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Universidade Federal do Paraná - Departamento de História ...

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presente, as preocupações cotidianas, as realizações materiais e os planos para um futuro<br />

próximo divi<strong>de</strong>m espaço com a religiosida<strong>de</strong> e os planos para um futuro eterno. Ou seja, o<br />

futuro que só oferece duas alternativas: a salvação ou a danação eterna. A realida<strong>de</strong><br />

palpável da vida e a crença na vida eterna formam um quadro on<strong>de</strong> estes <strong>do</strong>is planos<br />

existenciais coabitam <strong>de</strong> maneira relativamente harmônica em um mesmo intelecto, que<br />

procura pautar sua conduta <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a própria ética cristã <strong>de</strong> seu tempo.<br />

A obra Tratada Descritivo <strong>do</strong> Brasil em 1587, <strong>de</strong> sua autoria forma um contraste<br />

antagônico com o teor <strong>do</strong> testamento por ele <strong>de</strong>ixa<strong>do</strong>. Se a obra em sua maior parte contém<br />

atributos <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> percebem-se algumas permanências <strong>do</strong> imaginário medieval,<br />

<strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> que as rupturas fazem parte <strong>de</strong> um lento <strong>de</strong>vir e que só se configuram<br />

plenamente na longa duração. Esta constatação só po<strong>de</strong> ser feita a partir <strong>do</strong> nosso próprio<br />

presente, pois não fazem parte da consciência <strong>de</strong>ste homem <strong>do</strong> século XVI, on<strong>de</strong><br />

“medievalida<strong>de</strong>” e a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> são formas <strong>de</strong> pensar que se superpõem e se entrelaçam<br />

no mesmo superego, hora pen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> para o "racionalismo" <strong>do</strong>s mo<strong>de</strong>rnos, hora se ren<strong>de</strong>n<strong>do</strong><br />

as superstições medievais e as explicações <strong>de</strong> natureza provi<strong>de</strong>ncialista <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> aquilo que<br />

o seu intelecto não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>svendar e compreen<strong>de</strong>r. Embora este hábito mental ainda<br />

sobreviva no aparente cepticismo <strong>do</strong> homem contemporâneo, mesmo que sob a forma <strong>de</strong><br />

incongruência racional, este mesmo hábito é mais evi<strong>de</strong>nte e menos problemático para este<br />

homem <strong>de</strong> fins <strong>do</strong> Século XVI que assiste e encarna o aparente confronto <strong>de</strong>stas duas<br />

cosmologias conflitantes. Ele não está imune às mudanças <strong>do</strong> próprio tempo e nem às<br />

permanências <strong>do</strong> lega<strong>do</strong> <strong>de</strong> épocas passadas. É como se o pensar e o sentir estivessem em<br />

épocas históricas distintas, o consciente volta<strong>do</strong> para as perspectivas <strong>do</strong> presente e o<br />

inconsciente ainda carrega<strong>do</strong> <strong>de</strong> me<strong>do</strong>s, imagens e concepções herda<strong>do</strong>s <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, mas<br />

que ainda encontram eco nos vários aspectos da realida<strong>de</strong> e da consciência epocal. 13<br />

Enquanto o humanismo, o racionalismo e o antropocentrismo já são elementos<br />

constitutivos da nova mentalida<strong>de</strong> Oci<strong>de</strong>ntal a velha cosmologia medieval ainda está<br />

presente e atuante na própria estrutura <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r secular e temporal que se confun<strong>de</strong>m nas<br />

13 Em BARRETO, Luís Filipe. Descobrimentos e Renascimento; formas <strong>de</strong> ser e pensar nos séculos<br />

XV e XVI. Lisboa: Imprensa Nacional, 1983.p.7-61. Esta é uma con<strong>de</strong>nsação da interpretação <strong>do</strong> historia<strong>do</strong>r<br />

Luís Filipe Barreto a respeito <strong>do</strong> homem português entre o fim <strong>do</strong> medievo e os primórdios da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>,<br />

nesta obra Barreto analisa a existência simultânea <strong>de</strong> duas formas <strong>de</strong> interpretar o mun<strong>do</strong>. De um la<strong>do</strong> a<br />

permanência <strong>de</strong> uma mentalida<strong>de</strong> medieval, e <strong>de</strong> outro, o nascimento <strong>do</strong> pensamento mo<strong>de</strong>rno português,<br />

atrela<strong>do</strong> <strong>de</strong> maneira indissociável ao Renascimento e às Gran<strong>de</strong>s Navegações.<br />

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