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Como eu conheci o Dr. Luís Cebola<br />
Começo 1 por recor<strong>da</strong>r o Telhal de 1942 a 1948<br />
onde conheci o Dr. Luís Cebola quando frequentava<br />
o colégio <strong>da</strong> Ordem Hospitaleira de S. João de Deus.<br />
Em 1943 a Casa de Saúde do Telhal comemorava<br />
os 50 anos de existência<br />
e o Dr. Luís Cebola<br />
foi solicitado, pelo Pe.<br />
João Gameiro, para colaborar,<br />
com um capítulo,<br />
num livro 2 que se estava<br />
a escrever:“Evolução<br />
Terapêutica na Casa de<br />
Saúde do Telhal”.<br />
Em 1947 e 1948,<br />
sendo eu noviço e aju<strong>da</strong>nte<br />
de enfermaria, tive<br />
ocasião de de observar<br />
alguns dos tratamentos<br />
que utilizava. Um paciente,<br />
de entre tantos, com<br />
síndroma de Korsakof<br />
de base alcoólica, desorientados<br />
no tempo e<br />
no espaço, alucinado e<br />
delirante, foi isolado no<br />
quarto. Após uma dose<br />
de 20 ou 30 gramas de sulfato de sódio, levava-lhe<br />
cafeteiras de café com leite ao quarto onde, preso à<br />
cama, me impressiou, com a sua gritaria, que tirasse<br />
aquelas cobras que se passeavam por ali nas paredes.<br />
Outro chamava a atenção para as mana<strong>da</strong>s<br />
de cavalos que as suas alucinações o faziam ver no<br />
monte em frente <strong>da</strong> janela.<br />
Era também o tempo de muitos ECs semanais,<br />
os quais, associados à ergoterapia concorreram<br />
para centenas de altas de doentes agudos há longos<br />
anos internados.<br />
126<br />
MEDICINA NA BEIRA INTERIOR DA PRÉ-HISTÓRIA AO SÉCULO XXI<br />
EVOCAçãO DE UM MéDICO ESqUECIDO, O DR. LUíS CEbOLA<br />
pIONEIRO DA OCUpAçãO ERgOTERÁpICA NA CASA DE SAúDE DO TELhAL,<br />
DA ORDEM hOSpITALEIRA DE S. JOãO DE DEUS *<br />
Aires GAMEIRO **<br />
O Museu Ergoterápico, o primeiro do género<br />
em Portugal, criado, no pavilhão de S. José, nos<br />
anos vinte pelo Dr. Luís Cebola, impressionaram a<br />
minha imaginação de jovem pelas produções manuais<br />
e artísticas, desenhos<br />
e esculturas, entre<br />
as quais um busto do<br />
Cebola e um retrato dele<br />
dentro de uma cebola.<br />
A fase final <strong>da</strong> direcção<br />
clínica do Dr.<br />
Luís Cebola no Telhal<br />
coincidiu com a introdução<br />
<strong>da</strong> insulinoterapia,<br />
electrochoque, e demais<br />
terapias convulsivantes,<br />
assim como com as dezenas<br />
de leucotomias do<br />
Prof. Egas Moniz. Assisti,<br />
na sala de operações,<br />
em Novembro de 1947,<br />
a quatro delas 3 , e prestei,<br />
como aju<strong>da</strong>nte, cui<strong>da</strong>dos<br />
do pós-operatório<br />
aos mesmos pacientes.<br />
Foi contudo o Dr. Diogo<br />
Furtado, médico militar, que seleccionava os enfermos,<br />
quase todos militares.<br />
Desde 1931, trabalhava também na Casa de<br />
Saúde o Dr. António Meira de Carvalho como clínico<br />
geral, o qual se referiu ao Dr. Luís Cebola como<br />
“acérrimo democrata, bom psicólogo, mas um ignorante<br />
em clínica geral” 4 .<br />
A história desta Instituição, e por arrastamento<br />
a obra do Dr. Luís Cebola, ou vice-versa, tem sido<br />
parcialmente ignora<strong>da</strong> e quase ostraciza<strong>da</strong> pelos<br />
historiadores <strong>da</strong> psiquiatria portuguesa.