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edição de 14 de novembro de 2016

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STORYTELLER<br />

Bruno Valença<br />

As ratazanas<br />

apoteóticas<br />

Rosa Magalhães foi uma das<br />

responsáveis pelas festas olímpicas<br />

que encantaram o mundo<br />

LuLa Vieira<br />

Brasil <strong>de</strong>ve muito a Rosa Magalhães. Foi<br />

O ela uma das responsáveis pelas festas<br />

olímpicas que encantaram o mundo. E todo<br />

ano <strong>de</strong>slumbra a plateia com os mais requintados<br />

<strong>de</strong>sfiles <strong>de</strong> Carnaval. Com toda razão,<br />

ela é uma celebrida<strong>de</strong> no universo do espetáculo.<br />

Entre as suas inúmeras e gloriosas características<br />

está a <strong>de</strong> ser uma extraordinária<br />

contadora <strong>de</strong> histórias. Não inventadora <strong>de</strong><br />

histórias, vejam bem, mas contadora <strong>de</strong> fatos<br />

que ela viveu ou esteve por perto quando<br />

aconteceram.<br />

Outro dia, dando uma olhada em velhas<br />

fotos, encontrei um flagrante da Rosa, em minha<br />

casa, cercada por gente embevecida, revivendo<br />

um fato ocorrido nos bastidores das<br />

gravações da minisérie O Tempo e o Vento, para<br />

a Re<strong>de</strong> Globo.<br />

Segundo seu (<strong>de</strong>la) relato, uma <strong>de</strong>terminada<br />

passagem do roteiro exigia a participação<br />

<strong>de</strong> tinta ratos. Eu escrevi exatamente<br />

isso: tinta ratos. Trinta ratos, cacete! Profissional<br />

como toda gran<strong>de</strong> produtora, Rosa<br />

venceu o nojo e o medo, chamou a equipe e<br />

comandou a busca e apreensão <strong>de</strong> três <strong>de</strong>zenas<br />

<strong>de</strong> roedores, como se fosse a mais pura<br />

rotina.<br />

Foi um <strong>de</strong>us nos acuda, mas em algumas<br />

horas a produção, orgulhosa, já tinha engaiolado<br />

o número necessário <strong>de</strong> bichos e comunicado<br />

ao Paulo José, o diretor, que os roedores<br />

estavam prontos. Não é que o cara resolve<br />

não gostar da cor dos ratos? Quero ratos cinza,<br />

disse ele. Rato preto é muito chinfrin, não<br />

compõe bem a cena.<br />

Numa hora <strong>de</strong>ssas, não se discute com o<br />

diretor. Se ele acha que rato tem <strong>de</strong> ser cinza,<br />

rato bom é rato cinza e acabou a conversa.<br />

E aí, o que fazer? Rosa resolveu apelar para a<br />

criativida<strong>de</strong>: pintou, ou melhor, grafitou os<br />

ratos.<br />

Mandou buscar (não me pergunte on<strong>de</strong>)<br />

alguns quilos <strong>de</strong> grafite em pó e maquiou os<br />

ratinhos um a um, dando a eles uma elegante<br />

coloração cinza-prata, com qualida<strong>de</strong> global.<br />

O único problema é que, por uma razão<br />

qualquer, rato é alérgico a grafite. Em algumas<br />

horas, os ratinhos começaram a morrer,<br />

talvez a se suicidar <strong>de</strong> vergonha, sabe-se lá.<br />

O fato é que o elenco foi se <strong>de</strong>sfalcando<br />

pouco a pouco. Claro que ninguém tinha coragem<br />

<strong>de</strong> dizer para o Paulo José que, se ele<br />

<strong>de</strong>morasse a gravar a cena, iria faltar rato no<br />

Projac e adjacências. Não se aporrinha diretor<br />

com questões menores.<br />

Sendo assim, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> prolongada discussão,<br />

ficou estabelecido que iriam manter os<br />

ratos na cor natural até a hora <strong>de</strong> entrar em<br />

cena e só neste momento dariam o banho <strong>de</strong><br />

pó <strong>de</strong> grafite.<br />

Assim, caso o artista roedor morresse, seria<br />

após a atuação. O verda<strong>de</strong>iro sacrifício<br />

pela arte, embora um pouco forçado pelas<br />

circunstâncias.<br />

Um integrante da equipe, portanto, foi nomeado<br />

pastor <strong>de</strong> rato, encarregado <strong>de</strong> vigiar o<br />

rebanho, outro ficou a postos para acinzentá-<br />

-los quando necessário.<br />

Pois bem, após um dia inteiro <strong>de</strong> espera,<br />

Paulo José <strong>de</strong>sistiu da cena dos ratos. Em outras<br />

palavras, a figuração roedora estava dispensada.<br />

Problema: o que fazer com aquele bando<br />

<strong>de</strong> ratos engaiolados? Rosa, meio puta da vida,<br />

sentenciou: tendo sido os artistas dispensados,<br />

a regra mandava agra<strong>de</strong>cer pela ajuda<br />

e provi<strong>de</strong>nciar condução para casa. O que, no<br />

caso da maioria dos ratos, era o esgoto mais<br />

próximo.<br />

Agora vocês imaginem um rebanho <strong>de</strong> ratos<br />

solto em plena cida<strong>de</strong> cenográfica. Meta<strong>de</strong><br />

da Globo <strong>de</strong>smaiou <strong>de</strong> susto.<br />

Lula Vieira é publicitário, diretor da<br />

Mesa Consultoria <strong>de</strong> Comunicação,<br />

radialista, escritor, editor e professor<br />

lulavieira@grupomesa.com.br<br />

46 <strong>14</strong> <strong>de</strong> <strong>novembro</strong> <strong>de</strong> <strong>2016</strong> - jornal propmark

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