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Literatura e Jornalismo: Fato e ficção em Abusado e Cidade de Deus

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pontualmente na imprensa norte-americana, isto não ocorre s<strong>em</strong> um quê<br />

<strong>de</strong> hipocrisia. Muitas vezes, mesmo que não chegue a inventar<br />

completamente os fatos, a prática jornalística aponta para uma<br />

r<strong>em</strong>o<strong>de</strong>lação dos acontecimentos, o fato fabricado.<br />

Se muitas vezes o jornalismo beira o espetáculo, produzindo o<br />

“enfraquecimento ou total apagamento da fronteira entre o real e o fictício”<br />

(ARBEX, 2001, p. 32), <strong>de</strong> outro lado o espetáculo busca uma<br />

aproximação com o jornalismo para dar credibilida<strong>de</strong> ao show. N<strong>em</strong><br />

s<strong>em</strong>pre funciona, como no caso da entrevista com supostos m<strong>em</strong>bros da<br />

facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) apresentada no<br />

programa Domingo Legal, do SBT, <strong>em</strong> 2003. Na farsa montada pela<br />

produção, atores encapuzados mostraram suas armas, falaram sobre<br />

suas carreiras no crime e fizeram ameaças ao então vice-prefeito <strong>de</strong> São<br />

Paulo, Hélio Bicudo, ao padre Marcelo Rossi e aos apresentadores <strong>de</strong> TV<br />

José Luiz Datena e Marcelo Rezen<strong>de</strong>, entre outros. Descoberta a frau<strong>de</strong>, o episódio virou caso <strong>de</strong> polícia. No<br />

espetáculo, a realida<strong>de</strong> fabricada se transforma <strong>em</strong> imagens, que são<br />

apreendidas como realida<strong>de</strong> – daí o esvaecimento das fronteiras entre<br />

real e ficcional. O “mundo real” veiculado pela mídia se apresenta assim<br />

mais real do que as experiências vividas pelos indivíduos.<br />

À parte os fatos fabricados pelas conveniências da mídia,<br />

<strong>de</strong>ve-se consi<strong>de</strong>rar – com o cuidado <strong>de</strong> não incidir num relativismo<br />

absoluto – que um acontecimento apresenta s<strong>em</strong>pre vários lados, e por<br />

isso mesmo várias versões, e acaba, quando mediado, sendo<br />

interpretado, reinterpretado e reconstruído sob diferentes perspectivas,<br />

como observa Patrick Charau<strong>de</strong>au:<br />

As representações, ao construír<strong>em</strong> uma organização do<br />

real através <strong>de</strong> imagens mentais transpostas <strong>em</strong> discurso<br />

ou <strong>em</strong> outras manifestações comportamentais dos<br />

indivíduos que viv<strong>em</strong> <strong>em</strong> socieda<strong>de</strong>, estão incluídas no<br />

real, ou mesmo dadas como se foss<strong>em</strong> o próprio real.<br />

Elas se baseiam na observação <strong>em</strong>pírica das trocas

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