No coracao do mar - Charlotte Rogan

para o Sr. Hardie ou o Sr. Hardie mentia para nós agora; e se Hardie estivesse
mentindo, eu só poderia supor que fosse para nos tranquilizar. Ainda assim, eu
estava convencida de que o Sr. Hardie acreditava que as mensagens haviam sido
enviadas, pois por qual outra razão ele teria insistido tanto que não nos
afastássemos muito do local do naufrágio se soubesse que dificilmente algum
navio faria buscas naquela área? Depois, comecei a me indagar se o Sr. Blake, e
talvez também o Sr. Hardie, não estariam em outro lugar após a explosão, e
nesse caso o Sr. Hardie apenas presumiria que sinais haviam sido enviados por
quem quer que estivesse na sala de rádio, uma vez que esse seria o curso lógico
de ação na eventualidade de um desastre. Se fosse esse o caso, então ele estava
mentindo não sobre os pedidos de socorro, mas sobre o que ele, e talvez também
Blake, de fato faziam no momento do acidente. Entretanto, por mais que eu me
concentrasse na questão, não conseguia solucioná-la.
Preferi ensaiar mentalmente os discursos que eu proferiria para a família de
Henry, discursos sobre amor e inevitabilidade e sobre meu tão antigo desejo de
ter tios e primos e meu ardente anseio de que a família Winter realizasse esses
sonhos para mim. Pensei em dizer que já os amava pelo que Henry me relatava
deles, mas como não conseguiria parecer sincera, decidi excluir essa parte.
Durante nossa discussão, Henry me confessara que seus pais adoravam Felicity
Close, que a conheciam desde menina, já que a mãe de Felicity era a melhor
amiga de sua mãe.
— Henry — sussurrei para o oceano que se estendia em todas as direções —,
não ouse me abandonar agora.
Em todas as minhas fantasias, Henry estava de pé a meu lado, firme e forte;
eu não tinha ideia de como conseguiria enfrentar sua mãe sozinha. Receava que
ela me culpasse pela morte de seu filho, que por algum motivo afirmasse que eu
levara Henry para a Europa, e não o contrário, e que era eu a responsável por
nosso retorno a bordo do Empress Alexandra, não uma guerra entre nações, sobre
a qual eu não tinha qualquer controle.
Naquela manhã, finalmente, começou a chover. No início eram gotas
pequenas e leves, mais uma garoa, e a quantidade que qualquer um de nós
conseguiu coletar e beber mal teria enchido um dedal, mas os pingos se tornaram
cada vez maiores e logo estávamos encharcados até os ossos. Foi dessa chuva
que me lembrei em Boston, quando o Sr. Reichmann me chamou de doida. A
meu redor, os outros erguiam o rosto para capturar a água. Mary Ann continuava
a criar dificuldade, recusando-se a abrir a boca, até que Hannah precisou sacudila
e apertar seu nariz. O Sr. Hardie indicou com o dedo, ao longe, algo que
ninguém mais conseguia ver, e disse que o tempo pioraria ainda mais, assim
como nossa situação, se não enfrentássemos a realidade de frente. Estávamos tão
molhados e gelados que mal conseguíamos captar o sentido de suas palavras.
A Sra. Cook voltou do dormitório, onde estava descansando, bateu de leve em