Ensaio sobre o Sacrifício - WESLEY CARVALHO
Ensaio sobre o Sacrifício - WESLEY CARVALHO
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tram-no no mais belo dos touros do rebanho. Esse touro torna<br />
se o próprio Rudra, e é enaltecido, sagrado e homenageado<br />
como tal. 337Depois, pelo menos segundo algumas escolas, ele<br />
é sacrificado fora da aldeia, à meia-noite, num bosque. 338Dessa<br />
maneira, Rudra é eliminado:339 o Rudra dos animais foi juntar-se<br />
ao Rudra dos bosques, dos campos e das encruzilhadas.<br />
Assim, é claramente a expulsão de um elemento divino que o<br />
sacrifício teve por objeto.<br />
Em todos esses casos, o caráter cuja transmissão se opera<br />
pelo sacrifício não vai da vítima ao sacrificante,340mas, ao<br />
contrário, do sacrificante à vítima. É nela que ele se descarrega.<br />
Desse modo, é antes da imolação, e não depois, que se dá o<br />
contato, pelo menos aquele realmente essencial. Uma vez des<br />
carregado na vítima, o sacrificante tende a evitá-Ia, assim como<br />
ao ambiente onde se passou a cerimônia. Por essa razão, os ritos<br />
de saída são mais extensos. Os ritos desse gênero que assinala<br />
mos no ritual hebreu foram apresentados apenas para sacrifícios<br />
expiatórios. Depois do primeiro sacrifício que o purificou, o<br />
leproso deve completar sua purificação com uma ablução suplementar<br />
e mesmo com um novo sacrifício.341Já os ritos de entra<br />
da são restritos ou ausentes. Estando já investido de um caráter<br />
religioso, o sacrificante não precisa adquiri-Io. A religiosidade<br />
com que está marcado vai diminuindo progressivamente desde<br />
o começo da cerimônia. O movimento ascensionalque encontramos<br />
no sacrifício completo é rudimentar ou inexistente. Tra<br />
ta-se portanto de um outro tipo de sacrifício, no qual entram os<br />
mesmos elementos presentes no sacrifício de sacralização; contudo,<br />
esses elementos estão orientados em sentido contrário e<br />
suas respectivas importâncias são invertidas.<br />
No que precede, supusemos que o caráter sagrado com<br />
que era marcado o sacrificante no início da cerimônia era para<br />
ele uma tara, uma causa de inferioridade religiosa, pecado, im<br />
pureza etc. Mas há casos em que o mecanismo é exatamente o<br />
mesmo e no entanto o estado inicial é para o sacrificante uma<br />
fonte de superioridade, constituindo um estado de pureza. Em<br />
Jerusalém, o nazÍr342 era um ser perfeitamente puro; havia se<br />
consagrado a Javé por um voto em virtude do qual se abstinha<br />
de vinho e não mais cortava seus cabelos. Devia se preservar de<br />
toda mácula. Mas uma vez chegado ao término de seu voto343ele<br />
só pode sair mediante um sacrifício. Para isso toma um banho<br />
de purificação344e depois oferece um cordeiro em ôlâ, uma ovelha<br />
em hattât e um carneiro em zebah shelamin. Raspa os cabelos<br />
e os lança ao fogo onde cozinha a carne do shelamin. 345Quando o<br />
sacrificador faz o zebah shelamin, põe nas mãos do nazÍr a teroumâ,<br />
a tenouphâ, isto é, as partes consagrada~, e um bolo da oferenda<br />
correspondente. 346Essas oblações são então apresentadas a Javé.<br />
A seguir, diz o texto, o nazÍr poderá beber vinho, ou seja, está<br />
desligado da consagração. Ela passou aos cabelos cortados e oferecidos<br />
no altar e à vítima que o representou. Tanto uma coisa<br />
quanto a outra foram eliminadas. O processo é portanto o mes<br />
mo que na expiação. O caráter sagrado, por mais alto que seja o<br />
valor religioso, vai do sacrificante à vítima. Por conseguinte, o<br />
sacrifício de expiação não é senão uma variedade particular de<br />
um tipo mais geral, que é independente do caráter favorável ou<br />
desfavorável do estado religioso afetado pelo sacrifício. Poder<br />
se-ia chamá-Io sacrifício de dessacralização.<br />
As coisas, como as pessoas, podem se achar num estado<br />
de tão grande santidade que se tornam inutilizáveis e perigo-<br />
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