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criança e consumo

Crianca-e-Consumo_10-anos-de-transformacao

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nossa sociedade são Hiroshima/Nagasaki e Chernobyl.<br />

Por trás das práticas irresponsáveis citadas, estava a necessidade de<br />

produzir, de criar estoques, até mesmo de armamentos de guerra capazes<br />

de exterminar a humanidade. Um processo autodestruidor. Assim,<br />

chegamos à consequência lógica desse processo: de que adianta produzir,<br />

se o que for produzido não for consumido?<br />

Um exemplo muito ilustrativo do que estou tentando discutir é uma<br />

pesquisa que teria sido encomendada pela Maurício de Sousa Produções<br />

sobre a perda, para a economia, que a restrição total à publicidade dirigida<br />

ao público infantil acarretaria: 33 bilhões de reais. O estudo baseava-se<br />

na resolução 163 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente<br />

(Conanda), que define como abusiva tal publicidade.<br />

Quem vê uma notícia assim fica estarrecido. Mas o que se oculta por<br />

trás dela? Pode ser cruel dizer, mas ela mostra que em nossa sociedade a<br />

dimensão econômica, o lucro, o dinheiro e a economia valem mais do que<br />

o ser humano. Não se comenta, por exemplo, que com isso se está expondo<br />

a saúde (e a vida) de milhões de <strong>criança</strong>s, que tal publicidade contribui<br />

para que 33% das <strong>criança</strong>s brasileiras estejam com sobrepeso e 15% já<br />

sejam obesas, que essas <strong>criança</strong>s vão carregar sequelas disso por muito<br />

tempo. Que qualidade de vida elas podem esperar? Mesmo argumentando<br />

em termos econômicos, há pesquisas que mostram que os gastos com<br />

saúde, no que se refere à obesidade, já ultrapassam 100 bilhões de reais.<br />

O que precisa ficar claro é que o <strong>consumo</strong> não é bom nem ruim. Devese<br />

questionar que tipo de <strong>consumo</strong> estamos incentivando, para quem,<br />

dentro de que circunstâncias e quais são suas consequências. Aqui chegamos<br />

à questão que nos interessa: há, por trás do <strong>consumo</strong> – de sua<br />

constituição, de sua história, de sua concretização, dos processos que a<br />

ele subjazem –, uma ética. E essa ética deve atrelar-se à justiça, ao bem<br />

-estar das pessoas, a uma vida digna.<br />

Li uma vez a história de uma mulher que, angustiada, refletindo sobre<br />

o sentido da vida em uma sociedade em que tudo grita por <strong>consumo</strong>, para<br />

diante de uma loja e, repentinamente, grita: “Mas isso é tudo o que há?”.<br />

Um vendedor corre até ela e diz: “Não, em nossos catálogos temos ainda<br />

muitas outras coisas a oferecer”. A impressão que se tem é que estamos<br />

capturados pelo fundamentalismo do mercado e do <strong>consumo</strong> e que não<br />

há salvação. Nunca nos perguntamos sobre como as práticas consumistas<br />

influem e podem dar sentido à vida.<br />

Tentamos ver o que seria ética e como falar dela para as <strong>criança</strong>s. Entramos,<br />

depois, em uma reflexão sobre o que subjaz à prática do <strong>consumo</strong><br />

e constatamos que, nessa prática, podem estar presentes elementos éticos<br />

sérios. Fica meu desejo sincero de que essas considerações ajudem-nos a<br />

superar as inúmeras situações que impedem o bem-estar das pessoas.<br />

NOTAS<br />

1 Para uma discussão aprofundada da “ética do discurso”, remetemos a uma publicação<br />

recente, na qual essa questão é elaborada detalhadamente: O direito humano à<br />

comunicação – pela democratização da mídia. Petrópolis: Vozes, 2013.<br />

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