francamente orentina, como os Cavalcântis de Pernambuco. E como o doutor demorasse nailustre cidade anchietana, sem demora nos partimos para cá, em busca do velocino roubado. Asnossas relações actuais com o doutor Venceslau são as mais lisonjeiras possíveis; e sem dúvidamui para breve recebereis a grata nova de que hemos reavido o talismã; e por ela vos pediremosalvíssaras.Porque, súbditas dilectas, é incontestável que Nós, Imperator vosso, nos achamos emprécaria condição. O tesouro que d’aí trouxemos, foi-nos de mister convertê-lo na moedacorrente do país; e tal conversão muito nos há dicultado o mantenimento, devido ás oscilaçõesdo Cámbio e á baixa do cacau.Sabereis mais que as donas de cá não se derribam á pauladas, nem brincam por brincar,gratuitamente, senão que á chuvas do vil metal, repuxos brasonados de champagne, e unsmonstros comestíveis, a que, vulgarmente dão o nome de lagostas. E que monstros encantados,senhoras Amazonas!!! Duma carapaça polida e sobrosada, feita a modo de casco de nau, saembraços, tentáculos e cauda remígeros, de muitos feitios; de modo que o pesado engenho, depostonum prato de porcelana de Sêvres, se nos antoja qual velejante trirreme a bordeisjar água deNilo, trazendo no bojo o corpo inestimável de Cleópatra.Ponde tento na acentuação deste vocábulo, senhoras Amazonas, pois muito nos pesara nãopreferísseis conosco, essa pronúncia, condizente com a lição dos clássicos, á pronúnciaCleopátra, dicção mais moderna; e que alguns vocabulistas levianamente subscrevem, sem quese apercebam de que é ganga desprezível, que nos trazem, com o enxurro de França, osgaliparlas de má morte.Pois é com esse delicado monstro, vencedor dos mais delicados véus paladinos, que as donasde cá tombam nos leitos nupciais. Assim haveis de compreender de que alvíssaras falàmos;porque as lagostas são caríssimas, caríssimas súbditas, e algumas hemos nós adquiridas porsessenta contos e mais; o que, convertido em nossa moeda tradicional, alcança a vultuosa somade oitenta milhões de bagos de cacau... Bem podereis conceber, pois, quanto hemos já gasto; eque já estamos carecido do vil metal, para brincar com tais difíceis donas. Bem quiséramosimpormos á nossa ardida chama uma abstinéncia, penosa embora, para vos pouparmos despesas;porêm que ánimo forte não cedera ante os encantos e galanteios de tão agradáveis pastoras!Andam elas vestidas de rutilantes jóias e panos níssimos, que lhes acentuam o donaire doporte, e mal encobrem as graças, que, a de nenhuma outra cedem pelo formoso do torneado epelo tom. São sempre alvíssimas as donas de cá; e tais e tantas habilidades demonstram nobrincar, que enumerá-las, aqui, seria fastiendo porventura; e, certamente, quebraria osmandamentos de discrição, que em relação de Imperator para súbditas se requer. Que beldades!Que elegáncia! Que cachet! Que dégagé amífero, ignívomo, devorador!! Só pensamos nelas,muito embora não nos descuidemos, relapso, da nossa muiraquitã.Nós, nos parece, ilustres Amazonas, que assaz ganharíeis em aprenderdes com elas, as
condescendéncias, os brincos e passes do Amor. Deixaríeis então a vossa orgulhosa e solitáriaLei, por mais amáveis mesteres, em que o Beijo sublima, as Volúpias encandecem, e sedemonstra gloriosa, “urbi et orbe”, a subtil força do Odor di Fêmia, como escrevem os italianos.E já que nos detivemos neste delicado assunto, não no abandonaremos sem mais algunsreparos, que vos poderão ser úteis. As donas de São Paulo, sobre serem mui formosas e sábias,não se contentam com os dons e exceléncia que a Natura lhe concedeu; assaz se preocupam elasde si mesmas; e não puderam acabarem consigo, que não mandassem vir de todas as partes doglobo, tudo o que de mais sublimado e gentil acrisolou a ciéncia fescenina, digo, feminina dascivilizações avitas. Assim é que chamaram mestras da velha Europa, e sobretudo de França, ecom elas aprenderam a passarem o tempo de maneira bem diversa da vossa. Ora se alimpam, egastam horas nesse delicado mester, ora encantam os convívios teatrais da sociedade, ora nãofazem coisa alguma; e nesses trabalhos passam elas o dia tão entretecidas e afanosas que, emchegando a noute, mal lhes sobra vagar para brincarem e presto se entregam nos braços deOrfeu, como se diz. Mas heis de saber, senhoras minhas, que por cá dia e noute divergemsingularmente do vosso horário belígero; o dia começa quando para vós é o pino dele, e a noute,quando estais no quarto sono vosso, que, por derradeiro, é o mais reparador.Tudo isso as donas paulistanas aprenderam com as mestras de França; e mais o polimentodas unhas e crescimento delas, bem como aliás “horresco referens”, das demais partes córneasdos seus companheiros legais. Deixai passe esta florida ironia!E muito há que vos diga ainda sobre o jeito com que cortam as comas, de tal maneiragracioso e viril, que mais se assemelham elas a éfebos e Antínous, de perversa memória, que amatronas de tão directa progénie latina. Todavia, convireis conosco, no desacerto de longastranças por cá, si atenderdes ao que mais atrás cou dito; pois que os doutores de São Paulo nãoderribam as suas requestadas pela força, senão que a troco de oiro e de locustas, as ditas comassão de somenos; acrescendo ainda que assim se amainam os males, que tais comas acarretam, deserem moradia e pasto habitual de insectos mui daninhos, como entre vós se dá.Pois não contentes de terem aprendido de França, as subtilezas e passes da galantaria á LuísXV, as donas paulistanas importam das regiões mais inhóspitas o que lhes acrescente ao sabor,tais como pezinhos nipónicos, rubis da índia, desenvolturas norteamericanas; e muitas outrassabedorias e tesoiros internacionais.Já agora vos falaremos ainda, bem que por alto, dum nitente armento de senhoras,originárias da Polónia, que aqui demoram e imperam generosamente. São elas mui alentadas noporte e mais numerosas que as areias do mar oceano. Como vós, senhoras Amazonas, taisdamas formam um gineceu; estando os homens que em suas casas delas habitam, reduzidosescravos e condenados ao vil ofício de servirem. E por isso não se lhes chamam homens, sinãoque á voz espúria de garçons respondem; e são assaz polidos e silentes, e sempre do mesmoindumento gravebundo trajam.Vivem essas damas encasteladas num mesmo local, a que chamam por cá de quarteirão, e
- Page 2 and 3:
MACUNAÍMA,O HERÓI SEM N EN HU M C
- Page 4 and 5:
DedicatóriaA Paulo Prado
- Page 6 and 7:
A RAIMUNDO MORAESNOTAS DIÁRIASText
- Page 9 and 10: 1 Macunaíma1 MACUNAÍMA
- Page 11 and 12: trapoerabas da serrapilheira, ele b
- Page 13 and 14: 2 Maioridade2 MAIORIDADE
- Page 15 and 16: Macunaíma estava muito contrariado
- Page 17 and 18: - Culumi faz isso não, meu neto, c
- Page 19 and 20: Ci, Mãe do Mato3 CI, MÃE DO MATO
- Page 21 and 22: Ficavam rindo longo tempo, bem junt
- Page 23 and 24: planta é que a gente cura muita do
- Page 25 and 26: No outro dia bem cedo o herói pade
- Page 27 and 28: - Si... si... si a boboiúna aparec
- Page 29 and 30: tempo. Chorava muito tempo. As lág
- Page 31 and 32: No outro dia Macunaíma pulou cedo
- Page 33 and 34: tecedeira inesquecível. Macunaíma
- Page 35 and 36: Maanape sabia do perigo e murmurou:
- Page 37 and 38: imaginando que carecia da máquina
- Page 39 and 40: Maanape gostava muito de café e Ji
- Page 41 and 42: uma muiraquitã com forma de jacar
- Page 43 and 44: da cidade de Serra no Espírito San
- Page 45 and 46: 7 Macumba7 MACUMBA
- Page 47 and 48: Tia Ciata cantava o nome do santo q
- Page 49 and 50: pintada na cara, com as alças da c
- Page 51 and 52: Lá no palácio da rua Maranhão em
- Page 53 and 54: Macunaíma ia seguindo e topou com
- Page 55 and 56: Que o tatu prepare a covaDos seus d
- Page 57 and 58: dobra interior dos dedos dos pés.
- Page 59: Ás mui queridas súbditas nossas,
- Page 63 and 64: descuidàmos do nosso talismã, por
- Page 65 and 66: ao gosto dos nativos, mordendo os h
- Page 67 and 68: 10 Pauí-Pódole10 PAUÍ-PÓDOLE
- Page 69 and 70: desejava saber as línguas da terra
- Page 71 and 72: Bateu um ventarrão tamanho que o f
- Page 73 and 74: 11 A velha Ceiuci11 A VELHA CEIUCI
- Page 75 and 76: - Eu menti.Todos os vizinhos caram
- Page 77 and 78: - O quê! quem que é desconhecido!
- Page 79 and 80: tanta água.- Vam’bora, gente!E t
- Page 81 and 82: - Minha lhinha nova, entrega já me
- Page 83 and 84: margem do São Francisco emporcalha
- Page 85 and 86: 12 Tequeteque, Chupinzão e a injus
- Page 87 and 88: Os manos levaram um susto.- Que foi
- Page 89 and 90: O ticotico era pequetitinho e o chu
- Page 92 and 93: 13 A piolhenta do Jiguê13 A PIOLHE
- Page 94 and 95: atentar o herói.- Gente! adeus, ge
- Page 96 and 97: um por um e por isso os piolhos aum
- Page 98 and 99: 14 Muiraquitã14 MUIRAQUITÃ
- Page 100 and 101: Por isso que o Pai do Sono inda exi
- Page 102 and 103: - Agora que te engulo, comadre!E co
- Page 104 and 105: Macunaíma estendeu os braços suss
- Page 106 and 107: 15 A pacuera de Oibê15 A PACUERA D
- Page 108 and 109: vinha a cantiga peguenta das uiaras
- Page 110 and 111:
- É de paz!Então a porta se abriu
- Page 112 and 113:
- Gardez cette date: 1927! Je viens
- Page 115 and 116:
16 Uraricoera16 URARICOERA
- Page 117 and 118:
carrapatos e dormiu. Tarde chegando
- Page 119 and 120:
gaiola enada no braço dele ia bate
- Page 121 and 122:
pegou, Macunaíma fez um esforço h
- Page 123 and 124:
No outro dia o boi estava podre. En
- Page 125 and 126:
Macunaíma se arrastou até a taper
- Page 127 and 128:
valentes das noites de amor que o b
- Page 129 and 130:
caqueando a muiraquitã nas barriga
- Page 131 and 132:
tanto penar na terra sem saúde e c
- Page 133:
Acabou-se a história e morreu a vi
- Page 136 and 137:
1 º PREFÁCIOEste livro carece dum
- Page 138 and 139:
em que trabalho porém não tenho c
- Page 140 and 141:
PREFÁCIOEvidentemente não tenho a
- Page 142 and 143:
fenômeno complexo que o torna sint
- Page 144 and 145:
A RAIMUNDO MORAESMeu ilustre e semp
- Page 146 and 147:
NOTAS DIÁRIASEspecial para Mensage
- Page 148 and 149:
Texto da orelhaTEXTO DA ORELHAÀs m
- Page 150 and 151:
Copyright © 2008Herdeiros de Mári
- Page 152:
Texto de quarta capaTEXTO DE QUARTA