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6.2 - A ruína no projecto
“Testemunho do poder destrutivo do tempo e do triunfo da natureza sobre a cultura, as
ruínas conferem todavia à paisagem uma marca humana que as contém, abrindo-a para
uma dimensão histórica. Tal como as peças de colecção, com as quais se assemelham pela
falta de utilidade, as ruínas podem, na maior parte dos casos, desempenhar o seu próprio
papel graças à imaginação que vê nelas um signo de acontecimentos do passado, investindoas
assim de valores particulares. As ruínas tornam-se portanto, fontes para o conhecimento
histórico que, através de um processo de pesquisa que as leva à atribuição, extrai os dados
relativos aos seus artífices. Ruína é também metáfora de caducidade e de finitude...” 74
Da anterior enumeração de modos de acção do arquitecto Souto Moura é notório um factor
comum: a ideia de projecto. A partir da interpretação pessoal do sítio, que se baseia em
argumentos de carácter pragmático, de uma abordagem da topografia como elemento do
projecto, a ideia torna-se a leitura clara do sítio onde intervir assim como a interpretação
aparentemente única do edifício a propor. Esta ideia é de facto elementar, une e justifica a
coerência das opções tomadas.
“ ... quando um objecto artificial simula uma permanência perene e comunica uma sensação
de que aquele sítio intacto não poderia prescindir daquele objecto preciso, significa que a
Arquitectura conseguiu o estatuto de “Natureza”, de coisa natural.” 75
No início do percurso de Eduardo Souto Moura, a ruína é instrumento preponderante para
analisar e compreender os seus projectos. Eduardo Souto Moura trabalhou com Álvaro Siza
e em consequência existe uma coincidência temporal na abordagem do tema da ruína. Em
São Victor, esta influência é bastante clara, não só no modo de pensar a ruína como condição
histórica e de memória, mas também na maneira como ela é encarada de acordo com uma
metodologia de restauro ou reconstrução de património que o projecto pressupõe.
A ruína pode ser elemento que “injecta” significado e valores a um edifício. Eduardo Souto
Moura é modernista, mas interpreta e corrige a faceta mais “cinzenta” do Estilo Internacional,
lembrando que os edifícios precisam de uma interpretação sempre particular do sítio como
instrumento de projecto. Não uma interpretação simplista do conceito de genius loci onde é
recorrente afirmar que a solução projectual está no sítio, mas sim uma interpretação do local
como matéria de projecto, sempre no sentido de ser Arquitectura. Ou seja, arquitectura como
um objecto preciso de que um sítio intacto não poderá prescindir.
“... enfim, é o querer conhecer a história, não com imagens de frente, mas por dentro, na
lucidez do projecto, onde a razão dita e o “sítio” aceita, quando o “sítio” informa e a razão
acerta” 76 . É uma relação entre razão e sítio, ou melhor, entre arquitectura e o lugar apreendida
74 Carlo Carena, Ruína-Restauro, in Enciclopédia Einaudi - Volume 1 Memória-História, p. 129
75 Eduardo Souto Moura, Não há duas sem três, in JA 217, p. 29
76 Eduardo Souto Moura, Não há duas sem três, in JA 217, p. 28
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