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Psiquiatria - Faculdade de Medicina - UFMG

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UM CASO DE PSICOSE DE INÍCIO TARDIO: CONSIDERAÇÕES DIAGNÓSTICAS<br />

A CASE OF LATE-ONSET PSYCHOSIS: DIAGNOSTIC CONSIDERATIONS<br />

Antônio Lúcio Teixeira Júnior *<br />

Henrique Alvarenga-Silva *<br />

Adriana Camello Teixeira Huguet **<br />

Maria Goretti Pena Lamounier ***<br />

Resumo<br />

Os autores apresentam caso <strong>de</strong> psicose em uma senhora <strong>de</strong> 61 anos<br />

sem déficits cognitivos. A paciente foi levada ao hospital psiquiátrico<br />

<strong>de</strong>vido a agressivida<strong>de</strong> com vizinhos, após vários anos sintomática e<br />

sem tratamento. Descrita por seus cuidadores como uma pessoa tímida<br />

e sistemática, que nunca tivera relacionamentos íntimos ou namorados.<br />

Aos 49 anos, a partir da morte <strong>de</strong> sua mãe, tornou-se muito<br />

isolada, evitando contato com outras pessoas e morando sozinha.<br />

Abandonou o emprego, passando a alimentar-se precariamente.<br />

Quatro anos mais tar<strong>de</strong> começou a apresentar, <strong>de</strong> maneira evi<strong>de</strong>nte,<br />

sintomas <strong>de</strong>lirantes persecutórios e alucinações auditivas. Permaneceu<br />

nesse quadro cerca <strong>de</strong> 10 anos até ser levada ao hospital. Na internação<br />

é medicada com haloperidol 2,5 mg/dia, evoluindo com melhora<br />

dos sintomas psicóticos e da agressivida<strong>de</strong>. São discutidas as<br />

atuais classificações diagnósticas <strong>de</strong> psicoses <strong>de</strong> início tardio.<br />

Palavras-chave: Esquizofrenia <strong>de</strong> Início Tardio; Parafrenia Tardia;<br />

Psicose Tardia.<br />

As psicoses <strong>de</strong> início tardio foram consi<strong>de</strong>radas por Kraepelin<br />

como uma das áreas mais obscuras da psiquiatria.1 O diagnóstico<br />

diferencial é geralmente difícil, pois inclui vários transtornos<br />

clínico-neurológicos e psiquiátricos.<br />

Com o crescente envelhecimento da população e, portanto,<br />

com o aumento da incidência <strong>de</strong> casos <strong>de</strong> psicoses iniciadas em<br />

ida<strong>de</strong>s avançadas, torna-se ainda mais importante a capacida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> reconhecer e tratar a<strong>de</strong>quadamente essas condições.<br />

Psicose é um problema relativamente comum no idoso, acometendo<br />

cerca <strong>de</strong> 4% <strong>de</strong>ssa população na comunida<strong>de</strong>.2 A combinação<br />

<strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> fatores contribui para a maior incidência<br />

<strong>de</strong> sintomas psicóticos: o envelhecimento cerebral, déficits sensoriais<br />

(auditivo e visual) e cognitivos, doenças clínicas e isolamento<br />

social.3 Em geral, a agressivida<strong>de</strong> e a agitação são as principais<br />

causas <strong>de</strong> encaminhamento <strong>de</strong> um paciente psicótico idoso ao<br />

psiquiatra.3<br />

Freqüentemente, sintomas psicóticos não são notados em idosos,<br />

seja <strong>de</strong>vido à presença <strong>de</strong> múltiplos problemas médicos, uso<br />

* Resi<strong>de</strong>nte do segundo ano da Residência <strong>de</strong> <strong>Psiquiatria</strong> do<br />

Hospital das Clínicas da <strong>UFMG</strong>.<br />

** Resi<strong>de</strong>nte do primeiro ano da Residência<strong>de</strong> <strong>Psiquiatria</strong> do<br />

Hospital das Clínicas da <strong>UFMG</strong>.<br />

*** Preceptora da Residência em <strong>Psiquiatria</strong> do Hospital das<br />

Clínicas da <strong>UFMG</strong>.<br />

<strong>de</strong> múltiplas medicações, ou mesmo por <strong>de</strong>sinformação dos cuidadores.3<br />

Apresentamos a seguir um caso <strong>de</strong> esquizofrenia <strong>de</strong> início<br />

tardio.<br />

Caso Clínico<br />

Uma senhora solteira <strong>de</strong> 61 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> foi trazida por vizinhos<br />

e policiais ao Hospital Psiquiátrico Galba Velloso, em agosto<br />

<strong>de</strong> 1998, com a história <strong>de</strong> que se encontrava agressiva com os<br />

vizinhos, acreditando terem-lhe enfeitiçado. Freqüentemente, jogava<br />

pedra nos vizinhos, chegando, irritada, a bater a própria cabeça<br />

contra o muro. Os vizinhos informaram que a paciente começou<br />

a se comportar <strong>de</strong> modo diferente há cerca <strong>de</strong> 12 anos,<br />

após o falecimento da mãe. A partir <strong>de</strong>ssa época, passou a morar<br />

sozinha e a evitar contato com outras pessoas. Cerca <strong>de</strong> quatro<br />

anos <strong>de</strong>pois, então com 53 anos, abandonou o emprego numa fábrica<br />

<strong>de</strong> macarrão. Passou a ficar o dia todo em casa, não permitindo<br />

a entrada <strong>de</strong> qualquer pessoa. Jejuava freqüentemente, consumindo<br />

principalmente chás <strong>de</strong> ervas do próprio quintal. Dizia<br />

que não podia sair <strong>de</strong> casa porque falavam mal <strong>de</strong>la no rádio, na<br />

televisão e na rua. Passou a acreditar que uma <strong>de</strong> suas vizinhas fazia<br />

feitiços contra ela, tornando-se agressiva com a mesma.<br />

Durante todos esses 12 anos <strong>de</strong> evolução dos sintomas a paciente<br />

não procurou nenhum serviço médico ou psiquiátrico.<br />

Não havia também história <strong>de</strong> tratamentos médicos ou psiquiátricos<br />

anteriores. A paciente não era etilista, nem tabagista e não<br />

apresentava qualquer doença clínica geral.<br />

Até os 15 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> a paciente residiu na zona rural <strong>de</strong> cida<strong>de</strong><br />

do interior mineiro com a mãe e os avós maternos. Não conheceu<br />

o pai. Trabalhou como empregada doméstica para uma<br />

mesma família na área urbana <strong>de</strong> seu município natal dos 15 aos<br />

26 anos, quando, então, mudou-se para Belo Horizonte. Nesta<br />

capital continuou exercendo a profissão <strong>de</strong> doméstica por vários<br />

anos. Posteriormente, empregou-se numa fábrica <strong>de</strong> macarrão,<br />

on<strong>de</strong> permaneceu cerca <strong>de</strong> 10 anos. Após abandonar esse emprego,<br />

passou a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r financeiramente dos vizinhos.<br />

Os informantes relatavam que a paciente fora sempre uma<br />

pessoa sistemática, muito tímida com homens e que nunca tivera<br />

um relacionamento íntimo ou namorado.<br />

Sua mãe falecera por aci<strong>de</strong>nte vascular cerebral. Não há informações<br />

sobre transtornos psiquiátricos ou neurológicos em sua<br />

família.<br />

En<strong>de</strong>reço para correspondência:<br />

Hospital das Clínicas - <strong>UFMG</strong><br />

Avenida Professor Alfredo Balena 110<br />

30130-100 - Belo Horizonte - MG<br />

Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):21-23 21

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