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MIRIAM C. M. RABELO E SUELI RIBEIRO MOTA<br />
os homens de calça “social” e camisa de manga comprida; as<br />
mulheres de saia ou vestido abaixo do joelho, cabelos presos em<br />
coque. No salão, gente sentada ou ajoelhada. A maioria é de<br />
mulheres, e muitas estão acompanhadas de crianças. Em pé e<br />
fardados, estão as obreiras e, em número menor, os obreiros. Uma<br />
obreira se aproxima do microfone e dá início a uma oração<br />
enquanto o pastor não assume a liderança. Outras circulam pelo<br />
salão, passando os olhos pelo povo sentado. Futucam quem<br />
cochila; chamam a atenção de quem conversa ou está largado no<br />
banco, corrigindo-lhes a postura; olham sérias para as crianças<br />
inquietas ou chamam-nas para ficar consigo e deixar suas mães<br />
se concentrarem nas palavras de Deus. Quando a oração atinge<br />
maior intensidade, é possível vê-las movendo-se rapidamente<br />
em direção a algum participante mais emocionado, pousando a<br />
mão sobre seus ombros e orando fervorosas aos seus ouvidos.<br />
Cena 2:<br />
No púlpito, microfone à mão, o pastor inicia uma longa oração<br />
que enaltece o poder de Deus; misturam-se súplicas e louvores.<br />
Às suas palavras, somam-se aquelas dos presentes, cada qual<br />
com sua oração. Não há um texto comum, mas muitos textos que,<br />
vez ou outra, convergem nas palavras de louvor. As orações<br />
iniciam-se em um tom mais baixo, que vai crescendo e tomando<br />
conta do ambiente. A princípio clara, a fala do pastor vai, aos<br />
poucos, confundindo-se com a dos outros, até que se distingue<br />
apenas um ritmo acelerado que, então, atinge seu ápice, quando<br />
se destacam palavras como “Glória a Deus”, “Obrigado, Jesus”.<br />
Estas logo voltam a evanescer sob o fundo de muitas vozes. O<br />
efeito dessa sobreposição de vozes e de orações é, em primeiro<br />
lugar, criar um espaço totalmente preenchido pelo poder divino<br />
– uma onda de poder que se alastra e não deixa nada nem ninguém<br />
intocado. Mas é também de apresentar esse poder como se<br />
multiplicando e singularizando-se em cada um, fazendo de cada<br />
corpo uma morada. Quando a profusão de vozes se confunde e se<br />
entrelaça em um ritmo acelerado, chegamos ao auge da oração.<br />
As palavras correm soltas, livres do sentido mundano. Choros,<br />
gritos, pulos, pessoas tremendo dos pés à cabeça. Alguns fiéis<br />
são tomados de tremores como em um acesso de riso. Outros<br />
rodam sobre o eixo do corpo, dando a impressão de que acabarão<br />
caindo. Por vezes, pendem de um lado para o outro,<br />
choramingando ou soltando uivos finos, prolongados. Estão<br />
recebendo o Espírito Santo. Para alguns, provavelmente, esta é a<br />
primeira vez em que são assim tocados – é o batismo do fogo.<br />
Para os demais, trata-se da renovação do batismo, desejada a<br />
cada novo culto.<br />
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