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Ler texto - Escola de Arquitetura - UFMG

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141<br />

revista dos acontecimentos <strong>de</strong> São Bernardo, neste assombroso verão <strong>de</strong> mil oitocentos e<br />

noventa e três, cheio <strong>de</strong> bombar<strong>de</strong>ios, <strong>de</strong> incêndios, <strong>de</strong> hecatombes, <strong>de</strong> febres, <strong>de</strong> batalhas, <strong>de</strong><br />

escândalos, do diabo!” 371 Mesmo Álvares Cândido não sendo a personagem que os biógrafos<br />

indicam como sendo o representativo <strong>de</strong> Bliac, mas sim Olívio Bivar que aparece <strong>de</strong>pois da<br />

meta<strong>de</strong> do romance, acredito que esta frase po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada uma confissão das intenções<br />

do autor <strong>de</strong> retratar a vida pacata <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> do interior, diferente da conturbada que era<br />

encontrada na capital fe<strong>de</strong>ral e vivenciada pelo autor.<br />

Estes foram os motivos que levaram Olavo Bilac a <strong>de</strong>sembarcar na plataforma do<br />

ramal ferroviário <strong>de</strong> Ouro Preto. A estadia lhe <strong>de</strong>u substrato para escrever um romance<br />

embasado no cotidiano da cida<strong>de</strong>, bem como a sua amiza<strong>de</strong> com Afonso Arinos e a<br />

peregrinação pelas igrejas, casarões, ruas, minas e documentos antigos que foram importantes<br />

para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> sua obra. 372<br />

O romance inicia-se “Na Gare”, por volta das oitos horas da noite quando toda a<br />

cida<strong>de</strong> já estava dormindo “na sua pacatez <strong>de</strong> beata”, com a conversa <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> rapazes<br />

que esperavam a chegada do trem. A maioria das pessoas que se aglomeravam ansiosamente<br />

na estação a esperar o trem estava ali para saber das notícias dos últimos acontecimentos da<br />

Revolta da Armada. O único movimento na cida<strong>de</strong> era o “barulho <strong>de</strong> vozes e <strong>de</strong> passos” na<br />

estação, enquanto que “pelas colinas e pelas ribas do rio, um silêncio <strong>de</strong> morte pesava sobre<br />

as casas”.<br />

É que muita gente correra a esperar o expresso do Rio. Uma gran<strong>de</strong> ansieda<strong>de</strong><br />

obrigava aquela multidão a vir todas as noites acotovelar-se na estreita gare –<br />

sôfrega, curiosa, fazendo conjeturas sobre o que po<strong>de</strong>ria ter sucedido na capital.<br />

Des<strong>de</strong> setembro, que a revolta da esquadra entrara pela vida fluminense como um<br />

germe <strong>de</strong> susto e perturbações. O mar impunha as suas leis à terra, e todos os olhares<br />

se volviam para as ondas da formosa baia, constantemente enevoada pelo fumo dos<br />

combates, e sacudida em choques violentos pelo ribombo dos canhões <strong>de</strong> grosso<br />

calibre.<br />

Navios e fortalezas hostilizavam-se <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o amanhecer até à tar<strong>de</strong>, e não raro pela<br />

escuridão da noite, a <strong>de</strong>soras, pacíficos dormentes eram <strong>de</strong>spertados <strong>de</strong> um sono<br />

<strong>de</strong>licioso pelo estrondo da artilharia mortífera, que abalava as habitações até aos<br />

alicerceres, dando arrepios <strong>de</strong> pavor à pobre gente in<strong>de</strong>fesa. E o caso não se cifrava<br />

unicamente em rumor mais ou menos incômodo; <strong>de</strong> súbito, <strong>de</strong>sfazia-se sobre a<br />

cida<strong>de</strong> um chuveiro <strong>de</strong> balas – 450 metralhadoras, canhões, revólveres, tiro rápido –<br />

e, se muitas se limitavam a pregar sustos, outras, em compensação, ajustavam contas<br />

diretas com a vida dos cidadãos.<br />

De maneira que, em São Bernardo, nessa noite, como em todas as outras, todos<br />

ansiavam pela leitura das folhas, e a afluência <strong>de</strong> curiosos era extraordinária à<br />

estação. 373<br />

371 BILAC, O. & AZEREDO, M. <strong>de</strong>. Op., cit., p. 02.<br />

372 JORGE, F. op. cit., p. 238.<br />

373 BILAC, O. & AZEREDO, M. <strong>de</strong>. Op., cit., pp. 01-2.

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