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Trata-se da capacidade de unir o inconciliável, de trabalhar com elementos independentes
e criar uma unidade harmoniosa que parece que sempre existiu. A utilização de elementos
formais excepcionais, a invenção de ruínas ou a fragmentação dos sólidos-base são partes
de um processo de desmontagem de um programa e de uma arquitectura. Este conflito, o
momento em que o inconciliável se conjuga é primordial na sua obra.
O arquitecto parece consciente da sua condição enquanto força unificadora de vários
elementos quando afirma: “Gostaria de construir no deserto do Sahara.
Provavelmente ao abrir fundações, alguma coisa iria aparecer, adiando a prova da Grande
Liberdade; cacos, uma moeda de oiro, o turbante de um nómada, desenhos indecifráveis
gravados em rocha.
Nesta Terra não há desertos. E se houvesse?
Provavelmente estaria condenado a construir um barco carregado de Memórias próximas ou
distantes até à inconsciência: invenções.” 32
Claramente, Siza parece não acreditar na total liberdade criativa, sem circunstância e sem
“balizas”. Não há “desertos” que sejam totalmente vazios de elementos caracterizadores,
porque o sítio encontra-se a priori definido na mente do arquitecto. Como a Natureza é, de
certa forma, filtrada por uma cultura tornando-se paisagem, a visão pessoal do arquitecto
é, à partida, uma “paisagem” artificial que se tenta tornar natural. Claramente, Siza parece
projectar consciente da sua situação numa sociedade e num tempo em que a utopia da cidade
modernista, de uma cidade desenhada de uma só vez e em que todos os acontecimentos
urbanos são fruto do desenho do arquitecto, já não faz, a seu ver, sentido. A cidade para
Siza, à imagem de Rossi, é feita de adições que dão um carácter próprio a cada sítio. Aceita o
carácter fragmentário de cada intervenção, de cada arquitectura e consequentemente realça
a individualidade de cada acontecimento arquitectónico. Isso não impede Siza de desenhar
a paisagem com a sua arquitectura, de desenhar/imaginar o evidente.
Nesse processo, torna-se claro uma tendência para incluir nos seus projectos, na evidência
imaginada para um determinado sítio, a complexidade de um “contexto” à imagem da
Cidade Rossiana (cidade Análoga), conjunto múltiplo e composto de várias peças. Peças
reconhecíveis e abrangentes, que são independentes do sítio de onde partem, capazes
de contribuir para uma cidade com identidade. Parte de uma forma básica, de um sólido
reconhecível, e por operações sucessivas, parte, dobra e desdobra, fractura e fragmenta a
forma original criando um novo complexo de pequenas formas. Estes fragmentos desenhados
representam uma metonímia da cidade, uma paisagem recriada.
Este processo é claro no desenho da Faculdade de Arquitectura da U. Porto (1984-90), onde
partindo de “uma configuração inspirada nos edifícios massivos da cidade, como o Palácio
32 (A propósito do Banco Borges & Irmão em Vila do Conde (1986)) Álvaro Siza, Álvaro Siza – Escrits,
p. 41
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