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caderno 23 - História da Medicina

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De facto, no dia 27 de Novembro de 1532, o Imperador<br />

escreve uma carta a Maria de Hungria, retrocedendo<br />

claramente na sua política contra o monopólio<br />

que estava, em grande medi<strong>da</strong>, nas mãos dos<br />

cristãos-novos 9 . A isso havia sido forçado pelo inesperado<br />

desenrolar dos acontecimentos e, acima de<br />

tudo, pela intervenção pessoal dos reis de Portugal<br />

e de Inglaterra, ou seja, D. João III, D. Catarina e<br />

Henrique VIII 10 . Todos intercedem em favor de Diogo<br />

Mendes Benveniste, não deixando de apontar os<br />

graves e incomportáveis prejuízos que a sua prisão<br />

e consequente confisco dos bens a todos causaria.<br />

É assim que to<strong>da</strong>s as acusações a Diogo Mendes<br />

são retira<strong>da</strong>s e, volvidos cerca de dois meses<br />

desde a sua prisão, é posto em liber<strong>da</strong>de contra a<br />

entrega de uma vultuosa caução 11 .<br />

Não obstante a libertação de Diogo Mendes<br />

parecer prenunciar um apaziguamento <strong>da</strong> tensão<br />

vivi<strong>da</strong> no seio dos mercadores cristãos-novos, a<br />

ver<strong>da</strong>de é que a política de Carlos V e de Maria de<br />

Hungria não sofreu alterações significativas. Ain<strong>da</strong><br />

o processo Mendes estava na memória de todos,<br />

quando, em Dezembro de 1533, António Fernandes<br />

12 , um outro influente mercador cristão-novo,<br />

também membro do Consórcio <strong>da</strong> Pimenta, é preso<br />

por ordem do Imperador, quando se dirigia a cavalo<br />

para Lião.<br />

Assistimos a uma reedição do processo Mendes<br />

com idênticas acusações de participação no<br />

monopólio <strong>da</strong>s especiarias, mas igualmente de permanência<br />

ilegal nos Países-Baixos. Mais uma vez,<br />

torna-se patente um antagonismo entre a Comuna<br />

de Antuérpia e o poder central, estabelecido em Bruxelas,<br />

nas mãos de Maria de Hungria e de Carlos V.<br />

6. O Processo contra o Mestre João Rodrigues<br />

e Estêvão Pires<br />

Mestre João Rodrigues de Castelo Branco chega<br />

a Antuérpia, pouco antes de Outubro de 1534,<br />

precisamente quando ain<strong>da</strong> decorria a fase mais<br />

conturba<strong>da</strong> dos acontecimentos. Estava em curso<br />

o processo de António Fernandes 13 , que continuava<br />

detido. À chega<strong>da</strong>, reencontra o primo Estêvão Pires,<br />

em casa de quem é acolhido, o qual era <strong>da</strong>do<br />

como associado de António Fernandes no Consórcio<br />

<strong>da</strong> Pimenta e, de alguma forma, havia sido envolvido<br />

no processo, pois foi o monopólio, no fundo,<br />

que sempre esteve em causa.<br />

10<br />

MEDICINA NA BEIRA INTERIOR DA PRÉ-HISTÓRIA AO SÉCULO XXI<br />

No decurso <strong>da</strong> investigação que temos desenvolvido<br />

nos últimos anos sobre a história dos judeus<br />

portugueses, cujo ponto de parti<strong>da</strong> foi precisamente<br />

a apresentação de um estudo inovador sobre<br />

a constituição, activi<strong>da</strong>des e diáspora <strong>da</strong> família<br />

Pires-Cohen pela Europa de Quinhentos 14 , comprovámos,<br />

recentemente, que Amato Lusitano foi para<br />

Antuérpia ao serviço do mercador Henrique Pires,<br />

homem forte <strong>da</strong> família Pires-Cohen. Na ver<strong>da</strong>de,<br />

o conhecimento aprofun<strong>da</strong>do <strong>da</strong> família, de que<br />

Amato Lusitano faz parte integrante, conduziu-nos<br />

à redescoberta e interpretação de um conjunto de<br />

documentos a que os investigadores, a julgar pelas<br />

muito escassas e vagas referências que lhes foram<br />

feitas, nunca deram a atenção devi<strong>da</strong> 15 .<br />

Referimo-nos a um núcleo de documentos que<br />

faz parte de um processo que foi movido, no Tribunal<br />

de Antuérpia (Vierschaar), a Meester Jehan Roderigo.<br />

Não restam dúvi<strong>da</strong>s de que o réu principal deste<br />

valioso processo é, precisamente, Mestre João<br />

Rodrigues de Castelo Branco (Amato Lusitano), recém-chegado<br />

de Portugal, no Outono de 1534. Esta<br />

documentação fornece <strong>da</strong>dos muito importantes,<br />

até este momento completamente desconhecidos,<br />

não apenas sobre o próprio Amato Lusitano, como<br />

também sobre os demais membros <strong>da</strong> família Pires-<br />

Cohen, com particular destaque para Henrique Pires<br />

e Estêvão Pires.<br />

Limitemo-nos, de segui<strong>da</strong>, a traçar o fio condutor<br />

dos principais acontecimentos, à luz dos novos<br />

<strong>da</strong>dos fornecidos por estes documentos, de que<br />

apresentamos a tradução portuguesa dos excertos<br />

mais relevantes 16 .<br />

No dia 16 de Outubro de 1534, em Antuérpia,<br />

o Bailio deu ordem de prisão a dois cristãos-novos<br />

portugueses, Mestre João Rodrigues e Estêvão Pires.<br />

Mestre João Rodrigues, recém-chegado de<br />

Portugal, é acusado de ser cristão-novo e de permanecer<br />

ilegalmente em Antuérpia, desrespeitando<br />

as disposições legais decreta<strong>da</strong>s por Carlos V, em<br />

Agosto de 1532, que proibiam a emigração de cristãos-novos<br />

portugueses para os Países-Baixos 17 . O<br />

mercador Estêvão Pires, que já estava estabelecido<br />

em Antuérpia em <strong>da</strong>ta anterior à do processo,<br />

é directamente envolvido porque o médico albicastrense<br />

se alojou em sua casa, sendo também ele<br />

preso e impedido, com grande prejuízo, de dispor<br />

dos seus armazéns e mercadorias.

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