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“obsessão com o realismo” 10 , como Bazin colocou há cerca de 50 anos, em vez<br />
de reduzida pelo digital, parece maior do que nunca. Considere, por exemplo,<br />
a expansão dos reality shows e programas estilo documentário na televisão nos<br />
últimos anos 11 . Considere também websites de vídeo como YouTube, cujo emblemático<br />
slogan é “Broadcast Yourself” [transmita-se a si mesmo] e que promoveu<br />
circulação em massa de vídeos domésticos na Internet. Em relação ao<br />
cinema, é sintomático que o gênero documentário tenha visto seus níveis de<br />
popularidade e apelo crítico aumentarem nos últimos anos.<br />
Frampton afirma que atualmente “é difícil encontrar um filme que não<br />
inclua imagens ou pessoas que jamais estiveram diante da câmera” 12 . Mas de<br />
que tipo de cinema estamos falando? Dudley Andrew, por exemplo, discorda<br />
deste ponto de vista, afirmando que “dentre produções digitais seduzindo cineastas<br />
e públicos a escapar para o mundo do virtual, o world cinema nos traz<br />
de volta (...) à Terra, na qual muitos mundos são vividos e percebidos simultaneamente”<br />
13 . É claro, isto não significa que o world cinema seja imune à simulação.<br />
Pelo contrário, a manipulação digital das qualidades plásticas da imagem<br />
tornou-se muito difundida graças ao digital, um exemplo sendo Arca russa<br />
(Russkiy kovcheg, 2003), de Alexander Sokurov, o primeiro longa-metragem filmado<br />
em um único plano-sequência graças à tecnologia digital, que, por outro<br />
lado, também permitiu que suas imagens fossem retocadas na pós-produção.<br />
Como Nagib e Mello observam, “recorreu-se ao digital mais frequentemente<br />
como um facilitador da gravação de locações e personagens reais, e<br />
como um meio de expandir a aplicação de técnicas tradicionalmente identificadas<br />
com o realismo” 14 . Como historicamente tem sido o caso, estas técnicas<br />
são usadas principalmente para expressar preocupações sociais. Um filme<br />
sem roteiro como Dez (2002) de Abbas Kiarostami, por exemplo, facilmente<br />
comprova esta ideia, uma vez que foi inteiramente filmado em duas câmeras<br />
10 BAZIN, André. What is Cinema?. Londres: University of California Press, 2005. v.<br />
1. p. 12.<br />
11 Como destacado por NAGIB, Lúcia; MELLO, Cecilia. “Introduction”. In: NAGIB,<br />
Lúcia; MELLO, Cecilia (Orgs.). Realism and the Audiovisual Media. Basingstoke:<br />
Palgrave Macmillan, 2009. p. xv.<br />
12 FRAMPTON, Daniel. Filmosophy. Londres: Wallflower Press, 2006. p. 5<br />
13 ANDREW, Dudley . “An Atlas of World Cinema”. In: DENNISON, Stephanie; LIM,<br />
Song Hwee (Orgs.). Remapping World Cinema: Identity, Culture and Politics in<br />
Film. Londres: Wallflower Press, 2006. p. 28.<br />
14 NAGIB, Lúcia; MELLO, Cecilia. Op. Cit. p. xv.<br />
64 REALISMO FANTASMAGÓRICO