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Literatura e Jornalismo: Fato e ficção em Abusado e Cidade de Deus

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A prosa <strong>de</strong> Barcellos se aproxima <strong>de</strong> um tratamento mais<br />

cuidadoso – recorrendo a recursos <strong>de</strong> sonorida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> contraste, por<br />

ex<strong>em</strong>plo –, quando ele narra a história do tráfico, como na abertura do<br />

livro: “O socorro <strong>de</strong>sce a la<strong>de</strong>ira interminável, com faróis e lanternas<br />

apagadas. Silêncio para ouvidos <strong>de</strong>satentos.” (p. 15); ou no início da<br />

história do chuveirinho – sist<strong>em</strong>a <strong>de</strong> canos suspensos que distribuía a<br />

água para os barracos do morro –: “Os tiroteios faziam chover até <strong>em</strong> dias<br />

<strong>de</strong> sol forte na Santa Marta.” (p. 68). Mas a narrativa é muito mais<br />

jornalística – ágil, direta e factual – atenta à datação, à localização<br />

espacial e à precisão dos acontecimentos.<br />

Situada na encosta sul do Morro Dona Marta, no bairro <strong>de</strong><br />

Botafogo, zona sul do Rio, a favela Santa Marta t<strong>em</strong> como vizinhança os<br />

bairros <strong>de</strong> Laranjeiras, Cosme Velho, Humaitá e o parque nacional da<br />

Tijuca. A geografia da favela aparece fragmentada na dinâmica da<br />

narrativa, mas <strong>em</strong> vários momentos é possível fazer um mapa mental da<br />

Santa Marta, dividida por áreas como o sopé do morro, localida<strong>de</strong> mais<br />

próxima do asfalto; a parte alta, on<strong>de</strong> se concentram os traficantes e que<br />

funciona como rota natural <strong>de</strong> fuga para os bairros vizinhos ou para a<br />

floresta; a região do pico do morro, “local <strong>de</strong> execução e <strong>de</strong>sova” (p. 401);<br />

o lado oeste, on<strong>de</strong> se situam o Cantão, local da primeira boca-<strong>de</strong>-fumo da<br />

Santa Marta, a área do Cruzeiro, local dos primeiros tribunais do<br />

Comando Vermelho no morro, e a quadra da escola <strong>de</strong> samba; a divisa<br />

leste, que faz fronteira com a floresta e é o lado da Escadaria <strong>de</strong> acesso<br />

ao alto, ponto <strong>de</strong> encontro dos moradores e também local do posto<br />

policial da PM; a região central, área mais precária e “<strong>de</strong> maior<br />

concentração <strong>de</strong> barracos, becos e vielas” (p. 186). Os botequins também<br />

figuram como espaços importantes, pois “serviam <strong>de</strong> central <strong>de</strong> recados e<br />

fofocas” (p. 73) e também por abrigar<strong>em</strong> muitos encontros dos<br />

quadrilheiros, funcionando algumas vezes como bunker, outras como<br />

ponto-<strong>de</strong>-venda <strong>de</strong> cocaína.

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