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Quem era o Dr. Luís Cebola<br />
José Luís Rodrigues Cebola 5 , nasceu em Alcochete<br />
em 1876, formando-se na Escola Médico-<br />
Cirúrgica de Lisboa em 1906 6 , tendo-se orientado<br />
para a especiali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s doenças nervosas. Neste<br />
ano participou no XV Congrès International de Médicine<br />
em Lisboa, 19 a 26 de Abril 7 . Diz <strong>da</strong> vocação<br />
para a psiquiatria:“Quando entrei no quinto ano e<br />
para o internato dos hospitais civis, ain<strong>da</strong> não sentia<br />
o imperativo de uma decisão na escolha <strong>da</strong> especiali<strong>da</strong>de”<br />
8 . E reconhece como Dubois, o seu “tratamento<br />
e assistência moral” e S. João de Deus, e<br />
a sua “dedicação inexcedível”, o despertaram o<br />
tratamento dos perturbados psíquicos. No seu livro<br />
Psiquiatria Forense volta a dizer que “no século XVI<br />
S. João de Deus, natural de Montemor-o-Novo, foi<br />
modelo de sacrifício e dedicação” 9 . «Ao ler os primeiros<br />
capítulos (do livro de Dubois) deveras atraentes<br />
pelo conteúdo sugestivo e pela forma simples,<br />
mas elegante do estilo, a eles se prendia ca<strong>da</strong> vez<br />
mais a minha atenção. Chegando à última página,<br />
perguntei a mim mesmo:será possível curar perturbações<br />
acabrunhantes, pe nosas, como Dubois nos<br />
apresenta, sem intervenção de remédios de farmácia?!<br />
Da vi<strong>da</strong> de S. João de Deus fala nestes<br />
termos:“Decorrido pouco tempo, um outro amigo<br />
me emprestava o livro, Vi<strong>da</strong> de S. João de Deus,<br />
onde se põe em relevo a dedicação inex cedível do<br />
Santo português. Enfim, as duas obras excelentes<br />
deixaram-me entrever o precio síssimo valor <strong>da</strong> assistência<br />
moral aos psicopatas e despertaram, no<br />
meu espírito, a vocação para seguir com entusiasmo<br />
o caminho <strong>da</strong> Psiquiatria”.<br />
O tema e a defesa <strong>da</strong> sua tese de doutoramento<br />
foram motiva<strong>da</strong>s por este interesse, orientandoa<br />
para a análise dos trabalhos artísticos e literários<br />
dos pacientes.<br />
Tudo isso o levou a criar e organizar um Museu<br />
Ergoterápico a que se refere no Almas Delirantes 10 ,<br />
em que dá um documentário vivo sobre o Telhal anterior<br />
a 1925. Valoriza as ocupações e competências<br />
positivas e construtivas dos pacientes como<br />
leitmotiv de tratamento e reabilitação, em detrimento<br />
<strong>da</strong> focagem nos sintomas negativos, na linha <strong>da</strong><br />
reabilitação psicossocial avant la lettre, como se exprime<br />
na tese de doutoramento:<br />
“Resolvi-me, pois, a defender a minha<br />
MEDICINA NA BEIRA INTERIOR DA PRÉ-HISTÓRIA AO SÉCULO XXI<br />
tese de doutorado 11 sobre um assunto pertencente<br />
a esse ramo <strong>da</strong> ciência médica, que eu<br />
inti tulei “A Mentali<strong>da</strong>de dos Epilépticos”, analisando,<br />
de preferência, os seus míseros produtos<br />
artísticos e literários” (l.c.).<br />
O Dr. Cebola trabalhou e investigou no Hospital<br />
Rilhafoles e em 1911, e foi nesse ano nomeado,<br />
para Director Clínico do Mani cómio do Telhal, cargo<br />
que assumiu em 2 de Janeiro de 1911, assumiu<br />
o cargo de Director Clínico <strong>da</strong> Casa de Saúde do<br />
Telhal 12 . Fez visitas de estudo ao estrangeiro, escreveu<br />
e publicou livros técnicos, livros didácticos e<br />
ensaios literários até 1948, ano em que se reformou,<br />
vindo a falecer em 1967.<br />
Vigilante de Afonso Costa na Casa de Saúde<br />
do Telhal?<br />
O Governo Provisório publicou em 13 de Maio<br />
de 1911, a lei para regular a assistência dos psicopatas,<br />
que o Dr. Luís Cebola insere quase na íntegra<br />
no seu livro Enfermagem Especial de Psicopatas 13 ,<br />
lei que distingue quatro categorias de manicómios:<br />
manicómios de ensino, manicómios regionais, manicómios<br />
criminais e manicómios asilos (art. 1.º),<br />
em cuja categoria se integrava o Telhal.<br />
A sua nomeação para Director Clínico do Telhal<br />
surge no contexto de revolução republicana de<br />
expulsão <strong>da</strong>s Ordens Religiosas do país. No dia 15<br />
de Outubro, o Ministro Afonso Costa, visita as Casas<br />
de Saúde do Telhal e <strong>da</strong> I<strong>da</strong>nha, e com certa surpresa<br />
não expulsou os Irmãos de S. João de Deus<br />
e nem as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração<br />
de Jesus, como desejaria. Teria o Dr. Luís Cebola o<br />
papel de vigilante de confiança do governo naquele<br />
manicómio, não ousasse alguém pôr entraves à<br />
revolução republicana? 14 .<br />
Talvez possamos hoje considerar um trunfo,<br />
para a Casa de Saúde e para os Irmãos, a sua presença<br />
na Casa de Saúde do Telhal. Por 1917 deuse<br />
o inesperado. O Ministério <strong>da</strong> Guerra recorreu à<br />
Casa de Saúde do Telhal para tratar e assistir os militares<br />
extenuados de guerra, regressados <strong>da</strong>s frentes<br />
de batalha <strong>da</strong> Grande Guerra. Além de ser um<br />
marco de reconhecimento do nível e quali<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />
sua assistência, permitiu que os Irmãos em vez de<br />
cumprir o serviço militar obrigatório nos Quartéis e no<br />
Hospital Principal Militar <strong>da</strong> Estrela, agora o podiam<br />
cumprir na assistência dos militares internados 15 .<br />
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