Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
distinta do Cinema Fuhe estão inscritas na fisicalidade de seu espaço, o filme<br />
as desenvolve ainda mais em conjunto com um crescente sentimento de estranheza,<br />
fundamentando uma conjuntura precisa, mas paradoxal, entre o real e<br />
o fantástico. 22 Embora a narrativa permaneça estritamente delimitada dentro<br />
da mise-en-scène da sala de cinema, a unidade espaço-temporal desse cenário<br />
é progressivamente fraturada pelo contato entre vários mundos que se cruzam<br />
dentro de seus muros. 23 O local começa a parecer menos com um cinema comum<br />
e mais com uma sala de memórias e da história. Os próprios comentários<br />
de Tsai sobre Adeus, Dragon Inn implicitamente comparam o cinema a uma<br />
casa assombrada, um local dotado de poderes subjetivos e onde o passado se<br />
mistura com e invade o presente:<br />
Na realidade, trata-se de um filme sobre a memória deste cinema... Quando entramos<br />
em um cinema para assistir a um filme, é como se ele fosse um espaço<br />
atemporal, o tempo está em suspensão. Assim, as memórias deste teatro são como<br />
fragmentos, assim como você vê fragmentos de Dragon Inn. O teatro se lembra,<br />
por exemplo, de quando muitas pessoas estavam lá juntas assistindo, ou quando<br />
aspectos decrépitos e desatualizados da idade cinematográfica de ouro que ele<br />
celebra, Kenneth Chan vê em Adeus, Dragon Inn uma tréplica fundamental para<br />
o revivalismo nostálgico que rodeia o filme wuxia na era atual dos blockbusters<br />
globais - simbolizado, por exemplo, no recente trabalho de Zhang Yimou. Tsai,<br />
em sua leitura, “envolve uma política localizada do lugar para perturbar a<br />
cooptação perfeita da nostalgia pelas estruturas capitalistas transnacionais e as<br />
redes de consumo cultural”. CHAN, Kenneth. “Goodbye, Dragon Inn: Tsai Mingliang’s<br />
political aesthetics of nostalgia, place, and lingering”. Journal of Chinese<br />
Cinemas, n. 1, 2007. p. 90.<br />
22 Chris Berry também observa a “assombração” do realismo em filmes de Tsai<br />
por intimações do fantástico e do sobrenatural; seu principal exemplo é Que<br />
Horas São Aí?. BERRY, Chris. “Haunted Realism: postcoloniality and the cinema<br />
of Chang Tso-Chi”. In: DAVIS, Darrell William; CHEN, Ru-shou Robert (Orgs.).<br />
Cinema Taiwan: Politics, Popularity and State of the Arts. Londres: Routledge,<br />
2007. p. 47. [Traduzido nesse volume]<br />
23 Andrea Bachner, em “Cinema as Heterochronos”, invoca o conceito de<br />
heterotopia de Michel Foucault em conexão com o trabalho de Tsai, e o cinema<br />
em Adeus, Dragon Inn certamente pode ser visto como um exemplo de um<br />
espaço heterotópico envolvendo temporalidades distintas. BACHNER, Andrea.<br />
“Cinema as Heterochronos: Temporal Folds in the Work of Tsai Ming-liang”.<br />
Modern Chinese Literature and Culture. Vol. 19, n. 1, 2007. p. 60-90.<br />
o cinema ASSOMBRADO 161