Literatura e Jornalismo: Fato e ficção em Abusado e Cidade de Deus
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ignoram o <strong>de</strong>sejo do público pelos gêneros <strong>de</strong> não-ficção. Dessa forma, o<br />
mercado editorial t<strong>em</strong> se mostrado receptivo à publicação <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />
reportagens. Na coleção <strong>Jornalismo</strong> Literário, a Companhia das Letras<br />
v<strong>em</strong> reeditando alguns clássicos do gênero, como Hiroshima, <strong>de</strong> John<br />
Hersey, A sangue frio, <strong>de</strong> Truman Capote, Fama e Anonimato, <strong>de</strong> Gay<br />
Talese, Radical Chic e o novo jornalismo, <strong>de</strong> Tom Wolfe, Filme, <strong>de</strong> Lílian<br />
Ross, O imperador, <strong>de</strong> Ryszard Kapuscinski, entre vários outros títulos do<br />
jornalismo literário internacional, além <strong>de</strong> trabalhos <strong>de</strong> jornalistas<br />
brasileiros como Zuenir Ventura e Joel Silveira. A Geração Editorial, com<br />
a coleção Vida <strong>de</strong> Repórter, traz relatos <strong>de</strong> aventuras vividas pelos<br />
jornalistas <strong>em</strong> coberturas <strong>de</strong> fatos históricos ou recordações <strong>de</strong><br />
experiências pessoais no exercício da profissão. A Record publicou A<br />
mulher do próximo e O reino e o po<strong>de</strong>r, <strong>de</strong> Gay Talese e, <strong>em</strong> 2003, o<br />
livro-reportag<strong>em</strong> <strong>Abusado</strong>: o dono do morro Dona Marta, do jornalista<br />
Caco Barcellos, entre outros títulos; o que v<strong>em</strong> preenchendo a lacuna que<br />
havia na publicação <strong>de</strong> bons textos jornalístcos.<br />
Este fenômeno editorial po<strong>de</strong> ser visto como os dois lados da<br />
mesma moeda. A violência, o crime, o sexo, a guerra – que ocupam a<br />
atenção da mídia e pautam as inseguranças da socieda<strong>de</strong> – se<br />
transformam <strong>em</strong> objeto <strong>de</strong> interesse e produtos <strong>de</strong> consumo no mercado.<br />
Os gêneros que se aproximam do real passam a ser valorizados porque<br />
recuperam o papel <strong>de</strong> or<strong>de</strong>nar o caos do mundo cont<strong>em</strong>porâneo e<br />
reproduz<strong>em</strong> os efeitos <strong>de</strong> realida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sejados pelo leitor, que busca<br />
conhecer e estabelecer o seu contato com os acontecimentos do mundo<br />
s<strong>em</strong> necessitar do contato direto com a realida<strong>de</strong> concreta dos fatos. A<br />
indústria midiática ao mesmo t<strong>em</strong>po alimenta e supre a necessida<strong>de</strong> do<br />
consumo do “real” intermediado e transforma a realida<strong>de</strong> <strong>em</strong> moda. Como<br />
sintetizou Walter Benjamin: “Orientar a realida<strong>de</strong> <strong>em</strong> função das massas e<br />
as massas <strong>em</strong> função da realida<strong>de</strong> é um processo <strong>de</strong> imenso alcance,<br />
tanto para o pensamento como para a intuição.” (1993, p. 170).