Universidade Federal do Paraná - Departamento de História ...
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filhós <strong>de</strong> polme e moles, e fazem-se no mesmo alguidar como os beijus, mas não são <strong>de</strong> tão boa<br />
digestão, nem tão sadios; e querem-se comidas quentes; com leite têm muita graça; e com açúcar<br />
clarifica<strong>do</strong> também.<br />
A carimã 25 .<br />
Farinha-<strong>de</strong>-guerra se diz, porque o gentio <strong>do</strong> Brasil costuma chamar-lhe assim pela sua língua,<br />
porque quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>terminam <strong>de</strong> a ir fazer a seus contrários algumas jornadas fora <strong>de</strong> sua casa, se<br />
provêm <strong>de</strong>sta farinha, que levam às costas ensacada em uns far<strong>do</strong>s <strong>de</strong> folhas que para isso fazem, da<br />
feição <strong>de</strong> uns <strong>de</strong> couro, em que da Índia trazem especiaria e arroz; mas são muito mais pequenos,<br />
on<strong>de</strong> levam esta farinha muito calcada e enfolhada, <strong>de</strong> maneira que, ainda que lhe caia num rio, e que<br />
lhe chova em cima, não se molha. Para se fazer esta farinha se faz prestes muita soma <strong>de</strong> carimã, a<br />
qual, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> rapada, a pisam num pilão que para isso têm, e como é bem pisada a peneiram muito<br />
bem, como no capítulo antes fica dito. E como têm esta carimã prestes, tomam as raízes da mandioca<br />
por curtir, e ralam como convém uma soma <strong>de</strong>las, e, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> espremidas, como se faz à primeira<br />
farinha que dissemos atrás, lançam uma pouca <strong>de</strong>sta massa num alguidar que está sôbre o fogo, e por<br />
cima <strong>de</strong>la uma pouca <strong>de</strong> farinha da carimã e, embrulhada uma com outra, a vão mexen<strong>do</strong> sobre o<br />
fogo, e assim como se vai cozen<strong>do</strong> lhe vão lançan<strong>do</strong> <strong>do</strong> pó da carimã, e trazem-na sobre o fogo, até<br />
que fica muito enxuta e torrada, que a tiram fora. Desta farinha-<strong>de</strong>-guerra usam os portugueses que<br />
não têm roças, e os que estão fora <strong>de</strong>las na cida<strong>de</strong>, com que sustentam seus cria<strong>do</strong>s e escravos, e nos<br />
engenhos se provêm <strong>de</strong>la para sustentarem a gente em tempo <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>, e os navios que vêm <strong>do</strong><br />
Brasil para estes reinos<br />
não têm outro remédio <strong>de</strong> matalota-gem, para se sustentar a gente até Portugal, senão o da farinha<strong>de</strong>-guerra;<br />
e um alqueire <strong>de</strong>la da medida da Bahia, que tem <strong>do</strong>is <strong>de</strong> Portugal, se dá <strong>de</strong> regra a cada<br />
homem para um mês, a qual farinha-<strong>de</strong>-guerra é muito sadia e <strong>de</strong>senfastiada, e molhada no cal<strong>do</strong> da<br />
carne ou <strong>do</strong> peixe fica branda e tão saborosa como cuscuz. Também costumam levar para o mar<br />
matalotagem <strong>de</strong> beijus grossos muito torra<strong>do</strong>s, que dura um ano, e mais sem se danarem, como a<br />
farinha-<strong>de</strong>-guerra. Desta carimã e pó <strong>de</strong>la bem peneira<strong>do</strong> fazem os portugueses muito bom pão, e<br />
bolos amassa<strong>do</strong>s com leite e gemas <strong>de</strong> ovos, e <strong>de</strong>sta mesma massa fazem mil invenções <strong>de</strong> beilhós,<br />
mais saborosos que <strong>de</strong> farinha <strong>de</strong> trigo, com os mesmos materiais, e pelas festas fazem as frutas<br />
<strong>do</strong>ces com a massa <strong>de</strong>sta carimã, em lugar da farinha <strong>de</strong> trigo, e se a que vai à Bahia <strong>do</strong> reino não é<br />
muito alva e fresca, querem as mulheres antes a farinha <strong>de</strong> carimã, que é alvíssima e lavra-se melhor<br />
com a qual fazem tu<strong>do</strong> muito primo.<br />
Hábitos alimentares e sexualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> Gentio segun<strong>do</strong> a ótica <strong>do</strong> Homem Europeu.<br />
Etnocentrismo x Relativismo cultural.<br />
Que trata da luxúria <strong>de</strong>stes bárbaros. 26<br />
São os tupinambás tão luxuriosos que não há peca<strong>do</strong> <strong>de</strong> luxúria que não cometam; os quais sen<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />
muito pouca ida<strong>de</strong> têm conta com mulheres, e bem mulheres; porque as velhas, já <strong>de</strong>sestimadas <strong>do</strong>s<br />
que são homens, granjeiam estes meninos, fazen<strong>do</strong>-lhes mimos e regalos, e ensinam-lhes a fazer o<br />
que eles não sabem, e não os <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> dia, nem <strong>de</strong> noite. É este gentio tão luxurioso que poucas<br />
vezes têm respeito às irmãs e tias, e porque este peca<strong>do</strong> é contra seus costumes, <strong>do</strong>rmem com<br />
elas pelos matos, e alguns com suas próprias filhas; e não se contentam com uma mulher, mas têm<br />
muitas, como já fica dito pelo que morrem muitos <strong>de</strong> esfalfa<strong>do</strong>s. E em conversação não sabem falar<br />
senão nestas sujida<strong>de</strong>s, que cometem cada hora; os quais são tão amigos da carne que se não<br />
contentam, para seguirem seus apetites, com o membro genital como a natureza formou; mas há<br />
muitos que lhe costumam pôr o pêlo <strong>de</strong> um bicho tão peçonhento, que lho faz logo inchar, com o que<br />
têm gran<strong>de</strong>s <strong>do</strong>res, mais <strong>de</strong> seis meses, que se lhe vão gastan<strong>do</strong> espaço <strong>de</strong> tempo; com o que se lhes<br />
25 SOUZA, op. cit. pp.178-179.<br />
26 SOUZA, op. cit. pp..308-309.<br />
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