No coracao do mar - Charlotte Rogan

Eu respondia “Sim” ou “Não”, conforme o caso, e na maioria das vezes
falava a verdade. “Isso quer dizer o quê?”, perguntava ela então, ou “De que lado
é o oeste?”.
Eu me valia do pouco que sabia sobre nossa posição para expor-lhe os fatos de
maneira nua e crua. “Quer dizer que o vento está nos empurrando de volta na
direção da Inglaterra”, eu explicava nos primeiros dias, quando estávamos
desesperados para manter nossa posição. “Veja pelo lado positivo”,
acrescentava. “Se formos empurrados de volta o suficiente, você poderá
comprar um vestido novinho em folha para o casamento.” Hannah, no entanto,
dizia algo mais no seguinte estilo: “É como um pêndulo, Mary Ann. Primeiro vai
para um lado, depois para o outro.”
Agora nos pediam para fazer uma escolha difícil com relação à culpa de
Hardie e a resultante sentença, mas respondi como se o problema fosse a falta de
comprometimento de Mary Ann.
— Ah, por favor. Você não pode fazer de conta que está brincando em uma
banheira, Mary Ann. Sinto muito que não goste de fazer escolhas, mas a triste
verdade é que o Sr. Hardie representa agora um perigo para todos nós. Ele
perdeu a autoridade e a capacidade de tomar decisões sensatas. Ou ele vai para o
fundo do oceano, ou nós. É muito simples.
Mal acabei de pronunciar essas palavras, perguntei a mim mesma se o que eu
dizia era verdade. Para ser sincera, eu não sabia na ocasião, e até hoje não tenho
certeza. Quando olhei para o Sr. Hardie naquela manhã, não consegui
reconhecer nele o super-homem dos primeiros dias no barco salva-vidas. Ainda
que mantivesse algo de divino, ele não passava de um deus em sua forma
humana, e sabíamos o que acontece com deuses desse tipo. Talvez ele tivesse
mudado, talvez nós, ou talvez fosse apenas a situação atual que pedia algo novo.
Se o Sr. Hardie não era mais o mesmo, a Sra. Grant mostrava ter fortalecido suas
características iniciais: firmeza, perseverança, capacidade inesgotável. Mais do
que as duas personalidades antagônicas, porém, era acima de tudo a atmosfera
reinante no barco que precisava ser avaliada; assim, enquanto eu repelia Mary
Ann com quaisquer palavras que me viessem à cabeça, uma parte mais
profunda de minha consciência analisava o rosto dos outros passageiros tentando
decifrar seus pensamentos.
Se eu já sabia qual seria a ordem da votação? Acontece que Mary Ann foi
chamada antes de mim. Para uma pessoa que avaliasse os fatos sentada em seu
escritório, isso seria perfeitamente previsível: fosse nas tarefas que o Sr. Hardie
nos atribuía ou na distribuição da água, sempre começávamos no sentido horário,
a partir de onde sentava o Sr. Hardie, no fundo do barco, prosseguindo depois de
banco em banco. Era lógico, portanto, supor que a Sra. Grant seguisse o mesmo
padrão, e que Mary Ann, agora sentada à minha direita, desse seu voto antes de
eu ser chamada para dar o meu. Claro, o Sr. Hardie tinha sido o encarregado das