F&N202
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FIGURA DO MÊS<br />
sentimentos das pessoas.<br />
Trata-se de uma música criada e<br />
produzida, na altura, como tantas outras,<br />
para transmitir o sentimento da<br />
maioria dos angolanos.Nela, procurei<br />
sensibilizar os angolanos para a necessidade<br />
da solidariedade, da partilha<br />
e da união. Na altura, passávamos<br />
por um momento muito difícil, e, como<br />
artista, que vivia o dia-a-dia dos angolanos,<br />
a aposta passou pela produção<br />
de temas musicais com mensagens<br />
educativas.<br />
- Surge no mercado angolano e<br />
nos Palop nos anos 80, tendo como<br />
companheiros Eduardo Paim, Ricardo<br />
Abreu e Ruca Van-Dúnem…<br />
- Os dois primeiros discos são arranjados<br />
e produzidos por Eduardo<br />
Paim e Ruca. Eles começaram, na altura,<br />
a mostrar-me a diferença entre<br />
a música na diáspora e a música que<br />
se pretendia voltar a fazer em Angola,<br />
porque, no final dos anos 80, ninguém<br />
gravava em Angola. Lembro-me que<br />
foram falar comigo em Lisboa, no caso<br />
concreto o Ricardo Abreu e o Ruca<br />
Van-Dúnem, para mostrarem outra<br />
forma de abordar Angola. Na altura,<br />
na diáspora, tínhamos muitas músicas,<br />
cujas letras transmitiam o sentimento<br />
de saudade que sentíamos do<br />
país, das nossas famílias. Com o Ruca<br />
e o Eduardo, vi e percebi que Angola<br />
também podia fazer parte do mundo,<br />
com a sua alegria e a sua ginga. No<br />
caso do Ruca, era uma música mais<br />
cadenciada: a kizomba.<br />
Como se dá a sua entrada no<br />
semba, tendo em conta que, no<br />
princípio da carreira, estava mais<br />
ligado à kizomba?<br />
O nome kizomba é dado, de facto,<br />
por causa das nossas músicas. Do<br />
Luandino de Carvalho, Eduardo Paim,<br />
Ruca Van-Dúnem, Ricardo Abreu.Em<br />
relação ao semba, surge na minha linha<br />
melódica com o “Tunda Mujila”,<br />
em 1992. Mas a incursão mais forte<br />
neste género musical dá-se com o<br />
“Canto o meu Semba”. Com o tempo,<br />
tornou-se na minha principal referência<br />
musical, reforçada com os discos<br />
“Ex-Combatentes” e “Recompasso”.<br />
Vario bastante, mas tenho tido a preocupação<br />
de não deixar ficar mal as pessoas<br />
que gostam da minha música.<br />
É um ritmo com o qual mais me<br />
identifico e, ao mesmo tempo, melhor<br />
me enquadro.Tenho o compromisso<br />
moral de tornar o semba cada vez<br />
mais vivo. Já toquei em várias partes<br />
do mundo e posso afirmar que kizomba<br />
todo o mundo faz e toca, mas o<br />
semba é mesmo só angolano. É a nossa<br />
bandeira.<br />
“(O Semba) é um<br />
ritmo com o qual mais me<br />
identifico e, ao mesmo<br />
tempo, melhor me enquadro.Tenho<br />
o compromisso<br />
moral de tornar o semba<br />
cada vez mais vivo. Já<br />
toquei em várias partes<br />
do mundo e posso afirmar<br />
que kizomba todo o mundo<br />
faz e toca, mas o semba<br />
é mesmo só angolano. É a<br />
nossa bandeira<br />
“<br />
“Inocente”, “Makalakato”, “Reencontro”,<br />
o que nos pode dizer sobre<br />
estas músicas?<br />
São diferentes, mas, ao mesmo<br />
tempo, completam o puzzle. E o<br />
puzzle é sempre do amor ao lugar.<br />
“Inocente” é uma música feita, na<br />
altura, a pensar nas crianças de rua,<br />
no seu sofrimento. “Reencontro” foi<br />
produzido a pensar no sentimento<br />
de saudade do país, na necessidade<br />
de regressar às origens. Já “Makalakato”<br />
é uma música escrita por Galiano<br />
Neto, mas que tive que dar um toque<br />
diferente, mudando a forma em que<br />
estava escrita. É uma música marcante,<br />
que tem história e que continua a<br />
ser ouvida pelo país.<br />
Às vezes, não procuro tanto o<br />
aplauso ou aquele palco. O que procuro<br />
é continuar a ter o prazer quando<br />
termino uma música, sentir-me vivo,<br />
sentir-me com vontade de continuar<br />
à procura e perceber que, muitas vezes,<br />
a música ganha uma dimensão na<br />
vida das pessoas da qual não temos<br />
noção. Quero, essencialmente, continuar<br />
a criar e a comunicar de uma<br />
maneira que possa fazer diferença na<br />
vida das pessoas.<br />
QUEM É PAULO FLORES ?<br />
Paulo Flores, que nasceu<br />
no município do<br />
Cazenga, em Luanda,<br />
em 1972, é um dos<br />
cantores mais populares<br />
de Angola. Mudou-se para Lisboa<br />
durante a sua infância. Lançou o<br />
seu primeiro álbum em 1988. As<br />
suas canções tratam temas diversos<br />
como governação, quotidiano dos<br />
angolanos, guerra e corrupção.<br />
DISCOGRAFIA<br />
• Kapuete, 1988<br />
• Sassasa, 1990<br />
• Coração Farrapo e Cherry, 1991<br />
• Brincadeira Tem Hora, 1993<br />
• Inocente, 1995<br />
• Perto do Fim, 1998<br />
• Recompasso, 2001<br />
• Xé Povo, 2003<br />
• The Best, 2003<br />
• Quintal do Semba, 2003<br />
• Ao Vivo, 2004<br />
• Ex-Combatentes, 2009<br />
• Ex-combatentes Redux, 2012<br />
• O País Que Nasceu Meu Pai, 2013<br />
• Bolo de Aniversário, 2016<br />
• Kandongueiro Voador, 2017<br />
26 Figuras&Negócios - Nº 202 - JUlHO 2019