Literatura e Jornalismo: Fato e ficção em Abusado e Cidade de Deus
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curiosida<strong>de</strong> popular, como escândalos, <strong>de</strong>sastres e conflitos, com<br />
técnicas <strong>de</strong> suspense, personagens heróicos ou pitorescos e<br />
dramatização dos acontecimentos, priorizando a sensação e a <strong>em</strong>oção ao<br />
tratamento crítico e investigativo dos fatos. Cabe à <strong>em</strong>presa jornalística,<br />
no plano institucional, e ao jornalista, no âmbito <strong>de</strong> sua relação com a<br />
<strong>em</strong>presa e com seus leitores, a opção pela forma como a realida<strong>de</strong> vai<br />
ser construída no relato, ou seja, se se vai reportar os fatos como<br />
espetáculo ou como acontecimentos que mereçam contextualização,<br />
aprofundamento e análise.<br />
É nessa disputa pelas atenções com os diversos meios que<br />
uma das alternativas vislumbradas por <strong>em</strong>presas e profissionais do<br />
jornalismo impresso para fugir ao lugar comum da notícia como<br />
entretenimento é retomar a tradição das gran<strong>de</strong>s reportagens, que <strong>em</strong><br />
seu t<strong>em</strong>po se opuseram ao sensacionalismo também predominante na<br />
imprensa da época, apresentando diversos pontos <strong>de</strong> vista, retratando<br />
vividamente os acontecimentos e as pessoas neles envolvidas, afastando<br />
o leitor da vertig<strong>em</strong> noticiosa e espetacular, oferecendo-lhe relatos<br />
particularizados que permit<strong>em</strong> entrever um paradigma do mundo. Em<br />
conferência proferida na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Guadalajara, no México, Tomás Eloy<br />
Martínez assim elucida a importância que a narrativa v<strong>em</strong> conquistando<br />
no jornalismo impresso:<br />
Cuando le<strong>em</strong>os que hubo cien mil víctimas en un<br />
mar<strong>em</strong>oto <strong>de</strong> Bangla<strong>de</strong>sh, el dato nos asombra pero no<br />
nos conmueve. Si leyéramos, en cambio, la tragedia <strong>de</strong><br />
una mujer que ha quedado sola en el mundo <strong>de</strong>spués <strong>de</strong>l<br />
mar<strong>em</strong>oto y siguiéramos paso a paso la historia <strong>de</strong> sus<br />
pérdidas, sabríamos todo lo que hay que saber sobre ese<br />
mar<strong>em</strong>oto y todo lo que hay que saber sobre el azar y<br />
sobre las <strong>de</strong>sgracias involuntarias y repentinas. Hegel<br />
primero, y <strong>de</strong>spués Borges, escribieron que la suerte <strong>de</strong><br />
un hombre resume, en ciertos momentos esenciales, la<br />
suerte <strong>de</strong> todos los hombres. Esa es la gran lección que<br />
están aprendiendo los periódicos en este fin <strong>de</strong> siglo.<br />
(1997, p.1)