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caderno 23 - História da Medicina

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humores, em quanti<strong>da</strong>de muito pequena ou<br />

muito grande, se isola do corpo, em vez de<br />

se manter misturado com os outros. Porque,<br />

necessariamente, quando um destes humores<br />

se isola e se mantém à parte, não só o local<br />

que deixou adoece, mas também o local onde<br />

se vai fixar e acumular, por consequência de<br />

uma saturação excessiva, provoca sofrimento<br />

e dor.».<br />

Após este texto, e durante mais de dois milénios,<br />

a grande maioria dos médicos ocidentais estava<br />

firmemente convenci<strong>da</strong> de que, com excepção<br />

dos traumatismos, a doença era uma perturbação<br />

geral ou local, provoca<strong>da</strong> pelas relações entre os<br />

quatro humores.<br />

Os médicos hipocráticos distinguem já, de forma<br />

mais ou menos implícita, a etiologia <strong>da</strong> doença,<br />

a patogénese. A perturbação humoral, juntamente<br />

com as manifestações clínicas, constitui a essência<br />

<strong>da</strong> doença 5 .<br />

Estavam estabeleci<strong>da</strong>s as bases racionais <strong>da</strong><br />

medicina grega, científico-especulativa. Aos poucos,<br />

as explicações sobrenaturais <strong>da</strong>s doenças foram<br />

substituí<strong>da</strong>s por explicações naturais 6 .<br />

Nas suas exposições didácticas, os autores<br />

médicos fizeram tentativas de classificar as doenças.<br />

Os seus esforços de tentar agrupar as enti<strong>da</strong>des<br />

nosológicas em grandes conjuntos foram, por<br />

vezes, bastante satisfatórios na prática mas mantiveram-se<br />

arbitrários e incoerentes, sob o ponto de<br />

vista teórico, <strong>da</strong><strong>da</strong> a deficiência dos seus conhecimentos<br />

de anatomia, fisiologia e patofisiologia.<br />

A classificação mais antiga <strong>da</strong> qual possuímos<br />

um testemunho literário é um poema de Pín<strong>da</strong>ro,<br />

que considera as doenças que nascem espontaneamente<br />

no corpo, os traumatismos e as doenças<br />

devi<strong>da</strong>s às influências externas <strong>da</strong>s estações 7 .<br />

Trata-se de outro excerto <strong>da</strong> III Ode Pítica, na<br />

qual o Poeta se refere à prática <strong>da</strong> medicina de então:<br />

- * - * -<br />

«[Estr. 3]<br />

Vinham até ele os aflitos por males congénitos<br />

ou os que<br />

tinham os membros feridos pelo bronze,<br />

cinzento ou por<br />

uma pedra lança<strong>da</strong> à distância ou, ain<strong>da</strong>, com<br />

os seus corpos<br />

MEDICINA NA BEIRA INTERIOR DA PRÉ-HISTÓRIA AO SÉCULO XXI<br />

esgotados pelo calor do Verão ou pelo frio do<br />

Inverno.<br />

Asclépio libertava-os. Expulsava to<strong>da</strong> a espécie<br />

de mal de<br />

quem quer que fosse, cui<strong>da</strong>ndo de uns com<br />

litanias ternas,<br />

de outros com poções calmantes, ou então<br />

aplicava-lhes<br />

remédios em redor dos membros. A outros<br />

endireitava-os<br />

com a cirurgia apropria<strong>da</strong>» (vv. 48-56) .<br />

- * - * -<br />

[Ant. 3]<br />

Mas também a perícia está refém do lucro.<br />

O ouro a brilhar nas mãos como recompensa<br />

sumptuosa<br />

persuadiu-o a ir resgatar um homem à morte.<br />

O filho<br />

de Cronos massajou-lhe, então o peito com<br />

as mãos,<br />

recuperando-lhe a respiração por breves<br />

instantes. Um raio<br />

incandescente cravou a morte de ambos. É<br />

preciso procurar<br />

junto <strong>da</strong>s divin<strong>da</strong>des o que é apropriado ao<br />

coração dos<br />

mortais, sabendo o que está perto de nós e<br />

que destino<br />

é o nosso.» vv. 48-62 .<br />

- * - * -<br />

É de notar que, em relação à medicina mágica<br />

antiga, esta medicina, basea<strong>da</strong> na observação e<br />

numa abor<strong>da</strong>gem racional <strong>da</strong> fisiologia e <strong>da</strong> patologia<br />

humana, deve ter trazido avanços consideráveis,<br />

em termos de uma maior eficácia terapêutica.<br />

Os avanços <strong>da</strong> medicina de então colocam o<br />

problema dos limites <strong>da</strong> intervenção médica. No poema,<br />

pela ousadia <strong>da</strong> transgressão, ambos, médico<br />

e doente, são fulminados com um raio, tendo Asclépio<br />

ascendido aos céus, tornado deus.<br />

Nos versos 56-57, por nós assinalados, a negrito,<br />

temos, penso, a primeira descrição de uma tentativa<br />

de ressuscitação, por massagem cardíaca, realiza<strong>da</strong><br />

com sucesso, embora por alguns instantes 10 .<br />

O estudo do conteúdo desta estrofe pareceume<br />

merecer uma maior atenção. Resolvi comparar<br />

traduções. Não sabendo grego 11 , confrontei a tradução<br />

<strong>da</strong> Antístrofe 3 com a versão inglesa <strong>da</strong> Loeb:<br />

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