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Literatura e Jornalismo: Fato e ficção em Abusado e Cidade de Deus

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história tecida numa continuida<strong>de</strong> entre a vivência do mais e a do menos<br />

experiente; o modo <strong>de</strong> encarar as ações, já que não exist<strong>em</strong> ações<br />

novas, mas novas formas <strong>de</strong> enfrentá-las – com a sabedoria da<br />

experiência ou com a sabedoria da ingenuida<strong>de</strong>, o que acabaria por<br />

revelar um conflito <strong>de</strong> sabedorias –; e a valorização do presente, do<br />

novo e da vida diante da existência inevitável da morte – a ação nos<br />

t<strong>em</strong>pos pós-mo<strong>de</strong>rnos é jov<strong>em</strong>, inexperiente e <strong>de</strong>stituída da palavra,<br />

exige, portanto, o olhar do outro para ser verbalizada: “O narrador que<br />

olha é a contradição e a re<strong>de</strong>nção da palavra na época da imag<strong>em</strong>. Ele<br />

olha para que seu olhar se recubra <strong>de</strong> palavra, constituindo uma<br />

narrativa” (SANTIAGO, 1989, p. 51).<br />

Ao narrar a partir do que observa no outro, o narrador pósmo<strong>de</strong>rno<br />

“quer extrair a si da ação narrada, <strong>em</strong> atitu<strong>de</strong> s<strong>em</strong>elhante à <strong>de</strong><br />

um repórter ou <strong>de</strong> um espectador. Ele narra a ação enquanto espetáculo<br />

[...] não narra enquanto atuante.” (p. 39). Assumindo esta postura<br />

jornalística, <strong>em</strong> que se distancia da experiência da ação, o narrador<br />

exercita a experiência do olhar lançado ao outro e ao seu redor, situando<br />

o interesse no personag<strong>em</strong>, no assunto e no texto. Esta distância o<br />

aproxima e o torna cúmplice <strong>de</strong> um outro observador, o leitor, com qu<strong>em</strong><br />

divi<strong>de</strong> a disposição para espreitar uma “ação alheia que os <strong>em</strong>polga,<br />

<strong>em</strong>ociona, seduz, etc.” (p. 44). Espectador <strong>de</strong> uma ação vivida ou<br />

ensaiada, o hom<strong>em</strong> cont<strong>em</strong>porâneo, conclui Santiago, cultiva a<br />

passivida<strong>de</strong> prazerosa e o imobilismo crítico, numa postura que<br />

representaria a experiência autêntica do mundo pós-mo<strong>de</strong>rno. Este olhar<br />

hesitante entre prazer e crítica, que mesmo ausente da ação ainda se<br />

<strong>em</strong>ociona, termina por transformar a ação <strong>em</strong> espetáculo, e a ação<br />

tornada espetáculo não é mais ação, mas representação.<br />

A experiência da ação passiva vivida pelo consumo da imag<strong>em</strong><br />

<strong>de</strong> que nos fala Santiago se aproxima do que Guy Debord (1992)<br />

interpretou, <strong>em</strong> 1967, como a socieda<strong>de</strong> do espetáculo: “Toda a vida das

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