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Política e cotidiano - ABA

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IARA BELELI<br />

No segundo, o produto é destacado pela cor amarronzada<br />

(bege escuro). O sabonete marrom aparece sozinho em primeiro<br />

plano. A ausência de marcações de gênero é assim justificada:<br />

UAU! [gênero e raça] é um cruzamento complicado, porque<br />

a raça acaba se tornando um outro gênero, muitas vezes<br />

ela é tratada como um outro gênero... porque a raça, ela é...<br />

bom a gente vive num país “pouco” preconceituoso, ou<br />

muito, mas pouco publicado, então o que acontece é que...<br />

a outra raça, vamos dizer assim, outras raças... têm o seu<br />

próprio gueto, e é ali que você vai sem distinção de gênero...<br />

O depoimento de Guime indica que as peles escuras<br />

oferecem uma distinção forte o suficiente para criar uma<br />

identificação no consumidor, não necessitando outras<br />

marcações. A homogeneidade da “raça negra” é visível na<br />

utilização do termo “gueto”, que indica um mundo à parte,<br />

limitado pela cor da pele, tampouco passa despercebida a<br />

indicação do referente. Em um cenário há tempos pautado pela<br />

estética “branca”, fazer produtos dirigidos a um gueto parece<br />

mais fácil do que imiscuir corpos escuros em quaisquer cenários,<br />

no sentido de não desorganizar a alteridade estabelecida entre<br />

um ”nós” e os “outros”. Guime desresponsabiliza as agências<br />

dessa conformação:<br />

[a publicidade] é branca, é branca até hoje na cabeça das<br />

marcas [clientes], não digo isso das agências, porque a<br />

gente gostaria muito de poder deixar a coisa mais de<br />

verdade; quanto mais de verdade, melhor para a gente.<br />

Mas as marcas [clientes], elas ah..., elas acham que o<br />

aspiracional, isso é mais lamentável, mas elas acham que<br />

o aspiracional da raça negra é a raça branca... 26<br />

Se o cliente decide os signos que serão justapostos à sua<br />

marca/logo e quais imagens devem ou não circular, na medida<br />

em que a publicidade é um serviço contratado por esse mesmo<br />

cliente, o publicitário não é uma figura estática, que fica à mercê<br />

de quem financia a campanha e, como conseqüência, a agência.<br />

O jogo de responsabilizar quem define o que e como entra na<br />

publicidade é bastante complexo, primeiro porque o publicitário<br />

26 Entrevista com Guime, diretor de criação da W/, junho de 2004.<br />

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