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Memória em Movimento Revista de Comunicaçao, Política e Direitos Humanos ano 1 n o 0 2 o semestre de 2007 baixas, estigmatizados pelo estereótipo do criminoso criado pela classe alta, mantidos pela classe média e pelos meios de comunicação. O consumo de bens simbólicos proporcionado pela violência pode ser dividido em dois mercados. Primeiramente, o consumo da “arte” do crime ou da identificação com o criminoso beneficiado com o estereótipo, por meio dos significados que são agregados ao fenômeno, em virtude de sua potencialidade socialmente aceitável, consumível. De outra forma, o consumo da ostentação do suplício do criminoso “simples”. Do delinqüente marginalizado socialmente, antes de cometer o crime, o corpo supliciado estendido nas páginas policiais como outrora nas praças públicas, durante a justiça penal clássica, até fins do século XVIII e primeira metade do século XIX. A intimidade, o espaço privado, a casa enquanto mantenedora dos valores emotivos que orientam o espaço público, a rua e a Justiça representam o antigo soberano absoluto que personifica a lei e diz quando e como algo deve ou não ser feito. Os valores que são agregados às lacunas dos sinais do crime são obras da coletividade íntima, emotiva, que dita de qual dos crimes se pode rir e de qual se deve punir. O delito que se abre a esse poder é recebido com alegria, entusiasmo. A mais cruel das guerras é facilmente tornada em samba. Do contrário, o delito de cuja ilegalidade se preserva a classe média, em defesa de seus bens e da vida simples que acompanha o consumo, está longe do domínio honroso da estética do crime ou da ilegalidade dos direitos. Direitos são facilmente desrespeitados com o apreço socialmente aceitável dos processos incompreendidos, mas carregados do bacharelismo que a cultura valoriza. A ilegalidade de que são objetos os pequenos bens da sociedade de consumo, contudo, não é tolerada. E sua punição, sim, esteticamente ornada em sentimentos que chamamos violência mórbida, trazida como suplício simbólico – castigo pelo crime contra o rei –, que instala novo ciclo de aceitação social do punir como identificação do criminoso, escoamento da pulsão agressiva do direito do indivíduo, sedimentado na interiorização dos significados do Estado. Tem-se, então, novo impulso de agregação de valores e perpetuação da violência, sem dúvida, entre nós, um problema de sinais; um desafio à justiça pública e, principalmente, à instância penal. 29
Memória em Movimento Revista de Comunicaçao, Política e Direitos Humanos ano 1 n o 0 2 o semestre de 2007 REFERÊNCIAS DAMATTA, R. 1997. A Casa e A Rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. Rio de Janeiro, Rocco. FOUCAULT, M. 1998. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro, Graal. FREYRE, G. 1964. Casa Grande e Senzala. Rio de Janeiro, José Olympio. HABERMAS, J. 2000. O Discurso Filosófico da Modernidade. São Paulo: Martins Fontes. HOLANDA, S. B. 1984. Raízes do Brasil. Rio de Janeiro, José Olympio. LAÉRTIOS, D. 1987. Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres. Brasília, UnB WEBER, M. 1965. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo, Pioneira. 30
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