19.04.2013 Views

A cidade e as serras - a casa do espiritismo

A cidade e as serras - a casa do espiritismo

A cidade e as serras - a casa do espiritismo

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

E agora, entre roseir<strong>as</strong> que rebentam, e vinh<strong>as</strong> que se vindimam, já cinco<br />

anos p<strong>as</strong>saram sobre Tormes e a Serra. O meu Príncipe já não é o último<br />

Jacinto, Jacinto ponto final – porque naquele solar que decaíra, correm agora,<br />

com soberba vida, uma gorda e vermelha Teresinha, minha afilhada, e um<br />

Jacintinho, senhor muito da minha amizade. E, pai de família, principiara a<br />

fazer-se monótono, pela perfeição da beleza moral, aquele homem tão pitoresco<br />

pela inquietação filosófica, e pelos varia<strong>do</strong>s tormentos da fant<strong>as</strong>ia insaciada.<br />

Quan<strong>do</strong> ele agora, bom sabe<strong>do</strong>r d<strong>as</strong> cois<strong>as</strong> da lavoura, percorria comigo a<br />

Quinta, em sólid<strong>as</strong> palestr<strong>as</strong> agrícol<strong>as</strong>, prudentes e sem quimer<strong>as</strong> – eu qu<strong>as</strong>e<br />

lamentava esse outro Jacinto que colhia uma teoria em cada ramo de árvore, e<br />

riscan<strong>do</strong> o ar com a bengala, planejava queijeir<strong>as</strong> de cristal e porcelana, para<br />

fabricar queijinhos que custariam duzentos mil-réis cada um!<br />

Também a paternidade lhe despertara a responsabilidade. Jacinto possuía<br />

agora um caderno de cont<strong>as</strong>, ainda pequeno, rabiscan<strong>do</strong> a lápis, com falh<strong>as</strong>, e<br />

papeluchos soltos entremea<strong>do</strong>s, m<strong>as</strong> onde <strong>as</strong> su<strong>as</strong> despes<strong>as</strong>, <strong>as</strong> su<strong>as</strong> rend<strong>as</strong> se<br />

alinhavam, como du<strong>as</strong> hostes disciplinad<strong>as</strong>.<br />

Visitara já <strong>as</strong> su<strong>as</strong> propriedades de Montemor, da Beira; e consertava,<br />

mobiliava <strong>as</strong> velh<strong>as</strong> c<strong>as</strong><strong>as</strong> dess<strong>as</strong> propriedades para que os seus filhos, mais<br />

tarde, cresci<strong>do</strong>s, encontr<strong>as</strong>sem “ninhos feitos”. M<strong>as</strong> onde eu reconheci que<br />

definitivamente um perfeito e ditoso equilíbrio se estabelecera na alma <strong>do</strong> meu<br />

Príncipe, foi quan<strong>do</strong> ele, já saí<strong>do</strong> daquele primeiro e ardente fanatismo da<br />

Simpli<strong>cidade</strong> – entreabriu a porta de Tormes à Civilização. Dois meses antes de<br />

n<strong>as</strong>cer a Teresinha, uma tarde, entrou pela avenida de plátanos uma chiante e<br />

longa fila de carros, requisita<strong>do</strong>s pôr toda a freguesia, e acucula<strong>do</strong>s de<br />

caixotes. Eram os famosos caixotes, pôr tanto tempo encalha<strong>do</strong>s em Alba de<br />

Tormes, e que chegavam, para despejar a Cidade sobre a Serra. Eu pensei: -<br />

Mau! o meu pobre Jacinto teve uma recaída! M<strong>as</strong> os confortos mais<br />

complica<strong>do</strong>s, que continha aquela caixotaria temerosa, foram, com surpresa<br />

minha, desvia<strong>do</strong>s para os sótãos imensos, para o pó da inutilidade; e o velho<br />

solar apen<strong>as</strong> se regalou com alguns tapetes sobre os seus soalhos, cortin<strong>as</strong><br />

pel<strong>as</strong> janel<strong>as</strong> desabrigad<strong>as</strong>, e fund<strong>as</strong> poltron<strong>as</strong>, fun<strong>do</strong>s sofás, para que os<br />

repousos, pôr que ele suspirara, fossem mais lentos e suaves. Atribuí esta<br />

moderação a minha prima Joaninha, que amava Tormes na sua nudez rude. Ela<br />

jurou que <strong>as</strong>sim o ordenara o seu Jacinto. M<strong>as</strong>, decorrid<strong>as</strong> seman<strong>as</strong>, tremi.<br />

Aparecera, vin<strong>do</strong> de Lisboa, um contramestre, com operários, e mais caixotes,<br />

para instalar um telefone!<br />

-Um telefone, em Tormes, Jacinto?<br />

O meu Príncipe explicou, com humildade:<br />

-Para c<strong>as</strong>a de meu sogro!... bem vês.<br />

Era razoável e carinhoso. O telefone porém, sutilmente, mudamente,<br />

estendeu outro longo fio, para Valverde. E Jacinto, alargan<strong>do</strong> os braços, qu<strong>as</strong>e<br />

suplicante:<br />

-Para c<strong>as</strong>a <strong>do</strong> médico. Compreendes...<br />

137

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!