original
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Será “vista” ou será paisagem? A noção atrás referida de “(...)natureza através de uma cultura.”
parece indicar que a paisagem é vista como um enquadramento ou composição visual que
apresenta a Natureza como tema primordial. No entanto, inúmeras vezes, os elementos
qualificativos da paisagem são elementos humanizados, como acontece, por exemplo, na
paisagem duriense, em que os socalcos de xisto são parte essencial da morfologia do território.
Ou seja, na maior parte dos casos a paisagem é em parte, resultado da acção do Homem,
que em relação com a Natureza desenha um novo conjunto paisagístico. Esta representação
fabricada da Natureza entrando em contacto com a humanização da mesma, relacionase
constantemente com a ruína. Esta é “exemplo moral entre os cenários da natureza.” 17 .
Portanto se a humanização é essencial para a definição de paisagem, no extremo desta
mesma humanização e da sua futura corrosão pelo tempo, está também a paisagem urbana.
O perfil urbano e as suas camadas temporais, onde ruínas são sobrepostas e são substituídas
por outra novas realidades, é a representação de um processo de apropriação do tempo, em
que toda a realidade construída tende para a uniformização. Como se referiu atrás, a acção
do tempo e a sua representação, a ruína, é o elemento que permite unificar a Natureza e a
Arquitectura, e consequentemente é plausível afirmar que, sendo a imagem urbana fruto da
acção do tempo, esta é paisagem, Natureza vista através de uma cultura.
A ruína como representação de uma memória, exerce uma relação dialéctica com a paisagem.
“Um singular jogo de ricochete entre elementos naturais e fragmentos de um edifício ou da
estátua, que até podem ser simplesmente desprovidos de qualquer valor artístico” 18 , mas que
na realidade contribui para a significação particular da paisagem, sendo a ruína um “exemplo
moral”. Por outro lado, lendo Carducci numa carta a Lídia (18 de Outubro de 1877) em
que diz “Volto do Fórum Romano e... pensei que... dentro de dez milhões de anos a terra
cairá aos bocados ou tornar-se-á numa nebulosa” 19 , a ruína torna-se imagem de morte, visão
fúnebre da sociedade e dos tempos. Portanto esta pode tornar-se instrumento metafórico, que
tenta comunicar um fim anunciado. Não é o fim concreto de um certo edifício, mas sim uma
visão negra e decadente de uma sociedade ou civilização. O fragmento resultante da acção
do tempo é uma imagem que associada à história, constrói uma memória colectiva.
Memória é aquilo que faz com que a história seja operativa. “os esquecimentos e os silêncios
da história são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória colectiva. ” 20 . As
memórias colectivas relativizam o passado, o que faz com que a história seja algo fabricado
e imaginado. A ruína de um edifício é um registo de um tempo passado que sabemos que
17 Chateaubriand (1802) citado por Carlo Carena, Ruína-Restauro, in Enciclopédia Einaudi - Volume 1
Memória-História, p. 111
18 Chateaubriand (1802) citado por Carlo Carena, Ruína-Restauro, in Enciclopédia Einaudi - Volume 1
Memória-História, p. 111
19 Carducci (1877) citado por Carlo Carena, Ruína-Restauro, in Enciclopédia Einaudi - Volume 1 Memória-História,
p. 127
20 Jacques Le Golf, Memória, in Enciclopédia Einaudi - Volume 1 Memória-História, p. 11
19