FUNDAÇÀO GETULIO VARGAS DE OLHO NA ETERNIDADE: a ...
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documentos oficiais, criados por governos, com formato e suporte padronizados, nos<br />
eximem de tais considerações. Entretanto, é sempre interessante observar a seleção<br />
realizada e a versão que o arquivo produz da vida de seu titular.<br />
O titular de um arquivo não precisa pensar da mesma maneira durante sua<br />
vida; ou mesmo se manter “coerente” na guarda de seus documentos ou ainda<br />
conseguir distinguir entre o que é real e o que é ficção em sua memória. Tom Jobim<br />
manteve fotos suas durante uma de suas caçadas a aves na mata (cerca de 1950), junto<br />
a artigos sobre ecologia e apreciação de pássaros (desde 1986). O titular se constrói e<br />
a seu texto/ seu arquivo, como parte de um discurso que se quer perpetuar, enquanto<br />
esse mesmo discurso o empurra para a confirmação do personagem construído. Essas<br />
forças não se combatem, mas buscam certo equilíbrio na “produção de si”, que se<br />
configura como lugar de experimentação e ajuste. (GOMES, 2004, p.17)<br />
Durante sua vida, Tom fez várias escolhas e não as lamentou, embora tivesse<br />
lamentado suas conseqüências. Constantemente, por exemplo, reclamava da imprensa,<br />
na própria imprensa:<br />
[…] a imprensa do Rio, que sempre fala mal dos artistas — fala mal do Chico,<br />
fala mal do Caetano — vem e malha. O Brasil é de cabeça para baixo, persegue<br />
a quem trabalha. Se você trabalhar, aparece fiscal, vem a polícia. Os bandidos,<br />
não […] as moças bonitas se apaixonam por eles. Parece coisa de Mário de<br />
Andrade, Macunaíma… Sempre que o Brasil vai mal, eles dizem que eu estou<br />
me mudando para os Estados Unidos. Quando o país melhora, dizem que eu<br />
estou voltando. Mas não é nada disso. […] Sempre essa besteirada. Dizem que<br />
eu saí daqui para fugir do Imposto de Renda, como se lá não fosse pior. […]<br />
Aqui é que tem esse negócio, negócio de procedência maligna. Depois que eu<br />
fiz meia dúzia de modinhas, ficaram falando mal de mim, porque eles não têm<br />
mais o que falar. (in LOYOLA, 1988, p. 39)<br />
Pensava que seu trabalho nem sempre era reconhecido como o era em outros<br />
países por onde passou. A campanha de 1988 que fez para a The Coca-Cola<br />
Company, por exemplo, repercutiu efeitos indesejados aqui no Brasil:<br />
São multinacionais que estão aqui. E se você vai negar espaço para elas,<br />
dará o direito de, lá fora, negarem para a Varig, Vale do Rio Doce […] A Coca-<br />
Cola dá emprego a milhares de brasileiros — o xarope é brasileiro, a água é<br />
brasileira. Então, na hora em que aparece o anúncio, essas pessoas que tomam<br />
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