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Política e cotidiano - ABA

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“O SENHOR ME USA TANTO”:<br />

EXPERIÊNCIA RELIGIOSA E A CONSTRUÇÃO DO CORPO FEMININO NO PENTECOSTALISMO<br />

particular”; não é mera sujeição passiva (aquilo que tendemos<br />

a pensar como a antítese da agência), mas dimensão formativa<br />

da agência.<br />

Podemos extrair daqui duas conclusões importantes para<br />

o nosso estudo. Em primeiro lugar, é preciso reconsiderar as<br />

oposições entre controle e espontaneidade, sujeição e liberdade,<br />

subordinação e agência, a partir das quais classificamos as três<br />

cenas descritas no começo do texto. A subordinação do corpo à<br />

disciplina imposta pelas obreiras e à vigilância da comunidade<br />

religiosa, sua impossibilidade de encobrimento ao olhar de Deus<br />

– que tudo vê e que, a qualquer momento, pode vir a expor-lhe<br />

as faltas (mesmo que seja para perdoá-las) – não são apenas<br />

instâncias de sujeição, mas também situações formativas, em<br />

que se gestam certas modalidades de agência. Conforme<br />

procuramos mostrar, isso significa também, por outro lado, que<br />

a espontaneidade e o aparente descontrole que caracterizam a<br />

experiência de recebimento do Espírito Santo tampouco podem<br />

ser tomados como meras vivências de um corpo<br />

temporariamente liberto de constrangimentos: supõem, ao<br />

contrário, o desenvolvimento de uma certa sensibilidade ou de<br />

modos específicos de engajamento com outros e no espaço e,<br />

portanto, um aprendizado que envolve mecanismos de controle<br />

e de subordinação.<br />

Em segundo lugar, vale observar que docilidade e<br />

sujeição podem ser o resultado de certas formas de cuidado de<br />

si – e não simplesmente da imposição forçada de estratégias de<br />

controle e de subordinação –, de práticas e de investimentos<br />

pelos quais os indivíduos buscam ativamente incorporar ideais<br />

ou modelos gerais de conduta como aqueles propostos pela<br />

religião. Foucault caracteriza essa noção de cuidado de si – tão<br />

importante na história do cristianismo e cujas origens ele<br />

encontra na filosofia antiga, grega e romana – a partir de duas<br />

idéias básicas. Cuidado de si designa uma atitude geral, “um<br />

certo modo de encarar as coisas, de estar no mundo, de praticar<br />

ações, de ter relações com o outro” (FOUCAULT, 2004: 14) que<br />

envolve uma conversão do olhar, uma forma de atenção a si.<br />

Mas designa também o modo pelo qual tal atitude ou modo de<br />

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