Síxpavoi
Síxpavoi
Síxpavoi
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
376 didaskalia<br />
que encontra analogia no dizer da divindade a Parménides como<br />
previsão cíclica de incoativo recomeço: «pouco importa onde comecemos<br />
porque aqui havemos de tornar» 239 .<br />
E, assim, também é o corpo dos <strong>Síxpavoi</strong> e o único contexto<br />
da sua substância coesa, linguística e lógica, em que uma ruptura<br />
absoluta no ôntico, em que uma diferença ontológica radical se<br />
salta, se transcende, se olha de soslaio ou meramente se interroga<br />
num momento de hesitação, de espanto ou de suspensão, em que o<br />
diferente não tanto faz divergir conciliando, mas acena a uma<br />
conversão do inconciliável.<br />
Se se quisessem esquematizar de um modo objectivo as conclusões<br />
deste estudo poder-se-iam apresentar as seguintes teses:<br />
1 — Os Síxpxvoi são um termo que delimita a passagem do<br />
ser e do não-ser a um horizonte de relação, de manifestação ou<br />
de SóÇa para se referir o contexto imediato do «Poema»;<br />
2 — Aíxpavoi etimologicamente pode significar duas cabeças,<br />
duas caras, dois cornos, sempre todas estas referências entendidas<br />
no sentido de duas extremidades. Também a este nível a delimitação<br />
do sentido lexical mostra como independentemente da tradução<br />
a figura descrita por esta palavra está a marcar a transição entre o<br />
humano e o mais do que humano, ou a sublinhar o humano no<br />
entre menos e mais que humano 240 . Perguntar pela tradução mais<br />
correcta é ignorar a resposta já implícita no sentido antropomórfico<br />
que se acaba de referir. Com efeito, dizê-los criaturas em forquilha,<br />
com duas pontas ou cornos ou com duas cabeças, é sempre insistir<br />
no sinal que é excedido pelo signo <strong>Síxpavoi</strong>, e que se emudece àquem<br />
de uma ulterior simbolização metafísica.<br />
3 — Ora, assim como o Titã é indissolúvel do sinal linguístico<br />
também a alma que o possui investe-se em significado. A hermenêutica<br />
dos <strong>Síxpavoi</strong> na sua expressão mais ampla e integradora<br />
3 3 9<br />
Cf. PARMÉNIDES, frag. 5 (D. K., t. I, p. 232): «Çuvòv Sé (xoí Icmv, / Ò7t7tóSev<br />
áp$o)|xai TÓík yáp 7ráXiv üÇofiai au-íhç /.»<br />
2 4 0<br />
Por oposiçïo a um pensamento de PASCAL muito referido (Pensées, 678, ed. Louis<br />
Lafuma; 358 ed. Brunschvicg) que afirma: «L'homme n'est ni ange ni bête, et le malheur<br />
veut que qui veut faire l'ange fait la bête» veja-se M. MERLEAU-PONTY, Éloge de la<br />
philosophie et autres essais, Paris, Gallimard, 1960, p. 73: «Le philosophe est l'homme qui<br />
s'éveille et qui parle, et l'homme contient silencieusement les paradoxes de la philosophie,<br />
parce que, pour être tout à fait homme, il faut être un peu plus et un peu moins qu'homme.»<br />
No entanto, tal oposiçïo é aparente e parece ouvir-se em Merleau-Ponty o eco de um<br />
outro texto de Pascal (Pensées, eds. cits. 121/418): «(...) Il ne faut pas que l'homme croie<br />
qu'il est égale aux bêtes ni aux anges, ni qu'il ignore l'un et l'autre, mais qu'il sâche<br />
l'un et l'autre.» (sublinhado nosso).