Psiquiatria - Faculdade de Medicina - UFMG
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Auto-relato<br />
Paulo B. Linhares (nome fictício)<br />
Discussão: Helio Elkis *<br />
Resumo<br />
REVELAÇÕES<br />
REVELATIONS<br />
Relato <strong>de</strong> caso pelo próprio portador <strong>de</strong> transtorno mental.Tratase<br />
<strong>de</strong> paciente do sexo masculino, ex-seminarista e <strong>de</strong> nível escolar<br />
universitário. Apresentou sintomatologia psicótica repleta <strong>de</strong> revelações<br />
mediúnicas, chegando a ser aposentado por invali<strong>de</strong>z. Relata<br />
em <strong>de</strong>talhes seus primeiros sintomas e situações <strong>de</strong>les <strong>de</strong>correntes,<br />
assim como sua via crucis por atendimentos psiquiátricos. Posteriormente<br />
cancelou sua aposentadoria e vem trabalhando e vivendo<br />
normalmente. Não consi<strong>de</strong>ra sua sintomatologia fruto <strong>de</strong> doença.<br />
Palavras-chave: Transtorno Psicótico; Esquizofrenia Paranói<strong>de</strong>;<br />
Parafrenia; Transtorno Delirante<br />
A finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse imenso trabalho é contar-lhe o que aconteceu<br />
comigo e as minhas experiências com relação a “mediunida<strong>de</strong>”.<br />
Mediunida<strong>de</strong> é uma conquista nossa e é o dom <strong>de</strong> servirmos<br />
<strong>de</strong> intermediários entre os dois planos da criação divina: o plano<br />
visível, o nosso, no qual vivemos hoje, com o plano invisível, que<br />
também será nosso no futuro, mas com o qual já sintonizamos<br />
hoje. Aquele que estuda e compreen<strong>de</strong> a profundida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa sintonização<br />
irá enten<strong>de</strong>r também o que é o “inconsciente”.<br />
A mediunida<strong>de</strong>, que é mesmo “profetismo bíblico”, é, em geral,<br />
consi<strong>de</strong>rada como uma doença para a psiquiatria, principalmente<br />
no início do afloramento <strong>de</strong>la e também a psicologia a consi<strong>de</strong>ra<br />
uma doença.<br />
Nós fomos criados simples e ignorantes, mas perfeitos, pois<br />
tudo o que Deus-Pai-Mãe criou é perfeito, e por nossos esforços<br />
vamos evoluindo e nos tornando “sábios e santos”. Essa conquista<br />
da sabedoria é executada através das vidas sucessivas ou das<br />
encarnações em corpos <strong>de</strong> carne. Nós, atualmente, somos um somatório<br />
<strong>de</strong> muitos “eus”, pois tudo o que fomos e apren<strong>de</strong>mos<br />
em nossas vidas passadas faz parte do nosso inconsciente individual.<br />
Quando o nosso “inconsciente” vem a tona, temos que separar<br />
e enten<strong>de</strong>r o que é do “inconsciente individual” e o que é<br />
do “inconsciente coletivo”. Essa separação e esse entendimento<br />
são frutos <strong>de</strong> muito estudo e é o encontro com a verda<strong>de</strong>, que liberta<br />
(Jo 8,32).<br />
* Professor Associado Doutor do Departamento <strong>de</strong> <strong>Psiquiatria</strong> da<br />
<strong>Faculda<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Medicina</strong> da USP; Coor<strong>de</strong>nador da Residência em<br />
<strong>Psiquiatria</strong> do Instituto <strong>de</strong> <strong>Psiquiatria</strong> do HC-FMUSP;<br />
Coor<strong>de</strong>nador do Projesq- Projeto Esquizofrenia do Ipq- FMUSP<br />
Em 1962, estudava interno em um seminário e tinha passado<br />
para o 1º ano do curso clássico (1º ano do 2º grau, hoje) e podia<br />
freqüentar uma sala on<strong>de</strong> tínhamos permissão <strong>de</strong> fumar, ler jornais<br />
e algumas outras regalias. Por isso comprei três maços <strong>de</strong> cigarros<br />
e quando ia fumar o terceiro cigarro, veio um pensamento<br />
a minha mente como uma voz, bem no fundo do meu ser e bem<br />
nítida mesmo, e dizia-me o seguinte: “O seu pai trabalha na roça e<br />
até sob um sol quente para pagar os seus estudos e você ainda vai<br />
queimar o dinheiro <strong>de</strong>le”.<br />
Essa voz, que falou no fundo da minha mente e que sabia<br />
tudo sobre mim, ajudou-me a não adquirir o vício do cigarro, mas<br />
não me obrigou a nada. Tomei livremente a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> não fumar,<br />
pois julguei que realmente não estava agindo corretamente com<br />
relação a gastar o dinheiro do meu pai. Resultado: não fumei o<br />
terceiro cigarro e doei para os colegas todos os cigarros já comprados<br />
e nunca mais fumei.<br />
Cada pessoa tem a sua história, tem a sua hora certa e a hora<br />
certa só o Pai sabe (Mt 24,36). Nos dias 7 a 10 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1980<br />
vivi momentos interessantes e fantásticos, pois vinha a minha<br />
mente revelações para mim sobre a minha pessoa e minha vida.<br />
Enquanto não escrevia a idéia num bloco <strong>de</strong> papel, não conseguia<br />
acalmar e trabalhar. Era o início das minhas experiências místicas<br />
ou mediúnicas, assunto este sobre o qual nada conhecia. Foi também<br />
o início do meu autoconhecimento como um “ser cósmico”<br />
ou um “Eu Sou”. Foi o meu nascimento do alto (Jo 3,7).<br />
Tinha aprendido no seminário que espiritismo era algo contrário<br />
ao BEM. Mas em 10/01/1980 veio a público a minha mediunida<strong>de</strong><br />
e, após dar muitos escândalos no meu trabalho e em<br />
outros lugares, não dormi nada na noite <strong>de</strong> 10 para 11/01/1980.<br />
Entre os escândalos que <strong>de</strong>i, cito alguns.<br />
Após escrever sobre a última revelação, que foi sobre a reencarnação<br />
com base na Bíblia, escrevi a seguinte frase: “Vai e fala,<br />
senão você morre!”. Saí como um “louco” da minha sala e fui falando<br />
para a secretária: “MF, a Boa Nova chegou”. Como a minha<br />
voz estava alterada, a secretária assustou e teve medo <strong>de</strong> mim.<br />
Após um rápido diálogo comigo, ela <strong>de</strong>sceu as escadas e falou<br />
com os outros colegas <strong>de</strong> serviço: “O PBL ficou doido!”. Assustando<br />
assim a todos, mas não <strong>de</strong>i tempo <strong>de</strong> ninguém pensar e raciocinar<br />
em nada, pois <strong>de</strong>sci imediatamente as escadas, tremendo<br />
como uma vara ver<strong>de</strong>. Quando fui visto pelos outros colegas, todos<br />
espantaram e virou uma confusão tremenda. Pedi a um corretor<br />
<strong>de</strong> valores para me levar ao Provincialado dos Franciscanos<br />
em Carlos Prates, pois queria falar com os freis, já que pensava<br />
que iria morrer imediatamente e tinha que passar para a frente a<br />
notícia da “Boa Nova”. Tentaram me convencer a não ir, mas não<br />
En<strong>de</strong>reço para correspondência:<br />
Instituto <strong>de</strong> <strong>Psiquiatria</strong>- HC-FMUSP<br />
Rua Ovídio Pires <strong>de</strong> Campos s/n - sala 4039<br />
05403-010 - São Paulo- SP<br />
E-mail: helkis@usp.br<br />
Casos Clin Psiquiat 1999; 1(1):3-11 3