— Paris! Paris! — exclamava o poeta — Por que o amo eu tanto? Nãosei… Basta lembrar-me que existo na capital latina, para uma onda deorgulho, de júbilo e ascensão se encapelar dentro de mim. É o único ópiolouro para a minha dor — Paris!"Como eu amo as suas ruas, as suas praças, as suas avenidas! Ao recordá-laslonge delas — em miragem nimbada, todas me surgem num resvalamentoarqueado que me traspassa em luz. E o meu próprio corpo, que elas vararam,as acompanha no seu rodopio."De Paris, amo tudo com igual amor: os seus monumentos, os seus teatros, osseus bulevares, os seus jardins, as suas árvores… Tudo nele me é heráldico,me é litúrgico."Ah, o que eu sofri um ano que passei longe da minha Cidade, sem esperançasde me tornar a envolver nela tão cedo… E a minha saudade foi então amesma que se tem pelo corpo de uma amante perdida…"As ruas tristonhas da Lisboa do sul, descia-as às tardes magoadas rezando oseu nome: O meu Paris… o meu Paris…"E à noite, num grande leito deserto, antes de adormecer, eu recordava-o —sim, recordava-o — como se recorda a carne nua de uma amante dourada!
"Quando depois regressei à capital assombrosa, a minha ânsia foi logo de apercorrer em todas as avenidas, em todos os bairros, para melhor a entrelaçarcomigo, para melhor a delirar… O meu Paris! o meu Paris!…"Entretanto, Lúcio, não creia que eu ame esta grande terra pelos seusbulevares, pelos seus cafés, pelas suas atrizes, pelos seus monumentos. Não!Não! Seria mesquinho. Amo-a por qualquer outra coisa: por uma auréola,talvez, que a envolve e a constitui em alma — mas que eu não vejo; que eusinto, que eu realmente sinto, e lhe não sei explicar!…"Só posso viver nos grandes meios. Quero tanto ao progresso, à civilização,ao movimento citadino, à atividade febril contemporânea!", Porque, no fundo,eu amo muito a vida. Sou todo de incoerências. Vivo desolado, abatido,parado de energia, e admiro a vida, entanto como nunca ninguém a admirou!"Europa! Europa! Encapela-te dentro de mim, alastra-me da tua vibração,unge-me da minha época!…"Lançar pontes! lançar pontes! silvar estradas férreas! erguer torres de aço!…E o seu delírio prosseguia através de imagens bizarras, destrambelhadasideias.— Sim! Sim! Todo eu sou uma incoerência! O meu próprio corpo éuma incoerência. Julga-me magro, corcovado? Sou-o; porém muito menos doque pareço. Admirar-se-ia se me visse nu…"Mas há mais. Toda a gente me crêum homem misterioso. Pois eu não vivo, não tenho amantes… desapareço…
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ninguém… não podia experimentar
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— Que valem os outros, entanto, e
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A desventurada mal teve tempo para
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Passaram velozes os meus dez anos d
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