o outro possÃvel: a poesia de armando freitas filho em ... - UninCor
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mesmo o ritmo errado, <strong>de</strong>senfreado ou gago, que não alcança o cerne fugidio das coisas”, vê<br />
<strong>em</strong> CDA uma medição <strong>de</strong> impossibilida<strong>de</strong> ou seu limite.<br />
A ânsia <strong>em</strong> busca do <strong>outro</strong>, <strong>em</strong> busca do mais íntimo, da similitu<strong>de</strong> é marcada <strong>em</strong><br />
sua poética. Para o poeta, há s<strong>em</strong>pre algo oculto, enigmático que não se <strong>de</strong>fine. É nesse<br />
sentido que reflito sobre a questão do t<strong>em</strong>po como fundamento (necessário) que possibilita na<br />
busca ao <strong>outro</strong> uma mudança, uma conversão. Qual sentido AFF confere à apropriação que<br />
faz aos po<strong>em</strong>as drummondianos? Que enigma é esse o qual não se resolve e que<br />
constant<strong>em</strong>ente o eu - lírico tenta solucionar?<br />
Destarte, o encontro ao <strong>outro</strong> não se realiza como fusão, mas como corte, é o que<br />
Bosi (2003, p. 08) confirma:<br />
Um – no - <strong>outro</strong> <strong>de</strong> Armando não se realiza como fusão lírica, mas s<strong>em</strong>pre corte, <strong>em</strong><br />
que a ferida test<strong>em</strong>unha o encontro. A persistência é como uma doença, um<br />
caminhar <strong>de</strong> cego que forceja para <strong>de</strong>screver a sombra mais do que a silhueta,<br />
encontrando o oco do que mor<strong>de</strong>.<br />
A função do corte leva a compreensão do <strong>de</strong>sejo do eu-lírico <strong>em</strong> separar-se do que<br />
não lhe agrada. Através da citação acima, po<strong>de</strong>-se pensar no sentido do corte <strong>em</strong> relação à<br />
escrita, abordado por Compagnon (1996, p.13), na medida <strong>em</strong> que l<strong>em</strong>os um texto, as frases<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>le vão assumindo um po<strong>de</strong>r e, no momento, <strong>em</strong> que as rel<strong>em</strong>os, vão tornando-se<br />
“fórmula autônoma”. Diante essas ações, são realizadas operações <strong>de</strong> “re-cortes”. De acordo<br />
com (Ibid), o “fragmento escolhido converte-se ele mesmo <strong>em</strong> texto”.<br />
Comparando o relato <strong>de</strong> Compagnon e a escrita poética <strong>de</strong> AFF percebe-se que a<br />
escrita é feita num certo momento a partir <strong>de</strong> fragmentos con<strong>de</strong>nsados <strong>de</strong> CDA, que se faz<strong>em</strong><br />
explodir <strong>em</strong> sua <strong>poesia</strong>.<br />
No período entre 2003 a 2007, há a maior concentração <strong>de</strong> diálogos poéticos com<br />
CDA, porém, AFF não fazia como o hom<strong>em</strong> da tesoura (relato <strong>de</strong> Celine Cashiers 12 ), que lia<br />
com uma tesoura nas mãos, recortando o que o <strong>de</strong>sagradava 13 , mas recortava <strong>em</strong> seu<br />
pensamento, para logo <strong>de</strong>pois não jogar fora, mas esmiuçar, pedaço por pedaço, aquilo que da<br />
<strong>poesia</strong> <strong>de</strong> Drummond, não conseguia digerir. É como se guardasse o não-entendível para mais<br />
tar<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r re-dizer. O poeta recortava o que era probl<strong>em</strong>ático, e assim surgia, uma nova<br />
forma <strong>de</strong> escrita “ex-citada e dilacerada 14 ”.<br />
Portanto é um recorte que o poeta cont<strong>em</strong>porâneo realiza <strong>em</strong> ‘Numeral/<br />
12 CÉLINE, Cahiers apud COMPAGNON, 1996, p. 23-24.<br />
13 “Eu leio com a tesoura nas mãos, <strong>de</strong>sculp<strong>em</strong>-me e eu corto tudo o que me <strong>de</strong>sagrada” (COMPAGNON, 1996,<br />
p. 24).<br />
14 Termo usado por Compagnon (1996, p.25) “criara a verda<strong>de</strong> da leitura como excitação e dilaceração”.