Weekend 1195 : Plano 56 : 1 : P.gina 1 - Económico
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O MEU MUNDO<br />
Nuno Artur Silva<br />
Novas sobre<br />
o achamento<br />
do Brasil<br />
“Primeiro encontramos, depois procuramos”<br />
dizia Picasso, pintor espanhol e do mundo. Nós,<br />
portugueses, primeiro encontrámos o Brasil.<br />
Falta agora, mais de quinhentos anos depois,<br />
procurá-lo.<br />
O começo não podia ter sido mais auspicioso,<br />
segundo a narrativa que dele fez Pêro Vaz de<br />
Caminha na carta em que escreveu a El Rei D.<br />
Manuel “a nova do achamento desta vossa terra<br />
nova”. E a terra nova que achávamos era, para<br />
além da terra real primeiro intitulada de Vera<br />
Cruz, a nova Língua Portuguesa, pátria que<br />
Pessoa haveria de proclamar séculos depois. E<br />
Caetano de cantar, roçando a sua língua na<br />
língua de Luís de Camões. E perguntando: “o<br />
que quer, o que pode esta língua?”, e<br />
respondendo “Livros, discos, vídeos à mancheia<br />
/ E deixa que digam, que pensem, que falem”.<br />
Faz 75 anos que Pessoa escreveu a “Mensagem”,<br />
o seu único livro de poemas em português que<br />
foi publicado antes da sua morte e que agora a<br />
Guimarães edita em cópia do dactiloscrito<br />
ori<strong>gina</strong>l. Em vez dos poemas com nomes de reis<br />
e heróis, hiperbolizados e ultra-citados, escolho<br />
uma passagem do lado B do livro, do poema<br />
Horizonte, que fala da terra a abrir-se em sons e<br />
cores “E, no desembarcar, há aves, flores, /<br />
Onde era só, de longe a abstracta linha”.<br />
Para além do épico d’”Os Lusíadas” e do pícaro<br />
da “Peregrinação” há na pátria marítima da<br />
Língua Portuguesa navegações e derivas que só a<br />
poesia alcança. “Outros dirão senhor as<br />
singraduras / Eu vos direi a praia onde luzia / A<br />
primitiva manhã da criação”, escrevia Sophia; e<br />
de novo e sempre Sophia: “Vi as águas os cabos<br />
vi as ilhas / E o longo baloiçar dos coqueirais<br />
(...) As ordens que levava não cumpri / E assim<br />
contando tudo quanto vi / Não sei se tudo errei<br />
ou descobri”.<br />
Ou Al Berto no conjunto de poemas Salsugem<br />
escrevendo do marinheiro que “... ficava a<br />
bordo encostado às amuradas horas a fio (...)<br />
com “a vontade sempre urgente de partir” ou<br />
das mulheres que ficavam “à beira mar<br />
debruçadas para a luz caiada / remendando o<br />
pano das velas espiando o mar / e a longitude do<br />
amor embarcado...”, (...) acreditando que<br />
algum homem ao passar se espantasse com a<br />
minha solidão.../ (anos mais tarde, recordo-me<br />
agora, cresceu-me uma pérola no coração, mas<br />
estou só, muito só, não tenho a quem a deixar.)”<br />
Só na poesia nos encontramos, no esplendor da<br />
Língua que é a Literatura, nossa única pátria.<br />
“Falta cumprir-se Portugal” dizia Pessoa na<br />
“Mensagem”. Esse Quinto Império mítico é o do<br />
sonho e da música da Literatura em Língua<br />
Portuguesa, hoje disseminada por todo o mundo<br />
em “livros, discos, vídeos à mancheia”. O futuro<br />
de Portugal é a mistura, a mestiçagem e a<br />
vadiagem da língua portuguesa pelo mundo. O<br />
futuro de Portugal é o Brasil.<br />
O acordo ortográfico é útil e inútil porque<br />
inevitável. Se não formos com o Brasil para o<br />
mundo ficaremos mirandeses e o nosso<br />
português ficará o mirandês do português.<br />
Se há um desígnio para a CPLP é a criação de<br />
uma verdadeira comunidade cultural. A<br />
revolução da internet definindo um novo<br />
território imaterial traz consigo a oportunidade<br />
para a criação dessa comunidade.<br />
É tempo de procurar o Brasil. É tempo do Brasil<br />
nos descobrir.<br />
Tyler Brûlé<br />
Um canadiano<br />
em Paris<br />
Estou a escrever esta coluna num comboio de alta-<br />
-velocidade entre Paris e Lausanne e, nem de<br />
propósito, sinto cada minuto até ao Natal a correr<br />
tão depressa como estas carruagens.<br />
Não sei como está a vossa agenda, mas o meu<br />
assistente Alex preencheu a minha para as<br />
próximas semanas com tal precisão que não há<br />
espaço para atrasos em Milão em virtude do<br />
nevoeiro, para esperar por passageiros atrasados<br />
em Londres ou para ficar mais uns minutos na<br />
cama. Durante esta semana, mas precisamente na<br />
segunda-feira, gravei uma série radiofónica sobre<br />
o Natal (daqui a uma semana pode aceder a esta<br />
mesma série no iTunes), na terça-feira fui a uma<br />
festa em Milão, na quarta-feira voei para Tóquio,<br />
tive reuniões em Nagoya na sexta-feira, fui à festa<br />
de Natal do pessoal da “Monocle Tóquio” no<br />
sábado, a Quioto no Domingo e nesse mesmo dia<br />
ainda tive outra festa em Tóquio. Na segunda-feira<br />
voei para Madrid e na terça apanhei um avião de<br />
manhã cedo para Londres.<br />
Falta menos de um mês para o Natal, com todas as<br />
delícias, festas e desgaste que acompanham esta<br />
época festiva. Se for super organizado,<br />
provavelmente não está muito preocupado, já que<br />
há meses vem comprando presentes para os seus<br />
entes queridos e colegas e só tem agora que<br />
embrulhá-los e encaminhá-los para as respectivas<br />
árvores de Natal. Há duas semanas atrás, quando<br />
estava eu a coordenar todos os meus presentes<br />
com os meus colegas Pam e Ariel numa verdadeira<br />
sessão intensiva de selecção e etiquetagem que<br />
demorou mais de duas horas na minha loja favorita<br />
quando tive a feliz ideia de esperar para fazer a<br />
maior parte das compras de Natal quando tivesse<br />
tempo na minha escala em Marunouchi e Ginza.<br />
Mas um furo inesperado na minha agenda na<br />
segunda-feira em Paris deu-me a possibilidade de<br />
gozar algumas horas livres entre reuniões e fazer<br />
algumas compras.<br />
Os franceses podem não ser bons em muitas coisas<br />
(o café é um conceito que, pura e simplesmente,<br />
não compreendam, algo que os bons genes<br />
italianos de Carla Bruni talvez ajudem a resolver)<br />
mas fazem um trabalho muito bom quando se trata<br />
de gastar o dinheiro dos contribuintes em<br />
iluminações de Natal. Enquanto em Londres as<br />
luzes desta quadra estão demasiado associadas (ler<br />
financiadas) a Hollywood e são declaradamente<br />
comerciais, já na Place Vendôme e nos Champs-<br />
-Elysées a iluminação pauta-se pela elegância e os<br />
átrios dos hotéis estão muito bem decorados com<br />
velas cintilantes e no ar sente-se o cheiro de doces<br />
fragrâncias. Não é preciso muito para entrarmos<br />
nesse frenesim de compras. Quando dei conta<br />
tinha já comprado os presentes para um quarto das<br />
pessoas da minha lista. Se se começar a sentir<br />
intimidado com a dimensão da sua lista de<br />
compras de Natal e se tiver um dia livre, então um<br />
giro por Paris pode revelar-se bastante frutífero.<br />
Em seguida apresento algumas das lojas<br />
recomendadas onde pode encontrar presentes<br />
para todos.<br />
Outlook | Sábado, 5.12.2009 | 39<br />
Kitsuné Maison. Metade casa de moda, metade<br />
editora, a Kitsuné tem uma pequena colecção<br />
muito chique de vestuário e bons acessórios para<br />
homem e mulher. Aí pode encontrar uma linda<br />
mala a tiracolo para o seu irmão, um casaco com<br />
muito bom corte para o seu assistente, velas<br />
aromáticas de sésamo para os seus vizinhos<br />
encantadores e gillettes de caxemira.<br />
Sadaharu Aoki. Considerada por muito a rainha<br />
dos macarons, as pâtisseries da Aoki têm umas<br />
embalagens muito elegantes e combinações de<br />
sabores exóticos. A sua avó vai adorar e é uma boa<br />
opção para quem gosta de encher as meias<br />
penduradas na chaminé.<br />
APC. Com as suas peças simples de ganga,<br />
camisolas básicas e uma oferta interessante em<br />
matéria de gangas é difícil sair da APC de mãos a<br />
abanar. O visual aqui proposto é intemporal e é<br />
uma boa aposta para adolescentes não rebeldes e<br />
para parceiros mais progressistas.<br />
John Lobb. Agora que as obras do seu novo atelier<br />
na Rue Magadon estão concluída vale a pena ver a<br />
oferta deste criador que faz de usar por casa por<br />
encomenda, sapatos estes que mais parecem um<br />
concorde e que são o ideal para mães, para<br />
membros do conselho de administração e para<br />
baby-sitters.<br />
Hervé Chapelier. Ao fim destes anos todos, as<br />
malas de nylon de Hervé Chapelier continuam a<br />
agradaratodos,dassograsàsirmãsmais<br />
esquisitas, sendo também o presente indicado para<br />
que precisa de um acessório rijo e clássico.<br />
Officina Slowear. Atenção a todas as esposas,<br />
namoradas e namorados. Um dos pedidos que mais<br />
recebi na caixa de correio desta coluna foi uma<br />
lista de agentes das calças Incotex– fabricantes dos<br />
chinos com o melhor corte. A empresa mãe abriu<br />
recentemente uma loja em Paris onde vende<br />
também camisas, camisolas e casacos, pelo que<br />
pode surpreender o homem, ou os homens da sua<br />
vida, seleccionando uma pilha de calças que eles<br />
vão poder usar em qualquer parte. Esta loja<br />
também tem roupa para mulher.<br />
Colette. Se só tem 30 minutos e quer uma boa<br />
selecção de produtos de beleza para as colegas do<br />
seu escritório, T-shirts para os rapazes, DVDs para<br />
as próximas semanas em Verbier e alguns livros<br />
provocantes para colocar sobre a mesa da sala,<br />
então a Colette continua a ser a melhor aposta. E<br />
os seus embrulhos ficam lindos debaixo da árvore<br />
de Natal.<br />
Kurkdjian Parfums. E quando achávamos que na<br />
cidade já não havia lugar mais uma casa de<br />
fragrâncias distintas eis que aparece o maestro<br />
Francis Kurkdjian com a sua pequena loja de<br />
papéis de incenso, uma série de fragrâncias para<br />
homem e para mulher, uma edição especial de<br />
sabões e a melhor coisa que há para colocar nas<br />
meias – bolinhas aromáticas com cheiro a menta e<br />
a relva acabada de aparar.<br />
Tyler Brûlé é director da revista Monocle<br />
Exclusivo Financial Times<br />
Tradução de Carlos Tomé Sousa