GNOSE ALEM DA RAZÃO O FENÔMENO DA SUGESTÃO JEAN ...
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As razões de certas dissemelhanças entre Mesmer e Puységur, e que sem<br />
dúvida explicam o deslize incontestável da doutrina do primeiro para a<br />
prática do segundo, estão em parte relacionadas com a diferença de<br />
temperamento e de personalidade de ambos. Puységur era desinteressado,<br />
modesto, fundamentalmente filantropo e também tão pouco necessitado<br />
quanto possível de publicidade e de afirmação pessoal, qualidades estas<br />
que nem sempre parecem ter sido o forte de Mesmer. É verdade que<br />
Puységur, grande senhor que era, não teve de lutar, como o precisou<br />
Mesmer, ao mesmo tempo para construir sua fortuna e tentar assegurar o<br />
êxito de suas idéias. A prática de Puységur certamente era bem mais<br />
"modesta" que a de Mesmer, muito menos autoritária, muito menos<br />
preocupada com efeitos espetaculares, e também mais respeitadora de<br />
certos mecanismos naturais de cura, em particular no trabalho com o sono<br />
magnético. E igualmente mais humana, sem dúvida. A relação entre<br />
magnetizador e magnetizado era, segundo Puységur, tanto ou mais<br />
carregada de afetividade do que o fluido cósmico e impessoal ao qual<br />
Mesmer pretendia ligá-la, e muito exclusivamente.<br />
Pode-se legitimamente perguntar, com Ellenberger, por que, senão sempre,<br />
pelo menos de maneira geral, "a mesma técnica dos passes suscitava crises<br />
aos pacientes de Mesmer enquanto mergulhava os de Puységur no sono<br />
magnético".1 A diferença dizia respeito à condição social dos pacientes,<br />
responde Ellenberger, sem nos convencer nem um pouco. Segundo ele, as<br />
ilustres senhoras e os burgueses que se tratavam com Mesmer tinham suas<br />
crises porque no seu meio social estavam na moda as manifestações<br />
espetaculares de nervosismo e hipocondria, enquanto os humildes<br />
camponeses ou os soldados de seu regimento de quem Puységur tratava<br />
adormeciam, sempre segundo Ellenberger, pelo respeito e submissão<br />
ancestrais que lhes inspirava a própria pessoa do coronel-marquês,<br />
aureolado do prestígio ligado à sua condição e às suas funções. A isso se<br />
somava a confiança afetuosa e total que os pacientes dedicavam<br />
espontaneamente a Puységur, bom, desinteressado, caloroso, infinitamente<br />
menos dominador do que Mesmer e, provavelmente, animado também pela<br />
visão do bem do próximo e pelo senso do poder curativo da natureza bem<br />
mais profundos do que os que inspiravam Mesmer. É antes a estes últimos<br />
fatores e em definitivo a uma diferença de atitude íntima que estamos<br />
tentados a atribuir a diferença dos resultados — crises ou sono magnético<br />
— da técnica sensivelmente igual usada por Mesmer e Puységur, embora a<br />
disparidade dos meios sociais dos pacientes e sobretudo o tipo de relação<br />
ao mesmo tempo social e pessoal que mantinham com o magnetizador<br />
também tenham desempenhado importante papel. Resulta em definitivo<br />
que só uma sugestão suave — e a de Mesmer certamente não o era — pode<br />
estabelecer o sono magnético.