afro-descendentes e europeus, pois, de fato, constituem-se todos intrinsecamenteplasmados.As praças, escadarias, adros e ruas da sede do município de Laranjeiras transformam-seno palco dinâmico do cortejo realizado no segundo domingo do mês de outubro, isto é,nas proximidades do dia de Nossa Senhora Aparecida, santa católica padroeira doBrasil, e de Nossa Senhora do Rosário, correspondente sincrético no candomblé. Porenvolver parte significativa do espaço público da cidade, o cotidiano espacial vivido porseus habitantes inevitavelmente é alterado em suas circulações, cores, cheiros, sons,ornamentações gráficas (desde enfeites às publicidades políticas) e expectativas, mesmopara os que não compartem com a festa.Um olhar geográfico sobre um espaço público deve ser capaz deidentificar, por um lado, sua configuração física e, por outro, o gênerode praticas sociais que aí se desenvolvem. Sob este ângulo, o espaçotorna-se um conjunto indissociável de formas e de praticas sociais.Aliás, parece-nos que esta é a única maneira de estabelecer umarelação direta entre a condição cidadã e o espaço público, isto é,concebendo este espaço como configuração física, como teatro decertas práticas e como um terreno investido de uma efetiva vivênciasocial. (ROSENDAHL & CORRA, 200, p. 95)Após dias de organizações prévias delineadas pelos mestres 18 e seus auxiliares, como naarrecadação de mantimentos, preparação das indumentárias e afinações dosinstrumentos musicais 19 , dá-se o início da festa na alvorada dominical, tendo como localprimordial o “Mocambo” (com aspecto de maloca) construído a base de bambusextraídos nas cercanias da cidade. Como forma de delimitação temporal e espacial dacerimônia são disparados fogos de artifícios, entoados cantos e toques de abertura. Pelasruas começa a euforia (des)organizada, até então, apenas com a participação dosLambe-sujos ainda incompletos em sua caracterização (bermuda e gorro ou “gurita” deflanela vermelha 20 ) e já em estado de embriagues ascendente que aguçará asensibilidade para as dramatizações, danças e cantos. Sobre esse estado psíquico,levemos em consideração o que analisa Suess (1997, p. 28): “Uma palavra, um mantra,18 Como principal figura temos o Mestre Zé Rolinha, conhecido por seu largo envolvimento com asquestões culturais tradicionais de Laranjeiras.19 Tambores, pandeiros, reco-recos, ganzás, caixas, onças (cuícas), etc.20 Os Lambe-sujos se mostram como saci-pererês, um dos personagens mais conhecidos do conjunto daslendas brasileiras e que tem associação direta com a questão da escravatura do período colonial. Osbrincantes agregam livremente acessórios estéticos, tais como, chupetas, óculos escuros e variadosadornos de acordo com os gostos particulares.Ponta de Lança, São Cristóvão v.2, n. 3, out. 2008 ‐ abr. 2009. 66
uma sigla ou canção são capazes de criar emoções, sentimentos, movimentos emudanças na realidade visível e no estado de espírito”.Pela manha, os Lambe-sujos seguem em breves cortejos até chegar ao adro da igrejamatriz Sagrado Coração de Jesus, onde é celebrada uma missa campal seguida deorações, loas e batucadas frenéticas, num sincretismo litúrgico que transcende aospadrões cerimoniais católicos, daí o fato de ser realizada fora da igreja. Erguendo foicesde madeira (ícone do trabalho no canavial) e já pintados com a solução enegrecida entremel de cabaú extraído da cana com pó xadrez industrializado, dando ainda mais realce aetnicidade negra, partem dispersos e de forma jocosa em busca de donativos (comdivertidas ameaças de melar com “cabaú” os que não colaboram) que irão contribuir nacompra de cachaça, cigarros, comida e outros estimulantes para garantir a “disposição”para o largo dia de festa. Por volta do meio-dia, os Lambe-sujos se fartam na feijoadaque demarca o momento de descanso antes dos episódios mais excitantes que estão porvir.Ao entrar pela tarde, o folguedo ganha um ritmo mais intenso e teatralizado. De formaquase discreta, entra em cena o grupo dos Caboclinhos dando nova dinamicidade edelineamento aos cortejos. Em menor número de participantes (sobretudo, crianças eadolescentes), os Caboclinhos são representa dados, principalmente, por crianças eadolescentes trajados com indumentárias que mesclam desde iconografias indígenasgeneralizantes a cores e símbolos emblemáticos da nacionalidade brasileira. OsCaboclinhos se apresentam com todo o corpo pintado de vermelho, enaltecendo aindianidade dos seus personagens. Variando de acordo com o status do personagem e acriatividade individual, de maneira geral, os brincantes vestem coletes, caneleiras,saiotes, cocares e braceletes ornamentados com plumas e pequenos adereços, tais como,insígnias de santos, pequenos bonecos, amuletos, correntes douradas e medalhas. Estasimbiose figurativa denota a condição em que se encontravam os indígenas nestasrelações interéticas de conflito, já sob a influencia cultural direta dos europeus, daí o usode medalhas e seu aspecto militar, imagens de santos e anjos com conotação crista, e odestaque das cores verde, amarelo e azul, quiçá, indicando a integração desses povos nasociedade nacional.Regidos pelo Cacique (com postura majestosa de um rei) e ritmados pelos toquesmarcados das caixas, tal qual uma marcha militar dividida em dois pelotões, osCaboclinhos circulam pelas ruas em busca dos negros fugidos com ar de guerreirosdisciplinados, algo talvez sintomático da associação limitada e vulgarizada dosPonta de Lança, São Cristóvão v.2, n. 3, out. 2008 ‐ abr. 2009. 67
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