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CUIDADORES FAMILIARES DE IDOSOS DEMENTADOS: UM ESTUDO CRÍTICO DE PRÁTICAS QUOTIDIANAS<br />
E POLÍTICAS SOCIAIS DE JUDICIALIZAÇÃO E REPRIVATIZAÇÃO<br />
estaria completo se não fizéssemos referência ao contexto legal<br />
e de políticas públicas que convergem para a<br />
desinstitucionalização do cuidado da população idosa.<br />
Referimo-nos, aqui, a leis, estatutos, portarias e, de um modo<br />
mais amplo, à <strong>Política</strong> Nacional de Saúde do Idoso, que orientam<br />
e regulamentam os procedimentos de atenção à população<br />
idosa no Brasil. Iniciemos caracterizando o quadro<br />
epidemiológico da questão para situá-lo no percurso dos<br />
dispositivos legais criados nos últimos anos no nosso país.<br />
Lembramos, inicialmente, que a transição demográfica<br />
trouxe uma importante transição epidemiológica, a qual<br />
ocasionou alterações relevantes no quadro de morbimortalidade<br />
da população. As doenças infecto-contagiosas, que, em 1950,<br />
representavam 40% das mortes registradas no país, hoje são<br />
responsáveis por 10% destas. Assim, em aproximadamente<br />
cinqüenta anos, o Brasil passou de um perfil de<br />
morbimortalidade comum à população jovem para um perfil<br />
cuja principal característica é a alta prevalência de doenças<br />
crônicas, que é típico de faixas etárias mais idosas (GORDILHO<br />
et al, 2000). Dentre tais doenças, interessa destacar, para o nosso<br />
trabalho, os altos custos dos tratamentos de doenças crônicodegenerativas<br />
e o crescimento do número de casos em<br />
decorrência do envelhecimento populacional. Nesse rol de<br />
doenças, encontram-se as síndromes demenciais, que, nos<br />
últimos trinta anos, se transformaram em problema de saúde<br />
pública em função do elevado número de portadores. O<br />
aumento dos gastos, públicos e privados, para o diagnóstico,<br />
tratamento e acompanhamento desses pacientes têm feito com<br />
que os custos financeiros do envelhecimento requeiram que se<br />
repense acerca das políticas públicas de saúde 7 .<br />
Frente a este quadro, o que se vem observando, desde a<br />
última década, é uma espécie de contra-movimento, que poderia<br />
ser chamado, seguindo a perspectiva desenhada por Debert<br />
(2002), num sentido amplo, de “reprivatização do cuidado”,<br />
especialmente junto à clientela idosa. Tal movimento significa<br />
7 Além das questões econômicas, a perda da lucidez é simbolicamente um limite de<br />
demarcação para a entrada definitiva na velhice, segundo a percepção de muitos idosos,<br />
conforme relata Debert (1999).<br />
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