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A CONFISSÃO DE LÚCIO

Untitled - Luso Livros

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Passaram velozes os meus dez anos de cárcere, já o disse.De resto, a vida na prisão onde cumpri a minha sentença não era das maisduras. Os meses corriam serenamente iguais.Tínhamos uma larga cerca onde, a certas horas, podíamos passear, sempre soba vigilância dos guardas, que nos vigiavam misturados connosco e que àsvezes até nos dirigiam a palavra.A cerca terminava num grande muro, um grande paredão sobre uma rua larga— melhor: sobre uma espécie de largo onde se cruzavam várias ruas. Emfrente — pormenor que se me gravou na memória — havia um quartelamarelo (ou talvez outra prisão).O prazer maior de certos detidos era de se debruçarem do alto do grandemuro, e olharem para a rua; isto é: para a vida. Mas os carcereiros, mal osdescobriam, logo brutalmente os mandavam retirar.Eu poucas vezes me acercava do muro; apenas quando algum dos outrosprisioneiros me chamava com insistência, por grandes gestos misteriosos, poisnada me podia interessar do que havia para lá dele.Mesmo, nunca soubera evitar um arrepio árido de pavor ao debruçar-me aesse paredão e ao vê-lo esgueirar-se, de uma grande altura — enegrecido,lezardento, escalavrado — sobre raros indícios de uma velha pintura amarela.

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