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A cidade e as serras - a casa do espiritismo

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encolhia, a Eletri<strong>cidade</strong> que se sumia, decidiu valorosamente vencer <strong>as</strong><br />

resistênci<strong>as</strong> finais da Matéria e da Força pôr nov<strong>as</strong> e mais poderos<strong>as</strong><br />

acumulações de Mecanismos. E ness<strong>as</strong> seman<strong>as</strong> de Abril, enquanto <strong>as</strong> ros<strong>as</strong><br />

desabrochavam, a nossa agitada c<strong>as</strong>a, entre aquel<strong>as</strong> quiet<strong>as</strong> c<strong>as</strong><strong>as</strong> <strong>do</strong>s Campos<br />

Elísios que preguiçavam ao sol, incessantemente tremeu, envolta num pó de<br />

caliça e de empreitada, com o bruto picar de pedra, o retininte martelar de<br />

ferro. Nos silenciosos corre<strong>do</strong>res, onde me era <strong>do</strong>ce fumar antes <strong>do</strong> almoço um<br />

pensativo cigarro, circulavam agora, desde madrugada, ranchos de operários,<br />

de blus<strong>as</strong> branc<strong>as</strong>, <strong>as</strong>sobian<strong>do</strong> o Petit-Bleu, e intimidan<strong>do</strong> os meus p<strong>as</strong>sos,<br />

quan<strong>do</strong> eu atravessava em fralda e chinel<strong>as</strong> para o banho ou para ou para<br />

outros retiros. Apen<strong>as</strong> se varava com perícia algum andaime obstruin<strong>do</strong> <strong>as</strong><br />

port<strong>as</strong> – logo se esbarrava com uma pilha de tábu<strong>as</strong>, uma seira de ferrament<strong>as</strong><br />

ou um balde enorme de argam<strong>as</strong>sa. E os pedaços de soalho levanta<strong>do</strong><br />

mostravam tristemente, como num cadáver aberto, to<strong>do</strong>s interiores <strong>do</strong> 202, a<br />

ossatura, os sensíveis nervos de arame, os negros intestinos de ferro fundi<strong>do</strong>.<br />

Cada dia estacava diante <strong>do</strong> portão alguma lenta carroça, de onde os<br />

cria<strong>do</strong>s, em mang<strong>as</strong> de camisa, descarregavam caixotes de madeira, far<strong>do</strong>s de<br />

lona, que se despregavam e se descosiam numa sala <strong>as</strong>faltada, ao fun<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

jardim, pôr trás da sebe de lil<strong>as</strong>es. E eu descia, reclama<strong>do</strong> pelo meu Príncipe,<br />

para admirar uma nova Máquina que nos tornaria a vida mais fácil,<br />

estabelecen<strong>do</strong> dum mo<strong>do</strong> mais seguro o nosso <strong>do</strong>mínio sobre a Substância.<br />

Durante os calores, que apertaram depois da Ascensão, ensaiamos<br />

esperançadamente, para refrescar <strong>as</strong> águ<strong>as</strong> minerais, a Soda-Water e os<br />

Me<strong>do</strong>cs ligeiros, três geleir<strong>as</strong>, que se amontoaram na copa sucessivamente<br />

desprestigiad<strong>as</strong>. Com os morangos novos apareceu um instrumentozinho<br />

<strong>as</strong>tuto, para lhes arrancar os pés, delicadamente. Depois recebemos outro,<br />

prodigioso, de prata e cristal, para remexer freneticamente <strong>as</strong> salad<strong>as</strong>; e, na<br />

primeira vez que o experimentei, to<strong>do</strong> o vinagre esparrilhou sobre os olhos <strong>do</strong><br />

meu Príncipe, que fugiu aos uivos! M<strong>as</strong> ele teimava... Nos atos mais<br />

elementares, para aliviar ou apressar o esforço, se socorria Jacinto da dinâmica.<br />

E agora era pôr intervenção duma máquina que abotoava <strong>as</strong> ceroul<strong>as</strong>.<br />

E simultaneamente, ou em obediência à sua Idéia, ou governa<strong>do</strong> pelo<br />

despotismo <strong>do</strong> hábito, não cessava, ao la<strong>do</strong> de Mecânica acumulada, de<br />

acumular Erudição. Ó, a inv<strong>as</strong>ão <strong>do</strong>s livros no 202! Solitários, aos pares, em<br />

pacotes, dentro de caix<strong>as</strong>, franzinos, gor<strong>do</strong>s e repletos de autoridade, envoltos<br />

em plebéia capa amarela ou revesti<strong>do</strong>s de marroquim e ouro, perpetuamente,<br />

torrencialmente, invadiam pôr tod<strong>as</strong> <strong>as</strong> larg<strong>as</strong> port<strong>as</strong> a Biblioteca, onde se<br />

estiravam sobre o tapete, se repimpavam n<strong>as</strong> cadeir<strong>as</strong> maci<strong>as</strong>, se entronizavam<br />

em cima d<strong>as</strong> mes<strong>as</strong> robust<strong>as</strong>, e sobretu<strong>do</strong> trepavam contra <strong>as</strong> janel<strong>as</strong>, em<br />

sôfreg<strong>as</strong> pilh<strong>as</strong>, como se, sufoca<strong>do</strong>s pela sua própria multidão, procur<strong>as</strong>sem<br />

com ânsia espaço e ar! Na erudita nave, onde apen<strong>as</strong> alguns livros mais altos<br />

restavam descobertos, sem tapume de livros, perenemente se adensava um<br />

pensativo crepúsculo de Outono enquanto fora Junho refulgia. A Biblioteca<br />

transborda através de to<strong>do</strong> o 202! Não se abria um armário sem que de dentro<br />

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