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Volume 7 - Realismo Fantasmagórico

Realismo Fantasmagórico

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através das suas fotos nuas que ele observa amorosamente enquanto ela está,<br />

de fato, nua a apenas alguns metros na banheira. Sombreando sua própria imagem,<br />

ela o surpreende excitado com as suas fotos, e isso dá início a um desejo<br />

impossível que leva esses dois quase-humanos a saltarem juntos por entre espaços<br />

urbanos. É assim que um espírito benevolente – T’ae-suk – compensa o<br />

abuso que a vida urbana rotineiramente produz. O cinema lança uma sombra<br />

no presente como uma imagem que repara a cidade em vez de aterrorizá-la.<br />

Eu finalmente me volto ao filme que em primeiro lugar despertou estas<br />

meditações: Mal dos trópicos. Mais profundamente que Casa vazia, Mal dos trópicos<br />

(Apichatpong Weerasethakul, 2004) propõe mudar a natureza dos filmes<br />

de fantasma. Um romance urbano gay contemporâneo que se transmuta em<br />

um conto de uma selva assombrada, Mal dos trópicos não só representa o poder<br />

da imaginação como assume este poder. Mudando de forma à medida que nós<br />

o assistimos, desenvolvendo-se diante de nossos olhos e penetrando nossos<br />

sonhos, ele atravessa de um campo ao outro, da cidade à sua sombra, a selva,<br />

enquanto seu protagonista, Keng, transforma-se numa besta.<br />

Um prólogo na savana define as apostas: um cadáver é descoberto e carregado<br />

para fora de quadro por um grupo de soldados, um dos quais é Keng. A<br />

câmera agora sozinha, sem ser provocada, aproxima intencionalmente a imagem<br />

no emaranhado da vegetação, como se fosse um olho de um tigre. Em<br />

seguida, uma figura feminina nua entra e atravessa toda a cena, saindo à direita.<br />

Mais tarde, supomos que esta “forma”, certamente o espírito que deixou o<br />

cadáver, pertence ou tornou-se um avatar do namorado urbano de Keng, Tong.<br />

Quando após a sequência de créditos o pelotão de Keng passa a noite na<br />

casa dos pais de Tong na floresta, eles se encontram e se cumprimentam. “Vocês<br />

estão falando sobre fantasmas?” pergunta a mãe quando os dois homens<br />

estão sentados próximos ao cadáver amortalhado. Eles se encontram algum<br />

tempo depois na cidade. Isso ocorre da seguinte maneira: Tong está indo rotineiramente<br />

em direção ao trabalho, numa manhã. Ele flerta casualmente com<br />

uma garota atraente, que está distraída com uma ligação de celular, mas que<br />

mantém um contato visual quase tátil com ele. Porém, Tong é logo distraído<br />

quando alguém num caminhão ao lado aproxima-se em um sinal de trânsito<br />

e literalmente agarra seu cotovelo. É Keng; eles iniciam uma conversa, recordam<br />

um ao outro de seus nomes e dizem, vagamente, que algum dia vão se<br />

ver novamente. Assim, meios de transporte randômicos, levando passageiros<br />

não relacionados, entram em contato no movimento molecular do tráfego, desencadeando<br />

um caso de amor. Um affair um tanto saudável, genial e benigno<br />

CIdAdes fantasmas 125

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