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Volume 7 - Realismo Fantasmagórico

Realismo Fantasmagórico

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nas margens de uma ordem social heteronormativa. 71 Eles interpretam a sexualidade<br />

queer como central para a imaginação dos prazeres e dos perigos<br />

de desvio na metrópole global. Essa imanência torna a sexualidade evasiva e,<br />

às vezes, enigmática nos filmes de Tsai, faltando contornos subjetivos definidos,<br />

evaporando para o espaço vazio entre os personagens que estão fora de<br />

sincronia, não expressivos, insatisfeitos. E esta qualidade incipiente indica os<br />

desafios fenomenológicos colocados pela desorientação como uma operação<br />

de mapeamento no sentido inverso, onde a dissolução das vias conhecidas de<br />

escolha do objeto e a intencionalidade nos coloca em contato com configurações<br />

incomuns de tempo e espaço. Isso se alinha a uma política baseada na<br />

noção de que o “queer como uma orientação sexual arrisca mais do que o sexo,<br />

assim como outros tipos de efeitos queer, por sua vez, podem, ao invés, acabar<br />

arriscando o sexo”. Como Sara Ahmed argumenta em seu apelo a uma fenomenologia<br />

queer, “se o sexual envolve a contingência de corpos que entram<br />

em contato com outros corpos, então, a desorientação sexual se transforma<br />

rapidamente em desorientação social, uma desorientação na forma como as<br />

coisas estão organizadas. Os efeitos são realmente estranhos”. 72<br />

A sensação de estranheza que se apega aos desejos inoportunos e nãonormativos<br />

representados por Tsai aponta para a necessidade de ir além de<br />

uma crítica que os enquadraria principalmente na postura receptiva ironizada<br />

de camp. De fato, a consonância entre as temporalidades assíncronas encontradas<br />

em Adeus, Dragon Inn e em outros filmes recentes sobre a sexualidade<br />

gay que olham para o passado como um local de luto e saudade utópica sugere<br />

uma virada em direção a uma estética pós-camp.<br />

Considere, por exemplo, Felizes juntos de Wong Kar-wai, cujos dois protagonistas<br />

tentam a todo instante “recomeçar”, mas não conseguem redescobrir<br />

a paixão que os une na primeira cena do filme; Velvet Goldmine de Todd Haynes<br />

(1998), um filme de flashback que contrasta o presente monótono com um passado<br />

vivo, de possibilidades sexuais pulsantes, ou a reinterpretação nostálgica<br />

pelo mesmo diretor do melodrama Sirkiano em Longe do paraíso (2002); 73 ou O<br />

71 MARTIN, Fran. Situating Sexualities: Queer Representation in Taiwanese Fiction,<br />

Film and Public Culture. Hong Kong: Hong Kong University Press, 2003. p. 116.<br />

72 AHMED, Sara. Queer Phenomenology: Orientations, Objects, Others. Durham:<br />

Duke University Press, 2006. p. 161-62 (grifo do autor).<br />

73 Na verdade, praticamente qualquer filme de Haynes pode ser inserido nessa<br />

lista; como Dana Luciano observa, “a ocupação temporal perversa é a tendência<br />

unificadora da obra do diretor norte-americano gay”. LUCIANO, Dana. “Coming<br />

192 REALISMO FANTASMAGÓRICO

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