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tas pessoas faziam, ao bocejarem, cruzes sobre a<br />
boca, com o dedo polegar, acompanha<strong>da</strong> de uma<br />
prece ou reza, como rito de protecção ou preser-vação,<br />
para que a doença não entrasse no corpo. Este<br />
rito foi praticado durante a pneumónica, pande-mia<br />
de gripe, que atingiu o país em 1918 e 1919.<br />
Quando a tuberculose fazia muitas vítimas,<br />
algumas pessoas, com medo do contágio (Ftisiofobia),<br />
quando alguém entrasse nas suas casas,<br />
lim-pavam, com álcool, corrimãos e outros objectos,<br />
por-que elas poderiam ter tuberculose. Em casos de<br />
des-confiança, ou doença declara<strong>da</strong>, os objectos,<br />
pratos, malgas, etc., usados por essas pessoas,<br />
eram des-truídos e os resíduos lançados para longe.<br />
Até meados do século XX, existiu, nos campos,<br />
o medo <strong>da</strong> raiva (Quinofobia), doença propaga<strong>da</strong><br />
pela mordedura dos cães raivosos ou preados,<br />
porta-dores <strong>da</strong> doença. Diziam que quando um<br />
cão se mi-rava num espelho de água estava preado.<br />
Todos fu-giam dele.<br />
O medo de ficar só e o medo <strong>da</strong> velhice<br />
O homem tem medo de ficar só consigo mesmo<br />
(Autofobia), preferindo, como ser social, companhias<br />
por vezes insignificantes e desagradáveis.<br />
Este medo relacional, que surge com mais intensi<strong>da</strong>de<br />
nas pessoas idosas, que, por vezes, tira o<br />
sentido à vi<strong>da</strong>, funciona como uma impressão de<br />
constrangimento, com sintomas terror, difíceis de<br />
superar, por vezes, racionalizados com sentimentos<br />
de culpa, por não se ter feito isto ou aquilo. Medo<br />
atenuado, quando havia descendência, porque, pelas<br />
normas morais familiares, os velhos eram inseridos<br />
nas casas dos filhos, num sistema chamado de<br />
ro<strong>da</strong>, instalados segundo uma ordem por períodos<br />
de es-ta<strong>da</strong> iguais.<br />
Este medo acompanha as pessoas, que, por<br />
vezes, são toma<strong>da</strong>s de pavor, por se sentirem velhas<br />
de mais. Isto, porque a nossa cultura concede<br />
relevo aos atributos <strong>da</strong> juventude, como vivaci<strong>da</strong>de<br />
e vigor físico, quali<strong>da</strong>des primordiais para um<br />
mundo compe-titivo. O medo de ficar velho (Gerascofobia)<br />
pode ser atenuado quando uma pessoa<br />
teve uma vi<strong>da</strong> pro-dutiva, em quaisquer campos<br />
de activi<strong>da</strong>de. Na região <strong>da</strong> Gardunha, quando as<br />
pessoas começavam a sen-tir o peso <strong>da</strong> i<strong>da</strong>de, por<br />
sentimentos de culpa, jul-gavam-se um peso para<br />
as famílias e um fardo para a socie<strong>da</strong>de. O medo <strong>da</strong><br />
MEDICINA NA BEIRA INTERIOR DA PRÉ-HISTÓRIA AO SÉCULO XXI<br />
solidão e o medo de ficar velho são expressões de<br />
sentimentos que an<strong>da</strong>m associ-a<strong>da</strong>s.<br />
O medo <strong>da</strong> morte, <strong>da</strong> má morte e dos cemitérios<br />
Relacionado com o medo de envelhecer, es-tá<br />
o medo <strong>da</strong> morte (Tanatofobia), um horror que pode<br />
dominar conscientemente os indivíduos, condicionando-os<br />
a uma ansie<strong>da</strong>de que se perpetua de<br />
dia para dia. A morte representa o primeiro factor dos<br />
me-dos. Medo de perder o corpo e medo de perder o<br />
es-pírito, de perder um familiar ou um amigo.<br />
A dicotomia existencial mais primária do homem<br />
está entre a vi<strong>da</strong> e a morte. O homem tem<br />
ten-tado corrigir ou mesmo negar essa dicotomia<br />
através de ideologias, como a concepção de imortali<strong>da</strong>de,<br />
promovendo a existência de uma alma<br />
imortal, para superar o trágico destino <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> terminar<br />
com a mor-te.<br />
Os agentes <strong>da</strong>s religiões serviram-se <strong>da</strong> manipulação<br />
do medo para inculcar na mente <strong>da</strong>s pessoas<br />
o respeito e os valores essenciais necessários<br />
ao bom cumprimento dos deveres e <strong>da</strong>s regras fun<strong>da</strong>mentais.<br />
Com o Cristianismo, a morte foi transforma<strong>da</strong><br />
num símbolo do medo, que se moldou nos<br />
espíritos <strong>da</strong>s pessoas ao longo dos tempos.<br />
To<strong>da</strong>s as pessoas têm medo <strong>da</strong> morte, mas,<br />
com a i<strong>da</strong>de, pensam mais nesse momento em que,<br />
como seres vivos, deixam de existir, tendo transmitido<br />
ou não vi<strong>da</strong>. Os crentes, com a aproximação <strong>da</strong><br />
mor-te, rezam mais, dão mais esmolas, fazem mais<br />
pro-messas, por terem medo do Inferno (Hadefobia<br />
ou Estigiofobia) e para que tenham uma boa morte.<br />
Dei-xam bens em testamento às Igrejas, às Misericórdias<br />
e Irman<strong>da</strong>des. Normalmente, as pessoas,<br />
que mais temem a morte, são as que sentem remorsos<br />
pelo mal que fizeram ou pelos pecados que<br />
cometeram, o medo do pecado (Pecatofobia).<br />
O medo de uma má morte, como a morte dolorosa,<br />
com dor continua<strong>da</strong>, a morte fora <strong>da</strong> família,<br />
está presente em muitas pessoas. Para os mais velhos,<br />
uma má morte é também morrer e ser enterrado<br />
fora <strong>da</strong> sua terra, porque a alma pode perder-se<br />
e não encontrar as almas dos conterrâneos falecidos,<br />
ideia que está associa<strong>da</strong> ao facto de não ser<br />
enterrado junto dos amigos e parentes.<br />
Os cemitérios sempre foram factor de medos<br />
(Coimetrofobia). Algumas pessoas não passam<br />
perto dos cemitérios durante a noite, com o medo<br />
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