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Fiquei paralisada pelo dilema: quem deveria ser o sujeito da frase e quem o<br />
objeto? Ele fizera alguma coisa terrível para mim ou eu para ele? E agora que<br />
ele havia confessa<strong>do</strong>, eu deveria fazer o mesmo? Era o que eu queria. Queria me<br />
jogar na sujeira e implorar seu perdão, pois percebia com surpresa que, ainda<br />
que amasse a posição social de Henry, eu o amava ainda mais como homem.<br />
Não cheguei a considerar se, sem sua posição social, Henry seria a mesma<br />
pessoa, embora pergunta tenha me ocorri<strong>do</strong> muito ligeiramente — não por<br />
motivação egoísta, mas porque o mesmo se aplicava a mim: eu seria a mesma<br />
Grace se alguns aspectos de minha personalidade, com os quais Henry contava,<br />
fossem destruí<strong>do</strong>s e descarta<strong>do</strong>s?<br />
O que eu de fato pensava era que Henry precisava de algo de minha parte: ele<br />
precisava que eu fosse forte. Pensei no que acontecera com minha família<br />
quan<strong>do</strong> meus pais ruíram, quan<strong>do</strong> nenhum <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is decidira lutar por si mesmos,<br />
por sua casa ou por suas filhas. To<strong>do</strong>s nós sofremos com isso. Fora egoísmo da<br />
parte deles ter sucumbi<strong>do</strong>, e eu não faria o mesmo com Henry nem comigo.<br />
Afirmei para Henry que sempre o a<strong>mar</strong>ia e que voltaríamos a falar em<br />
casamento quan<strong>do</strong> ele melhorasse, porque eu não queria me aproveitar de sua<br />
<strong>do</strong>ença ou <strong>do</strong> que quer que explicasse seu esta<strong>do</strong> de fraqueza, e mandei-o para<br />
casa com um beijo e a promessa de apoiá-lo <strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> que, eu tinha<br />
certeza, ele me apoiaria.<br />
— Qualquer que seja a decisão que se faz necessária, você precisa tomá-la<br />
sozinho. Preten<strong>do</strong> ajudá-lo, mas não o influenciarei.<br />
Eu tremia, tamanho o esforço que fazia para me controlar, e, embora<br />
soubesse que não poderia dar-me ao luxo de prescindir da praticidade, mesmo no<br />
calor <strong>do</strong> momento, também sabia que não tinha uma ideia real <strong>do</strong> que se passava<br />
na mente atormentada de Henry.<br />
Depois que ele foi embora, subi para meu pequeno quarto no sótão e rascunhei<br />
uma resposta para meu possível emprega<strong>do</strong>r dizen<strong>do</strong> que poderia estar em<br />
Baltimore na semana seguinte. Eu ainda não havia consulta<strong>do</strong> os horários <strong>do</strong>s<br />
trens nem busca<strong>do</strong> outras informações, mas tu<strong>do</strong> se arranja, eu repetia para mim<br />
mesma, sem deixar de pensar em minha irmã em uma labuta infindável em<br />
Chicago e alternan<strong>do</strong> a certeza de que também seria capaz com a convicção de<br />
que não seria. Depois, escrevi o endereço no envelope e enfiei-o entre as últimas<br />
páginas da grossa Bíblia que nem minha mãe abria mais. Imagino que a carta<br />
continue lá até hoje.<br />
Henry apareceu na tarde seguinte, já um tanto recomposto. Hesitei quan<strong>do</strong> o<br />
vi, pois não queria encher-me de ilusões, mas também não queria deixar<br />
totalmente em suspenso as promessas que nos fizéramos. Ao mesmo tempo, senti<br />
um calafrio de me<strong>do</strong> de ter interpreta<strong>do</strong> mal a situação e que a opinião de Henry<br />
a meu respeito fosse produto da agitação ou <strong>do</strong> nervosismo que alguns homens<br />
sentem quan<strong>do</strong> se aproximam de uma situação crítica em suas vidas. Também