><br />

Fe<strong>de</strong>ral do Rio <strong>de</strong> Janeiro/ IPUB-UFRJ. Os autores procuram conciliar<br />

criticamente dados quantitativos com estudo psicopatógico qualitativo.<br />

Elaboram gráfico que mostra o perfil <strong>de</strong> expressivida<strong>de</strong> do<br />

paciente no processo musicoterápico, sendo que os diferentes níveis<br />

<strong>de</strong> expressão parecem contextualizar a vida <strong>de</strong> relações. A musicoterapia<br />

po<strong>de</strong> contribuir interdisciplinarmente para a melhora da qualida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> vida <strong>de</strong>sses pacientes.<br />

Palavras-chave: Musicoterapia; Psicose; Esquizofrenia<br />

O presente trabalho preten<strong>de</strong> formular consi<strong>de</strong>rações a propósito<br />

do recurso da música como ferramenta clínica para os quadros<br />

psicóticos graves. Para tanto, <strong>de</strong>senvolvemos reflexões sobre<br />

a passagem <strong>de</strong> um jovem esquizofrênico pelas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> musicoterapia<br />

do Hospital-Dia do Instituto <strong>de</strong> <strong>Psiquiatria</strong> da Universida<strong>de</strong><br />

Fe<strong>de</strong>ral do Rio <strong>de</strong> Janeiro (IPUB/UFRJ), durante o ano<br />

<strong>de</strong> 1997.<br />

Partimos do pressuposto <strong>de</strong> que a psicose é, apenas, o fenômeno<br />

universal do adoecer psíquico e que todas as manifestações<br />

particularmente associadas aos mecanismos primários <strong>de</strong> cisão se<br />

revelam fenômenos específicos dos transtornos esquizofrênicos.<br />

Dessa forma, parece-nos plausível verificá-los nos mais diversos<br />

campos das ativida<strong>de</strong>s, como nas construções verbais, nos <strong>de</strong>talhes<br />

do comportamento <strong>de</strong> uma maneira geral e, supostamente,<br />

nas representações psíquicas do próprio corpo. Enfocando essa<br />

preocupação psicopatológica, propusemo-nos investigar a possibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> aliar o movimento da dança com a música, buscando<br />

respon<strong>de</strong>r que tipo <strong>de</strong> benefício terapêutico po<strong>de</strong>ria ser alcançado.<br />

Não seremos ingênuos em afirmar que nossos esforços eram,<br />

* Musicoterapeuta<br />

** Psiquiatra. Cor<strong>de</strong>nador do Hospital Dia do Instituto <strong>de</strong><br />

<strong>Psiquiatria</strong> da UFRJ<br />

16 Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):16-20<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, isentos <strong>de</strong> intenções. Em realida<strong>de</strong>, preten<strong>de</strong>mos<br />

encontrar instrumentos capazes <strong>de</strong> promover maior organização<br />

das funções psíquicas e, ao dirigir nossas reflexões para a prática<br />

clínica, avaliar em que medida a musicoterapia (no caso, aliada ao<br />

movimento e a dança) po<strong>de</strong> funcionar como elemento reorganizador<br />

para esse tipo <strong>de</strong> paciente.<br />

Sob o ponto <strong>de</strong> vista metodológico, aplicamos a musicoterapia<br />

interativa,1 algumas técnicas <strong>de</strong> improvisação musical livre, improvisação<br />

musical eventualmente orientada e recriação musical.2<br />

Essas ativida<strong>de</strong>s foram <strong>de</strong>senvolvidas com um grupo <strong>de</strong> pacientes<br />

adultos que frequentava o Hospital-Dia durante o citado<br />

ano, composto, em média, <strong>de</strong> seis pacientes atendidos semanalmente<br />

em ativida<strong>de</strong>s com duração <strong>de</strong> uma hora. As sessões aconteciam<br />

em ampla sala aparelhada com diversos instrumentos musicais,<br />

on<strong>de</strong> os pacientes eram atendidos por três pessoas: duas<br />

coor<strong>de</strong>nadoras e uma observadora, esta última com a tarefa <strong>de</strong><br />

elaborar os relatórios das ativida<strong>de</strong>s.<br />

Caso Clínico<br />

Apresentaremos o paciente, aqui <strong>de</strong>nominado Carlos, brasileiro,<br />

natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, nascido em janeiro <strong>de</strong> 1962, católico,<br />

solteiro, branco, grau <strong>de</strong> instrução primário, inativo, residindo<br />

com os pais e sendo o terceiro <strong>de</strong> uma prole <strong>de</strong> três.<br />

O fato <strong>de</strong> sua mãe ser pianista profissional pareceu-nos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

o princípio dos atendimentos, expressar uma relação peculiar entre<br />

ambos <strong>de</strong>ntro da trama familiar. Segundo ela, Carlos “sempre<br />

se mostrou ingênuo, tendo características femininas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> criança”<br />

(sic). A nós, o que mais chamou a atenção foi o comportamento<br />

marcadamente pueril e meigamente <strong>de</strong>licado, muito embora aspectos<br />

femininos também pu<strong>de</strong>ssem ser evi<strong>de</strong>nciados. Em nossos<br />

esporádicos e fugazes contatos com a mãe, pu<strong>de</strong>mos perceber<br />

uma evi<strong>de</strong>nte preocupação em protegê-lo, como alguém extremamente<br />

frágil e in<strong>de</strong>feso. Impressão, aliás, corroborada pela equipe.<br />

Algumas vezes supomos que, <strong>de</strong> certa forma, acusava o marido<br />

pelo problema do filho. “Ele nunca aceitou seu gosto pela música e<br />

dança”, disse-nos certo dia. Dessa forma, foi matriculado pela mãe,<br />

aos 16 anos, no curso <strong>de</strong> ballet clássico do Teatro Municipal do<br />

Rio <strong>de</strong> Janeiro e atuou profissionalmente, como bailarino, até os<br />

21 anos, quando, segundo informações colhidas, adoeceu.<br />

Nosso primeiro contato com sua história clínica se <strong>de</strong>u a partir<br />

do prontuário da instituição, muito embora já estivéssemos<br />

En<strong>de</strong>reço para correspondência:<br />

Nelson Gol<strong>de</strong>nstein<br />

Hospital-Dia / IPUB - UFRJ<br />

Av. Venceslau Braz - 71 Fundos<br />

Botafogo - Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />

E- mail: n.gol<strong>de</strong>nstein@mls.com.br

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