No coracao do mar - Charlotte Rogan

DIA SEIS
Durante aqueles primeiros dias víamos Hardie como uma espécie de oráculo.
Seu tipo de encorajamento não era consistente nem abundante, por isso, quando
seus prognósticos iniciais deixaram de se concretizar (não fomos resgatados
imediatamente e o bom tempo se manteve), não ficamos muito alarmados. O
que aconteceu, no entanto, foi que certas pessoas, em busca de detalhes,
começaram a bombardeá-lo com perguntas: “O vento vem do oeste ou do
sudoeste?”, “Isso é bom sinal ou não?”, “O que devemos esperar quando o céu
está vermelho ao amanhecer?” ou “O que significa um halo amarelo-rosado ao
redor da lua?”.
— Mudança no tempo — respondeu Hardie.
De fato, no sexto dia o céu azul deu lugar a uma camada de nuvens meio
esgarçadas, que apenas aqui e ali abriam-se para mostrar um sol zangado. O
vento diminuíra durante a noite, mas naquele instante agitava a superfície do
oceano, que mudava de cor a todo instante, conforme o sol conseguia ou não
atravessar as nuvens. Não era mais verde e transparente ou cobalto e opaco, mas
de uma cor escura indefinida, nem cinza nem azul. Pequenas ondas
encrespavam-se e quebravam por cima da amurada do barco, o que fez o Sr.
Hardie decidir pegar as canecas de lata que mantinha sob seu assento, aquelas
que usávamos para beber, e escolher entre nós mais duas pessoas para retirar a
água acumulada, apesar da advertência do Sr. Nilsson de que isso contaminaria
nossa água potável com sal. Ele nos fez memorizar uma detalhada lista de
tarefas: além dos cinco que esvaziavam o barco e dos quatro sentados ao longo
da amurada, cuja função era observar uma possível aproximação de navios,
outros dois foram designados para ficar de olho no barco salva-vidas que ainda
balançava a distância, e quatro pessoas de cada vez manejavam os remos,
encarregadas de manter a proa do barco contra as ondas para impedir que
quebrassem sobre a borda. Seis mulheres receberam a incumbência de
examinar o mar em busca de algum sinal de peixe, mas a superfície corrugada
minava nossos esforços. Em determinado momento, uma mulher magra
chamada Joan assustou a todos ao exclamar “Ali um!”, mas tratava-se apenas do
peixe pego pelo Sr. Hardie, que ele prendera na lateral do barco para conservar a
carne na água fria do oceano. A cada hora o coronel gritava “Hora da troca!”,
ao que trocávamos de tarefa ou descansávamos em nossos lugares ou íamos aos
pares ou trios dormir sobre as pilhas de cobertores que não conseguíamos manter
secos mesmo protegidos pela cobertura de lona do barco. O Sr. Hardie fazia da
hora das refeições um grande acontecimento, ainda que nossa porção de água
tivesse sido severamente reduzida e recebêssemos apenas um pedaço de peixe
ou uma pequena bolacha dura. Duas vezes por dia o diácono era chamado para