nunca impediram que lutas tremendas separassem primos e até irmãos,genros e sogros, tios e sobrinhos, extremando-os em inimigos de morte; quegrandes famílias se empenhassem em verdadeiras guerras por questões deherança ou de terras, às vezes por motivos de honra ou de partidarismopolítico ( FREIRE, 2006, p. 425).Por outro lado, dentro do antagonismo ruptura/convergência, para com os valoressociais cristalizados na sociedade sergipana representada, protagonizado por Arcanja,sobressai a personalidade avassaladora dessa mulher que restitui o equilíbrio familiarsobre os pilares da força feminina: uma lídima inovação numa sociedadetradicionalmente patriarcal.É nesse novo espaço social configurado onde Remígio nasce e cria-se para a vida,assume a identidade de um sujeito debochado, que vive fazendo pilhérias contra o pai,mas admira a força e a ousadia da mãe e, ainda, faz o jogo social de mostrar-se humildee desprendido no trato com os empregados, numa tentativa de reconstrução de parte deum mundo patriarcal dos Barrosos, perdido na má fé de Belisário e pela não adaptaçãode Cassiano aos negócios da família. O comportamento de Remígio é uma ruptura àsavessas, pois, de certa forma, refaz o percurso deixado para traz pelo pai: a fazenda, ospoucos negócios.Finalmente, Cassiano é o último a dar explicitamente o testemunho sobre sua história,contada pela perspectiva dos outros narradores-personagens, como a opinião ressentidado funcionário Mané Piaba:Vá entender! A bem da verdade largou essa responsabilidade na mão dofilho, não apenas para mantê-lo ocupado e desasnar as suas aptidões, massobretudo por nojo de pegar em dinheiro velho, de tratar com gentefedorenta (CDS, p.323).Assim, depois de tantas acusações aferidas ao longo dos anos – inapto ao trabalho, juízodesregulado, arrogante, inseguro, bestalhão, fraco – ele se justifica, ao reservar a sipróprio, o direito à palavra, ao juízo e ao julgamento final:Daqui pra frente, sem mais nenhum objetivo, ir para adiante significa maisclaramente recuar. Não adianta trastejar de banda ou sair aos esperneios.Nem major Romeu, nem dona Senhora, nem Arcanja passaram pelo transedessa provação, visto que não envelheceram, não tiveram esta fornada dospiores anos (CDS, p.345).Ponta de Lança, São Cristóvão v.2, n. 3, out. 2008 ‐ abr. 2009. 56
Os últimos e piores dias de Cassiano – “desfrutando” amargamente da indiferença dofilho Remígio – não são menos agonizantes que os de dona Senhora, induzida à loucurae à morte precoce, nem os da culpa de Arcanja por não ter conseguido ajudar a tia, nemos da posterior morte tuberculosa de Arcanja, nem os da asma e da mágoa de ManéPiaba em continuar servindo na Fazenda Varginha. Todas essas vidas solitárias quecompõem as vozes atormentas de Cartilha do silêncio são a imagem de um ciclofamiliar que se fecha e finda-se, assim como findaram-se inúmeras famílias tradicionaisBrasil a dentro.De modo que, se pensarmos o patriarcalismo no âmbito de uma cultura que aindaimpera no interior do Brasil, presente na constituição das famílias e, mais ainda, sepensarmos nos antagonismos de uma sociedade contemporânea que conserva os valoresde uma sociedade colonial/patriarcal, face aos novos valores da sociedade moderna, quecoloca a mulher como parte integrante das pequenas mas importantes transformaçõessociais, a contribuição de uma leitura que coloque em perspectiva tanto a cultura dopatriarcado quanto as pequenas mas significativas rupturas no seio dessa prática social,é de salutar importância.A relevância dessa leitura – que coloca as históricas práticas sociais, familiares eculturais em perspectiva – tanto confirma que “o texto literário não é uma materialidadetextual intocável, mas uma prática altamente cultural” (cf. WILLIAMS, 1979), quantoporque basicamente confirma a experiência da maioria dos leitores, para os quais aliteratura deve ser analisada como parte constitutiva da cultura e da sociedade. Afinal,como se sabe, em se tratando de literatura, a crítica especializada teoriza sobre as obrasliterárias, mas cabe aos leitores, destes mesmos textos de ficção, o veredicto final.Ponta de Lança, São Cristóvão v.2, n. 3, out. 2008 ‐ abr. 2009. 57
- Page 2 and 3:
A Revista Eletrônica Ponta de Lan
- Page 7 and 8: ARTIGOSPonta de Lança, São Crist
- Page 9: HISTORIOGRAFÍA DE LA GRAN NIVELACI
- Page 12 and 13: vigilar y proteger el paso (Ruz Lhu
- Page 14 and 15: Para exaltar aun más las discusion
- Page 18: epresentan una fase particular del
- Page 21 and 22: Chichén Itzá: coexistencia y conf
- Page 23 and 24: sería el epicentro de este sistema
- Page 25 and 26: 6- Palabras finalesEl objetivo de e
- Page 27 and 28: FLORESCANO, Enrique. El mito de Que
- Page 29 and 30: Period”. Ancient Mesoamerica 9. C
- Page 31 and 32: EM CENA O AGON PELA POSSE DA TERRA:
- Page 33 and 34: mas a terra dadanão se abre a boca
- Page 35 and 36: forma de organização política; d
- Page 37 and 38: enesses dessa estrutura social poss
- Page 39 and 40: 1979: XXI). Assim, nas páginas ini
- Page 41 and 42: CENAS DANTESCAS NO INTERIOR DE MINA
- Page 43 and 44: As famílias que tinham suas pequen
- Page 45 and 46: crítica que os elementos intrínse
- Page 47 and 48: Patriarcalismo e rupturas em Cartil
- Page 49 and 50: numa “promessa” de transgressã
- Page 51 and 52: É bom lembrar que originalmente do
- Page 53 and 54: prática material é um processo no
- Page 55: mencionado anteriormente, ocorreu p
- Page 59 and 60: LAMBE-SUJO E CABOCLINHOS: UMA LEITU
- Page 61 and 62: Delineava-se, assim, uma camada int
- Page 63 and 64: interpretações de passividade) pe
- Page 66 and 67: afro-descendentes e europeus, pois,
- Page 68 and 69: indígenas à aspectos beligerantes
- Page 70 and 71: da festa, tais como: a presença de
- Page 72 and 73: RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro:
- Page 74 and 75: INTRODUÇÃOEstudos a respeito do c
- Page 76 and 77: Refletindo sobre estas redes secret
- Page 78 and 79: profissionais letrados, médicos, a
- Page 80 and 81: Como se transmitia, de geração em
- Page 82 and 83: um produto elaborado para justifica
- Page 84 and 85: Numa sociedade como a do Brasil col
- Page 86 and 87: A mesma historiadora, em artigo int
- Page 88 and 89: haverá de revelar suas vantagens e
- Page 90 and 91: REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASASSIS,
- Page 92 and 93: VELOSO, A. J. Barros. Inquisição
- Page 94 and 95: IntroduçãoEstamos encaminhando a
- Page 96 and 97: daquele órgão de vigilância - ó
- Page 98 and 99: momento. As frases colocadas no tro
- Page 100 and 101: torturar os líderes estudantis, en
- Page 102 and 103: Postura não coincidente com a assu
- Page 104 and 105: agitadores provocadores da “intra
- Page 106 and 107:
organização do movimento estudant
- Page 108 and 109:
Referências bibliográficas:A UNE
- Page 110 and 111:
Ponta de Lança, São Cristóvão v
- Page 112 and 113:
Ponta de Lança, São Cristóvão v
- Page 114 and 115:
Key-words: Work's Social History, O
- Page 116 and 117:
vida dos índios. Criar a laboriosi
- Page 118 and 119:
social, principalmente as que estã
- Page 120 and 121:
Esses jovens que adentram na área
- Page 122 and 123:
individualmente, já que se perde u
- Page 124 and 125:
FREITAS, Sônia Maria de. História
- Page 126 and 127:
Ponta de Lança, São Cristóvão v
- Page 128 and 129:
Apesar de permear toda a obra, é n